Com protocolo de retomada, escolas da rede municipal de Salvador vão usar modelo híbrido

Ainda não há uma data para o retorno das atividades presenciais; decisão depende do cenário da pandemia e das negociações com o setor

  • D
  • Da Redação

Publicado em 15 de janeiro de 2021 às 06:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos: Max Haack/Secom

O formato do retorno das aulas presenciais na rede municipal de Salvador está definido: um modelo híbrido, formado por atividades nas escolas e por atividades remotas, com metade dos alunos se revezando entre a casa e a unidade de ensino em dias alternados. Para bater o martelo de uma data, é preciso existir um cenário de estabilidade ou queda dos casos de coronavírus na cidade e encerrar as negociações com integrantes do setor, como professores e pais. “A retomada das aulas presenciais tem que acontecer o mais rápido possível”, diz o secretário municipal da Educação, Marcelo Oliveira.

As escolas da rede municipal estão prontas para o retorno com protocolos sanitário e pedagógico para o momento, garante o secretário da educação. Dentre as medidas para reduzir os riscos do contágio pelo coronavírus, estão o uso de máscara, a higienização das mãos e dos ambientes, o distanciamento de 1,5m entre as pessoas e a presença de apenas metade dos alunos nas escolas em turnos e dias alternados. 

“As escolas estão com a estrutura montada para o retorno. Temos, por exemplo, mais equipamentos para higienizar as mãos. Vai haver uma mudança na rotina, com lanches em salas de aula, o recreio em horários intercalados. Tomamos todas as medidas para garantir que o risco de um aluno ou funcionário se contaminar na escola não seja maior do que eles já estão expostos”, afirma o secretário. Para ele, o cenário nas instituições de ensino apresentará um menor perigo de contaminação se comparado com situações em casas onde não há uma preocupação correta com a pandemia.

Na retomada, a rede municipal de ensino não deve realizar a testagem de professores e alunos, mas vai controlar a temperatura na entrada das escolas. Em caso de sintomas gripais, os possíveis infectados serão afastados e monitorados pela secretarias de saúde e educação. Com o resultado positivo, há um protocolo a ser seguido pela instituição para evitar o espalhamento do vírus, garante Oliveira. As famílias podem optar por não aderirem ao retorno presencial.

O começo da retomada híbrida vai servir como um complemento das aulas remotas do ano letivo de 2020 na rede municipal. Caso o ensino presencial realmente comece em fevereiro, a estimativa do secretário é que a complementação termine em abril para, então, iniciar as atividades escolares programadas para 2021 em maio. As aulas devem continuar até o final de dezembro, em um cenário ideal, mas podem até invadir o mês de janeiro de 2022. 

“As iniciativas do ensino remoto, atividades e acompanhamento à distância não substituem o trabalho presencial em sala de aula. Precisamos complementar as lacunas de conhecimento deixados em 2020. Nas primeiras semanas, vamos submeter as crianças a uma avaliação para ter o diagnóstico do patamar de aprendizado. Com isso, vamos cumprir o currículo essencial com os assuntos mais importantes para avançar para as séries seguintes”, afirma Oliveira. Com a complementação, a rede municipal deve adotar uma aprovação automática já que existirão esforços para garantir o aprendizado evitando, assim, a descontinuidade da progressão.

O secretário ressalta que a retomada é urgente para não consumir muito tempo que poderia ser utilizado para o ano letivo de 2021. Ele avalia que um atraso pode impactar as atividades de 2022, o que “comprometeria 3 anos” e pode afetar “uma geração de jovens que deixam de assimilar os conhecimentos fundamentais para progredir na vida escolar”. 

A falta de uma vacinação em massa não atrapalha os planos, mas o secretário concorda que o melhor cenário é o de vacinação dos profissionais da educação. Como as crianças e adolescentes em idade escolar não estão, de forma geral, dentro do grupo de prioridade para a imunização, Oliveira diz que não é possível esperar a proteção para retomar as atividades presenciais. 

Na última terça-feira (12), Bruno Reis demonstrou interesse em inserir os profissionais de educação na 1ª fase de vacinação contra o coronavírus em Salvador caso a cidade receba doses suficientes para tal. Atualmente, esses trabalhadores estão na quarta fase no plano de imunização municipal. A prefeitura soteropolitana garantiu, nesta quinta (14), estar pronta para iniciar a aplicação das vacinas na próxima quarta-feira (20), a partir das 10h, em conjunto com outras cidades do país, como prevê o Ministério da Saúde. 

“A vacinação daria aos professores uma segurança maior, mas não contamos com isso, não podemos atrelar a decisão à vacinação. Se sabe que as crianças dificilmente transmitem o vírus e os professores estariam em uma sala com metade dos alunos”, aponta o secretário.

Retorno conjunto Para o secretário de educação de Salvador, o ideal é que o retorno ocorra por volta do mês de fevereiro em todas as redes de educação (municipal, estadual e privada). Por isso, a pasta alinha o processo com o governo do estado e representantes do setor privado. Uma nova reunião entre os entes está marcada para a próxima segunda-feira (18).

“Precisamos contar com a vontade política pelas redes de ensino serem interligadas. Os alunos do município seguem para as escolas estaduais. É preciso sincronizar para uma rede não terminar o ano letivo antes da outra e não correr o risco de falta vaga para a progressão dos alunos. Parte dos professores também trabalham em ambos os sistemas”, explica Oliveira. A decisão também depende do posicionamento dos funcionários das escolas e dos responsáveis pelos alunos. 

Oliveira relata que o protocolo de retomada de Salvador foi construído em parceria com o Governo do Estado, assim, deve ser aprovado pela Secretaria da Saúde da Bahia (Sesab) e posteriormente encaminhado para outros municípios baianos. O documento já foi validado pela pasta da saúde da capital da Bahia.“As escolas particulares têm uma preocupação com o retorno e, pelas reuniões que nós tivemos, elas estão preparadas para isso. Há o mesmo anseio para uma retomada mais breve possível”, assegura Oliveira.Segundo o Grupo de Valorização da Educação (GVE), composto por 60 escolas particulares de Salvador e Lauro de Freitas, e o Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino da Bahia (Sinepe-BA) o sindicato marcou o retorno das aulas na rede privada para 3 de fevereiro - com ou sem o sistema híbrido. Entretanto, boa parte das escolas deve esperar até o dia 8 do próximo mês pelo indicativo de retomada com o formato semi-presencial na data. O desejo também é receber alunos e professores nas instituições para um acolhimento a partir de 4 de fevereiro.

No setor privado, a intenção também é uma retomada presencial híbrida com 50% dos estudantes se revezando em sala de aula. A volta é facultativa. O indicativo da prefeitura é um alento para os representantes das instituições particulares: “esperamos a reunião de segunda para saber o que é possível e ter uma resposta mais precisa. Até podemos tentar descolar a rede privada da pública por possuírem situações bem diferentes”, afirma Viviane Brito, diretora do colégio vilas e integrante do GVE, durante live do grupo e do Sinepe-Ba para debater a situação das aulas presenciais.

Em resposta ao CORREIO, a Secretaria de Educação do Estado da Bahia (SEC) informa estar com os protocolos sanitários, de infraestrutura e pedagógico prontos para a retomada das aulas. A pasta ressalta ainda que as aulas presenciais nas escolas públicas e particulares de toda a Bahia permanecem suspensas por decreto governamental nº 19.529/2020 até o dia 15 de janeiro de 2021.

“A SEC adaptou as escolas estaduais com infraestrutura adequada, e itens como mais lavabos, dispensadores de álcool em gel e ventiladores, para acolher a comunidade escolar com segurança. Os profissionais de Educação estão entre os grupos prioritários de vacinação contra a Covid-19”, afirma a pasta. 

A secretaria pontua que os calendários referentes à retomada do ano letivo 2020 e às novas matrículas 2021 ainda serão divulgados. Sobre o período de retorno, a resposta é que este deve acontecer assim que as taxas de contaminação da COVID-19 diminuírem.

“Para recuperar o ano letivo 2020 em 2021, a proposta é fazer uma recomposição mínima da carga horária, com plano de trabalho e diversas outras atividades, observando o que permite a  LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação)”, complementa a SEC. 

Alunos Além das perdas educacionais, ainda existem os impactos psicológicos das aulas remotas. O secretário de educação de Salvador ressalta que pesquisas apontam a ocorrência de tristeza e até estresse pós-traumático entre os estudantes. As entidades particulares também apontam as consequências da falta de convívio com os colegas como um dos pontos fundamentais em prol do retorno dos encontros presenciais.“Estamos levando a questão da saúde mental em conta na elaboração do protocolo pedagógico. Antes de avaliar o que será aproveitado de 2020, vamos acolher os estudantes logo no começo desse processo de retorno. O psicológico é uma prioridade”, garante Oliveira.A diretora do GVE, Rosa Silvany, ressalta que as crianças e os jovens precisam do diálogo com os seus para seu desenvolvimento e a falta desse contato traz um entristecimento. “As crianças pequenas desenvolvem mais repertório de linguagem no contato com outras da mesma faixa. Também é nesse momento que se aprende os valores, o que acontece em cada etapa”, aponta.

Durante a live desta quinta, os representantes das escolas particulares também expressaram a preocupação com o aprendizado e cuidado que os estudantes têm recebido, pois parte dos pais voltaram a trabalhar.

“Nós sabemos as lacunas que ficarão com as crianças que deixaram de desenvolver a humanidade relacional já que é com o igual que se aprende certas coisas. Não aprende a ser solidário com o computador”, afirma o diretor do Sinepe-Ba, Jorge Tadeu, ao pontuar que alguns pais não têm matriculado seus filhos no ensino infantil pela incerteza sobre o modelo para 2021. Ainda há o receio de que as escolas fechem pela falta de matrículas para 2021. Segundo Tadeu, esse já foi o destino de 20 instituições de ensino da grande Salvador.

Com os pais fora de casa, os estudantes, especialmente os mais jovens, acabam tendo que ser olhados por outras pessoas, que tentam substituir o papel da creche ou da escola, relatam os integrantes dos grupos das instituições privadas. 

“Existem casos em que há a contratação de um recreador ou um professor para dar aula. Outras crianças são levadas para cuidadoras que se dividem entre vários pequenos. Essas pessoas estão sem um projeto e um planejamento curricular”, afirma Rosa. Ela aponta que mesmo no ensino remoto não há uma absorção plena do conteúdo.

O questionamento do grupo das escolas particulares é porque outros setores já voltaram a funcionar, inclusive com a visitação de crianças e adolescentes, enquanto permanece a indecisão sobre as aulas presenciais. A solicitação é de mais informações para que seja possível definir a retomada.“Desde o ano passado, procuramos as autoridades solicitando uma manifestação sobre os dos protocolos e parâmetros da retomada. Precisamos de uma previsão para se preparar. O estado não está se posicionando com clareza a respeito dos protocolos ou de uma data. Não temos um parâmetro claro”, critica o diretor do GVE Antônio Jorge Diretor do GVE.A promotora de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA), Cíntia Guanaes, integrante do Grupo de Atuação Especial de Defesa da Educação (GEDUC), alerta que é preciso ter cautela na decisão sobre a retomada das aulas pela complexidade da situação. Durante a live, a promotora enfatizou que a educação têm sofrido prejuízos pela pandemia.

“Esse momento mostra que o fato social das escolas e o aprendizado da escola é importante. Isso não é apenas estar lá com o professor e jamais pode ser substituído por um tipo de tecnologia. Pode haver uma mescla, mas o desenvolver na escola e professor que não olhar para o aluno em um quadrado é importante. Existe um aspecto humano e social da escolas”, afirma a promotora.

O MP-BA acompanha a preparação da retomada da oferta de ensino presencial na Bahia e em Salvador. Na quarta (13), o Grupo de Trabalho de Enfrentamento ao Coronavírus (GT Coronavírus) do MP encaminhou ofícios à SEC e à Sesab solicitando o envio de informações que ficaram pendentes na apresentação dos planos ação sanitário e pedagógico realizada durante a reunião na terça (12). Um encontro com a Prefeitura de Salvador também está marcado. 

“Existe um inquérito civil público [sobre a retomada das aulas] e temos que ter uma solução final. A partir das informações do estado e município, vamos avaliar e entender se as nossas questões foram esclarecidas. A partir disso podemos arquivar o inquérito se for solucionado, podemos fazer uma recomendação e, se a recomendação não for cumprida, há a possibilidade de judicialização. Não podemos judicializar pela falta de uma data da retomada, mas podemos por não haver premissas claras para isso no documento solicitado. Premissas que tem que ser cumpridas”, explica Guanaes.

Cidades do interior As aulas híbridas com 50% dos alunos em sala em dias alternados começarão em 1º de fevereiro em Barreiras, no oeste da Bahia. Até 30 de janeiro, as atividades escolares são remotas. O retorno parcial foi autorizado pelo Comitê de Operações e Emergência em Saúde (COE).

De acordo com a prefeitura de Barreiras, todos os profissionais da educação serão testados antes dos retorno das aulas e as secretarias de Saúde e Educação seguirão mapeando o quadro epidemiológico na cidade após a retomada.

As instituições de ensino são adequadas para receber os alunos durante a pandemia. Segundo a prefeitura, ainda é preciso concluir o ano letivo de 2020 na rede municipal da cidade.  Escolas de Barrreiras são adaptadas para receber alunos (Foto: Divulgação/Prefeitura de Barreiras) De acordo com a secretária municipal de educação da cidade, Cátia Alencar, todos os protocolos de segurança foram estabelecidos com base no Plano Geral de Retomada das Aulas, validado no COE; respeitando, inclusive, as restrições para os grupos de risco.

“Os estudantes matriculados em período integral poderão mediante, decisão da gestão e Conselho Escolar, adotar a frequência de 50% dos alunos em cada um dos turnos. Já os alunos da Educação Especial retornarão frequentando apenas a Sala de Recursos Multifuncionais e retornando à frequência da sala regular somente quando autorizado pela família. As turmas da EJA devem substituir as aulas de sábado por atividades à distância”, explica a secretária.

Juazeiro Em Juazeiro, no norte do estado, o ano letivo de 2021 começa em 8 de março de forma remota. Os alunos terão aulas síncronas, quando a atividade acontece em tempo real, e assíncronas, com lições gravadas. Na cidade, a educação presencial só será retomada com a vacinação contra o coronavírus. O portal de acesso às aulas virtuais continuará sendo usado no contraturno mesmo com as aulas presenciais.

A matrícula dos novos alunos da rede municipal de ensino para 2021 acontecerá de 25 de janeiro a 6 de fevereiro, por meio de link que será disponibilizado no site da Prefeitura. Já a renovação das matrículas é automática.

A rede atende 35.631 estudantes da Educação Infantil, Pré escola, Ensino Fundamental I e II, e Educação de Jovens e Adultos (EJA). Segundo a Secretaria de Educação e Juventude, o município possui 134 unidades escolares entre a área urbana e rural e 1.227 professores efetivos.

*Com orientação da subchefe de reportagem Monique Lobo