Conheça cinco fatos sobre a covid-19 que a ciência atualizou no último ano

Uso de máscaras, higienização das compras e alimentos e a limpeza das ruas não são mais iguais ao começo da pandemia

Publicado em 7 de março de 2021 às 11:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Reprodução

A cada dia, cientistas encontram evidências sobre o novo coronavírus (Sars-CoV-2). Pesquisas sobre a covid-19, infecção provocada pelo vírus, também seguem sendo publicadas e atualizadas e, às vezes, o que sabíamos há um mês já é diferente do que sabemos agora. Como se trata de uma doença recente, a cada momento surgem descobertas e, por isso, as orientações técnicas podem mudar. 

Já estamos há um ano em pandemia no Brasil e, no meio do caminho, novas variantes do vírus apareceram. É preciso se manter informado sobre as formas de infecção, prevenção e efetividade das políticas públicas. Para atualizar informações sobre este momento, O CORREIO traz pesquisadores para explicar ideias que foram sendo revisadas sobre a covid-19.

1. Máscaras mais potentes Máscara do tipo PFF2/N95. Modelo é reutilizável, mas não pode ser lavado e nem deve possui válvula (Foto: Divulgação) As máscaras de pano continuam sendo muito úteis e cumprem um papel importante na prevenção à doença. O uso delas foi muito incentivado no início da pandemia porque, naquela época, havia uma escassez de máscaras cirúrgicas em todo o mundo. De lá para cá, a indústria correu atrás de atender à demanda e, neste momento, já temos disponibilidade de máscaras mais poderosas no mercado. Então, se você puder, vale a pena pensar em investir em uma proteção mais eficaz.

Nutricionista e epidemiologista pesquisadora da Rede CoVida, Naiá Ortelan explica que há muito já se sabe que máscaras do tipo N95/PFF2 são as melhores porque vedam bem o rosto, impedindo mais a passagem do vírus. O incentivo à aquisição deste modelo não se trata de uma descoberta, mas, sim, de nova orientação. Inclusive, alguns países, como a Alemanha e Áustria, já instituíram uso obrigatório delas em espaços fechados e lojas. 

No início da covid-19, elas eram indicadas apenas para profissionais da saúde por causa da falta desse insumo a nível global. Com a reorganização da indústria e, sobretudo devido ao aparecimento de várias mutações mais infecciosas do coronavírus, pesquisadores têm indicado que as pessoas busquem proteções mais potentes.

Criadores do projeto Qual Máscara?, Beatriz Klimeck, que é doutoranda em Saúde Coletiva (Uerj), e o administrador Ralph Holzmann, gestor de mídias sociais, se juntaram para fazer divulgação científica dos melhores tipos de máscaras disponíveis hoje. Eles explicam que o tipo PFF2/N95 é reutilizável quando deixado em local arejado e seco por três a quatro dias após o uso, período em que o vírus vai ficando inativo. Por causa desse intervalo até o novo uso, é melhor ter mais de uma.

Diferente da máscara de pano, essas não podem ser lavadas ou higienizadas com álcool e água sanitária porque, se forem, serão destruídas. Basta colocar em "descanso''. É possível usá-las enquanto os elásticos ainda estiverem bons. Depois, descarte. Não compre o modelo com válvula, esse tipo protege apenas você e não quem está perto porque o filtro não é capaz de filtrar o ar na saída. Se você comprou uma dessa por engano, ponha uma fita isolante para tampar a válvula provisoriamente até adquirir outra e não visite idosos ou pessoas com comorbidades enquanto só tiver essa máscara.

As máscaras cirúrgicas também são opções melhores do que as de pano porque têm um clipe de metal para ajustar no nariz.

2. Limpeza de embalagens e comidas

Você lembra de quando circulavam tabelinhas detalhando o tempo que o coronavírus ficava impregnado em objetos e superfícies? No meio de fevereiro deste ano, uma orientação nova, da Food and Drugs Administration (FDA/EUA), equivalente à Anvisa no Brasil, indicou que já não há motivos para enlouquecer com a limpeza das compras do mercado. Não é preciso gastar tanta energia com isso. A instituição estadunidense emitiu um comunicado em que diz que a transmissão de coronavírus por embalagens e comida é improvável, muito baixa ou quase irrelevante. 

Sabe-se, há um bom tempo, que a principal forma de transmissão da doença é de pessoa para pessoa, através de aerossóis, ou seja, pequenas partículas que ficam suspensas no ar quando um infectado tosse, espirra e fala. Para a FDA, o número de partículas de vírus que, teoricamente, poderiam ser captadas ao tocar uma superfície seria muito pequeno e a quantidade necessária para infecção por inalação oral é alta, então, as chances de infecção ao tocar a superfície da embalagem é considerada “extremamente baixa”.

Epidemiologista, Naiá Ortelan conta que, para a ciência, a contaminação por contato com a superfície continua sendo apenas uma hipótese não confirmada. Até hoje, não há relato concreto de nenhum caso de infecção a partir dessa via e, por isso, a higiene das compras deixou de ser uma grande preocupação. Não há indícios também de risco de entregas por delivery, seja para alimentação instantânea ou compras, no geral. Basta o cuidado simples de lavar as mãos após abrir as sacolas, e então pode-se consumir de imediato ou guardar.

Portanto, consumidores podem relaxar, não há tanta necessidade de higienizar as compras como prevenção ao coronavírus, mas calma! É bom entender além dessa questão. O físico Vitor Mori, pesquisador membro do Observatório Covid-19 BR, explica que uma das coisas que mais causam angústia na pandemia é essa sensação de que não podemos fazer nada para controlá-la.

“Limpar as compras é algo visível e palpável e que cria a percepção de que temos controle sobre algo. O problema é quando isso se torna uma preocupação excessiva. Ainda assim, muita gente se sente bem fazendo isso. Em termos de higiene faz sentido... Estoques de supermercado não são exatamente os ambientes mais higiênicos do mundo. Faça o que te deixar mais confortável”, sugere. 

Independente da pandemia, a higienização de alimentos é considerada importante pelo Ministério da Saúde porque algumas doenças — como a hepatite A, diarreia, cólera — podem ser transmitidas pela comida contaminada por bactérias e vírus. A limpeza é uma questão de se proteger contra outras enfermidades, principalmente em um momento em que vai ser mais difícil conseguir ajuda médica, já que os sistemas de saúde em boa parte do Brasil colapsaram ou ameaçam colapsar. 

3. Desinfecção das ruas já não faz sentido

Pesquisadores ao redor do mundo têm chamado as ações de desifecção das ruas de “teatro da higiene”: um desperdício de recursos e tempo apenas para dar a sensação de que algo está sendo feito. 

Em um artigo, a socióloga e escritora turca Zeynep Tufekci, professora da Universidade da Carolina do Norte, comentou o fenômeno já nos primeiros meses da pandemia e criticou o que ela chama de 'políticas públicas inúteis e contraproducentes que apelam para as ansiedades ao invés de serem baseadas em evidências sustentáveis'.

Para Vitor Mori, engenheiro biomédico e pesquisador membro do Observatório Covid-19 BR, o "teatro da higiene" é perigoso porque a continuidade dessas iniciativas no Brasil tem atrasado a atualização de políticas públicas mais eficazes de prevenção à doença, avalia ele.

”Desinfecção de superfícies e medição de temperatura é pouco útil para um vírus que é transmitido pelo ar por pessoas assintomáticas e pré-sintomáticas”, diz.

4. Revisão sobre a volta ao trabalho com base nos testes IgG e IgM

Embora sejam chamados de testes rápidos por oferecerem resultados em menos de uma hora, os exames de anticorpos IgG e IgM para detecção de covid-19 têm uma dinâmica bastante complexa, desde o armazenamento até a maneira de serem interpretados. Logo nos primeiros meses da pandemia, esses testes foram usados para encontrar “marcas” da presença do vírus nas pessoas por falta de insumos para o exame mais confiável, o RT-PCR, que até hoje demora de 4h a 10 dias para o resultado. Uma série de condições fez os testes rápidos serem imprecisos, como a própria qualidade duvidosa dos produtos, a aplicação por profissionais nem sempre qualificados, armazenamento errado, variações climáticas que provocaram instabilidade e até o nível de carga viral das pessoas.

Muito usado como método de triagem, esses testes foram e continuam sendo úteis porque foram melhorados, alcançam mais gente e dão resposta mais rápida, por isso estavam sendo usados como condicionantes e orientadores para a volta ao trabalho, como lembra o farmacêutico e bioquímico Cláudio Paranhos, professor da UniFTC. 

Coordenador de saúde ocupacional da Fecomércio do Ceará e pesquisador do centro de inovação do SESI, o médico Cláudio Patrício explica que, embora isso tenha ocorrido no começo da pandemia, hoje o exame para detecção dos anticorpos não deve ser usado para diagnóstico da covid-19, portanto, não deve ser solicitado para definir o início ou término do afastamento das atividades de um trabalhador. 

Estes exames têm sido recomendados apenas para inquéritos epidemiológicos, ou seja, quando se quer detectar o grau de produção de anticorpos de alguém. Testes rápidos não podem ser usados para basear o retorno ao trabalho porque os resultados podem não aparecer positivos e o empregado seguir espalhando vírus no ambiente de trabalho. A avaliação para liberação ou afastamento tem sido feita com base na janela de dias e acompanhamento dos sintomas. Em geral, o afastamento dura, no mínimo, 10 dias, mas pode chegar a até 14 dias a partir do primeiro dia de sintomas.

5. Planos de saúde obrigados a cobrir testes

Desde março do ano passado, os planos de saúde estão obrigados a cobrir os exames do tipo RT-PCR para pessoas que desconfiam ou provavelmente estão infectadas. Só bem mais tarde, cerca de cinco meses depois da chegada do vírus, é que os testes rápidos, que medem anticorpos IgG e IgM, foram incluídos nesse rol de procedimentos dos planos, após muita discussão.

De qualquer maneira, o exame recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) é o RT-PCR, porque ele identifica o tipo de vírus da infecção e confirma a covid-19. Quando estiver com suspeita de síndrome gripal, a pessoa deve procurar o serviço médico para verificar qual exame será melhor indicado e, então, buscar a operadora do plano de saúde para pedir indicação de um estabelecimento que tenha cobertura para a realização do teste.

*Veja como saber quais pesquisas levar a sério:

Nem todo estudo é confiável e é preciso ter bastante cuidado ao se deparar com conteúdos científicos ou supostamente científicos. Entenda em três pontos básicos:

1. Há pesquisas preliminares que não foram revisadas por outros cientistas e que não foram publicados em revistas científicas.

2. Esses estudos são chamados de pré-prints e devem ser vistos com muita cautela. Muitos destes conteúdos evidenciam a necessidade de mais investigações sobre temas e não devem orientar nem a prática médica e nem a vida individual.

3. É preciso ainda mais atenção com pesquisas financiadas por empresas privadas porque pode haver conflito de interesses por trás dos resultados.

*Revisado por Ana Arnt, coordenadora do Blogs de CIência da Unicamp