Coronavírus: baiano está entre passageiros de cruzeiro proibido de atracar em Lisboa

Navio foi redirecionado para a Espanha após proibição de desembarcar em terras portuguesas devido à restrições de imigração

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  • Da Redação

Publicado em 14 de março de 2020 às 04:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

Uma noite de forró dentro do navio de Cruzeiros Soberano, da Pullmatur, seria uma comemoração dos último dias de viagem para os passageiros da embarcação. O que era para ser mais um dia de festa, virou uma maneira de se distrair durante a espera para chegar em terra firme, após bloqueios de imigração devido ao coronavírus impedirem que viagem terminasse no Porto de Lisboa, em Portugal, como era a programação inicial.

A bordo do cruzeiro, o professor doutor em direito patrimonial e educação, mestre de capoeira e criador da técnica hidrocapoeira, Odilon Góes, de 60 anos, seguia para a cidade do Porto, em Portugal, onde apresentaria o seminário A Arte da Capoeira como Veículo de Educação para a Transformação do Homem na Pós-modernidade. O plano era viajar pelo Oceano Atlântico e depois seguir com uma série de palestras. Além da Universidade do Porto, Odilon ainda iria para a Universidade de Salamanca, na Espanha, e para a Universidade de Bolonha, na Itália.

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O professor é um dos que teve o trajeto mudado devido à proibição das autoridades portuguesas de atracar no país. Com a mudança, todos os cerca de 2.300 passageiros devem desembarcar no Porto de Cádiz, na Espanha, a cerca de 500km do destino inicial. Programada para acabar na manhã desse domingo (15), a viagem se encerra na noite de sábado (14).

Os planos foram mudados de forma inesperada e não há forma de refazer a alteração. Em meio a impotência sobre seu próprio destino, Odilon conta que a sensação é de tensão e frustração entre os passageiros.

“A preocupação é visível. Estávamos preparados para atracar em Lisboa, mas por medidas governamentais, vamos para a Espanha”, relata.  “Eu estou frustrado porque me preparei por três meses para participar desse evento, mas as atividades foram suspensas e não existe uma expectativa de uma nova data”, revela.

Sem infectados Por volta do meio-dia da sexta-feira (13), uma voz surgiu no serviço de áudio do navio para contar que parar em Portugal não era mais uma opção. A solução para levar as pessoas para o destino inicial vai ser ir de ônibus da Espanha para o país vizinho. O professor, entretanto, vai ficar em terras espanholas para tentar apresentar o seminário em Salamanca, a única das universidades em que o evento não está completamente descartado. De lá, ele volta para o Brasil por Madri.

Apesar das mudanças de trajeto, o professor conta que nenhum dos seus colegas de viagem, que se tornaram amigos nesse cenário de indefinição, possui o novo coronavírus (Covid-19). “A equipe médica do navio observa a tripulação e os hóspedes. Foram feitos exames em todos que estavam com qualquer sintoma de gripe e ninguém está com a doença”, conta Odilon.

O resultado negativo para a doença é um alívio para quem segue viagem no navio que busca do seu novo porto. Sem casos de Covid-19, a vida no cruzeiro permanece agitada - nada de portas fechadas e isolamento dos outros colegas de jornada. “São todos uma família”, relata o professor sobre o convívio na embarcação. Odilon e o mestre de cerimônia do navio, Alexandre Sadan, durante a noite de forró (Reprodução/Arquivo Pessoal) As atividades do navio nunca foram suspensas. Com jantares, festas e peças de teatro, os passageiros resistem para não sucumbir à preocupação de ter que parar em um porto indesejado e enfrentar a Europa, considerada o novo epicentro da pandemia da enfermidade viral, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). “Ontem tivemos uma festa para rememorar o carnaval de Recife e Salvador”, relembra o professor.

Do itinerário original da viagem, Lisboa é o segundo local a não permitir o desembarque dos passageiros do Soberano. Animados para desbravar a cidade de Mindelo, em Cabo Verde, os viajantes tiveram a primeira decepção ao descobrir que foram proibidos de descer no local, no dia 9.

Para todos, a sensação foi e ainda é de frustração, relata Odilon. “Estávamos altamente curiosos para poder conhecer Mindelo, que tem uma história muito bonita. É uma ilha muito bonita e com espaços culturais interessantes”, comenta.

O próximo porto, em Santa Cruz de Tenerife, nas Ilhas Canárias, foi um alento após quase seis dias sem pisar em terra firme. No período em que puderam passear, a tranquilidade dos nativos amenizou a tensão dos passageiros. “Tudo estava aberto e ninguém usava máscara lá”, relata Odilon.

Quando o navio deixou as Ilhas Canárias, na noite da  quinta (12), o destino ainda era Portugal. Para quem saiu de Salvador, como o professor, a viagem começou em 2 de março. Ainda no Brasil, a embarcação atracou em Recife, a primeira parada do itinerário, em 4 de março.

Prevenção Mesmo em alto mar, todos os passageiros se mantêm informados sobre a situação da pandemia do novo coronavírus. Há cerca de 10 dias, quando deixaram as terras tupiniquins, já existia o alerta para a doença, mas muito mudou. Para se manter informados do que irão enfrentar assim que deixarem a embarcação, os viajantes assistem televisão, que possui canais abertos e fechados, e recebem informações pela internet. A tripulação ainda informa a todos sobre o que acontece no mundo fora do cruzeiro.

“No restaurante, tem álcool em gel, prevenção é constante, a gente não tem nenhum tipo de problema. Temos internet e lá conseguimos informações com os amigos que estão em terra firme”, conta.

Assim como Odilon, outros passageiros viajariam pela Europa, mas muitos desses planos também foram mudados, desta vez por decisão própria.

O professor é um dos que consegue manter a tranquilidade neste caos no meio do mar. Na noite da sexta (13), ele iria dançar forró com seus novos amigos do cruzeiro. Junto com o amor pelas viagens marítimas e o gosto pelas atividades na embarcação, fazer amizades é um dos motivos que o levou à viagem de navio para a Europa.

O criador da hidrocapoeira diz ser um homem do mar e acredita que tudo vai dar certo apesar de estar no meio do oceano. Ele diz nunca estar sozinho apesar de ter viajado sem acompanhantes. “Viajei com Deus e os meus orixás”, conta. No mar, ele sente que a proteção de sua ‘mãe’ Iemanjá, que segue o Soberano durante o caminho para o novo porto.

Situação em Portugal e na Espanha Nesta sexta-feira (13), o governo de Portugal decretou estado de alerta para mobilizar a polícia, o serviço de proteção civil e o Exército com o objetivo de juntar esforços para controlar a pandemia do novo coronavírus.Foram aprovadas quase 30 medidas de exceção, dentre elas a interdição de praias no Norte do país. Escolas, creches e universidades do país serão fechadas a partir desta segunda (16). Até às 22h16 (horário de Brasília) desta sexta, eram 112 casos confirmados de Covid-19 no país ibérico.   O primeiro-ministro espanhol Pedro Sánchez anunciou nesta sexta que a Espanha vai decretar estado de alarme durante 15 dias para conter a epidemia da enfermidade viral. A medida deve ser formalizada neste sábado (14) pelo Conselho de Ministros, segundo o "El País". Na Espanha, foram contabilizados 4.505 infectados até às 17h55 (horário de Brasília) desta sexta.

*Sob supervisão do subeditor Ivan Dias Marques