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Da Redação
Publicado em 18 de fevereiro de 2019 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
Cento e dois conselheiros do Vasco da Gama assinaram na sexta, 15, uma carta de repúdio à homenagem feita ao Flamengo após a tragédia em que dez jovens atletas morreram no incêndio no Ninho do Urubu: foram colocadas duas bandeiras entrelaçadas na camisa do time: a do próprio clube e a do grande rival, além da mensagem: “Em frente juntos”.>
Segundo os conselheiros, foi ferido o estatuto do clube. “Os membros do Conselho Deliberativo abaixo mencionados repudiam de forma veemente a colocação da bandeira de um outro clube na sagrada e centenária camisa vascaína. A irrestrita solidariedade às vítimas da tragédia, que atingiu tantos jovens talentos, não pode servir de pretexto a gestos demagógicos, que atentam contra nossas tradições e ferem frontalmente o estatuto do clube.”, diz a carta. >
Dez jovens morreram os conselheiros estão preocupados com estatutos feridos!>
O “Time da Virada” tem uma das mais lindas histórias do futebol brasileiro! Foi o primeiro clube a ter um presidente negro: Cândido José de Araújo, em 1904. Foi também o primeiro a conquistar um campeonato importante - o carioca de 1923 - com jogadores negros na equipe.>
É o time de esquadrões, como o ‘Expresso da Vitória’, que atropelava seus adversários e conquistou 11 títulos entre 1942 e 1952, cinco deles cariocas (dois de forma invicta) e Torneio dos Campeões Sul-Americanos de 1948, o primeiro título internacional de uma equipe brasileira. Campeão da Libertadores, quatro vezes campeão brasileiro, campeão da Copa do Brasil, da Copa Mercosul, do Torneio Rio-São Paulo (58, 66 e 99) e 24 vezes campeão carioca. Como é grande o Vasco da Gama.>
É também o clube da “Resposta Histórica”, famosa carta enviada em 7 de abril de 1924, pelo então presidente José Augusto Prestes ao presidente da Associação Metropolitana de Esportes Athleticos (Amea), Arnaldo Guinle.>
No ano anterior, o Vasco havia conquistado seu primeiro título carioca, o há pouco citado campeonato de 23, com uma equipe repleta de jogadores egressos das camadas populares, muitos deles negros. O título vascaíno revoltou e assustou os clubes que comandavam a Liga Metropolitana de Desportos Terrestres (LMDT). No início de 24, houve uma cisão. América, Bangu, Botafogo, Flamengo e Fluminense fundaram a Amea. Segundo os clubes fundadores, a nova entidade surgira para garantir a manutenção de um futebol amador e a “moral no esporte”.>
O Cruzmaltino foi convidado para disputar a competição, mas o preço era a exclusão de 12 jogadores do clube, entre eles sete que haviam conquistado o título no ano anterior. De acordo com uma Sindicância da nova Liga, esses atletas eram “indivíduos despossuídos de condições morais para a prática do futebol”. Na prática, era uma medida racista.>
O Vasco recusou o convite. Saiu da liga, mas entrou para a história. “Estamos certos de que Vossa Excelência será o primeiro a reconhecer que seria um ato pouco digno de nossa parte sacrificar, ao desejo de filiar-se à Amea, alguns dos que lutaram para que tivéssemos, entre outras vitórias, a do Campeonato de Futebol da Cidade do Rio de Janeiro de 1923 (...) Nestes termos, sentimos ter de comunicar a Vossa Excelência que desistimos de fazer parte da AMEA”, diz um trecho da carta.>
A homenagem feita pelo clube ao Flamengo lembrou para a maioria o quanto a história vascaína é bela e magnífica. Não foi o que acharam os conselheiros. O que passa pelas cabeças e corações dessas 102 cabeças infelizes? Uma homenagem, pontual, ofende os estatutos do clube!>
Mas propaganda na sagrada e centenária camisa pode! Logotipo de multinacional na sagrada e centenária camisa pode! Só não pode na sagrada e centenária camisa solidariedade a um coirmão após uma grande tragédia. >
A repugnante carta do dia 15 de fevereiro de 2019 é uma afronta, ainda que sobre assuntos distintos, à carta de 7 de abril de 1924.>
Os cerca de 9,3 milhões de vascaínos, a quinta torcida do país apesar de todos os problemas nas últimas décadas, devem dar uma Virada História, mostrar que o clube ainda é o Gigante da Colina e expurgar, através do voto e de protestos, esses anões que sujam o nome do grande Club de Regatas Vasco da Gama.>
Navegar é preciso!>
Airton Gontow é jornalista e cronista>
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