Coronavírus no futebol: muitos interesses financeiros envolvidos sem pensar no perigo

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  • Gabriel Galo

Publicado em 16 de março de 2020 às 07:42

- Atualizado há um ano

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Bill Shankly, histórico treinador do Liverpool entre 1959 e 1974, disse certa feita que “algumas pessoas acreditam que futebol é questão de vida ou morte. (...) Eu posso assegurar que é muito mais importante”.

Mas a sensatez, em meio a um esporte tão pautado pelas emoções, é onda passageira. Demorou para que as ligas mundo afora decidissem, depois que o problema Covid-19 tomou proporções pandêmicas com a chancela da OMS, suspender as competições sem data de retorno.

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O que, por questões óbvias, é o correto a se fazer. Evitar aglomerações é o passo número 1 para amenizar o contágio.

A Fifa deu seus passos. A primeira rodada das Eliminatórias para a Copa 2022 foi cancelada. Na sequência, a Conmebol, embora ainda mantivesse a rodada do meio de semana, anunciou a suspensão dos campeonatos. A NBA está congelada, a Olimpíada de Tóquio está por um fio, Copa América, Eurocopa e outras com luz amarela.

Todo mundo aparenta respeitar o que significa a crise. Exceto, pois, o Brasil.

Campeonatos ainda não estão oficialmente suspensos. A Liga do Nordeste, por exemplo, iria se reunir nessa terça-feira (17) para decidir se interrompe o calendário ou se prossegue com o despautério dos estádios com portões fechados. Nos estaduais, ninguém sabe exatamente o que fazer.

Pesa-se neste adiamento com a barriga uma série de questões comerciais. Como encaixar o calendário numa temporada com poucas datas? Como honrar contratos? Como fica a questão salarial? Muitos interesses financeiros envolvidos, sem se darem conta do perigo que se pretende estimular.

Porque, num cenário de crise como este, buscar certeza é, sobretudo, estupidez. Ainda mais sob uma gestão pública que ignora os sintomas coletivos e faz desfile público para propagar a incompetência.

Na sanha de buscar um meio termo inalcançável, conseguiram ferir no coração o futebol: os jogos sem torcida. Como se os jogadores estivessem num zoológico, presos a jaulas para serem observados por espectadores passivos, e fossem reduzidos a gente que não deve ser protegida. Se juntar gente não pode, então, jogador não é gente; jogador é bicho que corre para cumprir acordos e que assim seja, graças ao deus-mercado; jogador é ser escravizado atuando ao bem-entender do mestre.

E quem experimentou testemunhar jogos sem gritos de arquibancada pôde atestar a insuportabilidade do deserto. Percebe-se o desânimo em campo, como se a cabeça dos atletas estivesse em outras preocupações muito maiores, muito mais importantes, enquanto os grudados nas telas mudavam de canal para evitar a vergonha ver o esporte que tanto amam ser ferido em sua honra sem direito a resposta, para desespero dos engravatados que, alheios à razoabilidade, querem forçar goela abaixo o entendimento de que está tudo normal.

Contrariamos, pois, o que o mundo inteiro concordou em pausar, por fatores que, de tão irrelevantes, atribuem mais novo capítulo de mesquinhez ao maior esporte do planeta, de reputação já tão abalada. Conseguiram, os "jeniais jestores", fazer com que ansiemos pela interrupção, pelo bem de todos os envolvidos.

Assim, vemos os donos das canetas partirem para o enfrentamento semântico da verdade de Bill Shankly, incapazes de ver o ridículo desta proposição. Talvez aprendam na dor a irresponsabilidade de seus atos, reduzindo, por fim, o futebol a uma questão de vida ou morte.

Gabriel Galo é escritor