Das festas em família aos grandes espetáculos: o que mudou no São João de Amargosa

Nos últimos 30 anos, a festa junina deixou de ser um evento de família para se tornar uma mega estrutura com artistas de peso

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  • Gil Santos

Publicado em 23 de junho de 2021 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: divulgação
. por Fotos: Regina Vaz/ Acervo Pessoal

As fotos em preto e branco das moças de vestido rodado e dos rapazes de camisa quadriculada caminhando pela praça de movimento tímido guardam a memória de um São João que não existe mais em Amargosa, cidade incrustrada no Vale do Jiquiriçá e considerada uma das joias do período junino na Bahia. E o que as fotos não revelam os moradores mais antigos recordam sem muita dificuldade. Ainda mais neste ano, quando não haverá São João por conta das restrições da pandemia.

O CORREIO está mergulhando na história das festas mais famosas de São João na Bahia. Depois de Cruz das Almas e Senhor do Bonfim, a escolhida da vez é Amargosa. Até os anos 1990 as quadrilhas se apresentavam dentro ou na frente das escolas (Foto: Regina Vaz/ Acervo Pessoal) A cidade de 37 mil habitantes recebe cerca de 100 mil pessoas durante os seis dias da festa de São João. É tanta gente chegando pela rodoviária, de carro particular ou em excursões coletivas que falta espaço para abrigar a multidão. Dezenas de fãs do forró acabam se acotovelando para dividir um cômodo. Do lado de fora, palcos são montados para as grandes atrações do momento. É uma correria, mas nem sempre foi assim.

A professora Regina Vaz, 80 anos, é uma das personalidades mais conhecidas de Amargosa. Bastou dizer para os moradores o motivo da reportagem para citarem o nome dela. É que a professora tem um acervo pessoal da memória da cidade, com milhares de fotos das festas, momentos históricos e do dia a dia do povo. Tudo catalogado. Ela contou que, antes dos anos 1990, essa era uma festa exclusivamente de família.  

“As casas e as ruas eram enfeitadas, cada família fazia sua fogueira, realizava jogos, soltava fogos e balões. Quem tinha sítio fazia a festa por lá, e o número de visitantes era pequeno, somente os familiares. Todo mundo se trajava, e os músicos com sanfona e triângulo que saíam de porta em porta eram a única atração. Não existia palco nem eventos com apresentações. O movimento na praça era muito tranquilo”, contou. São João era festa apenas de família, sem shows ou espetáculos (Foto: Regina Vaz/ Acervo Pessoal) Em 1990, pela primeira vez, as quadrilhas que se apresentavam dentro das escolas foram convidadas para fazer uma apresentação em público. Nessa época, 'pró' Regina lecionava para o 1º ano e foi jurada no concurso que escolheu a melhor quadrilha. A festa se repetiu em 1991, mas ainda era algo pequeno e que acontecia durante o dia. Até que em 1992 a prefeitura organizou um evento com palco e atrações à noite. Era o começo de tudo.

“Eu ainda tenho o cartaz que anunciava a festa e as atrações. A partir dali a festa só cresceu. Até que em 2001 tem uma nova mudança, eles criam uma vila junina dentro da cidade, com casinhas, coreto, tudo o que tem uma vila de verdade. A cidade começa a receber muitos turistas e se torna esse evento grandioso conhecido até fora do país”, disse. Cartaz de 1992 convidando o público para o primeiro arraiá da cidade (Foto: Regina Vaz/ Acervo Pessoal) Ainda acontecem apresentações de quadrilha, mas em uma proporção muito pequena se comparada com antes de 1990. O músico Peu Meurray, que foi aluno de Regina e hoje é um dos principais sanfoneiros da cidade, lembra que algumas ruas eram tão tradicionais que recebiam nomes por conta da festa.

“Existia a rua do Fogo, por causa da quantidade de fogueiras que os moradores acendiam, a rua da palha e outras mais. O São João é uma festa que agrega. Então, muitos parentes só se reencontram nessa época, e isso é lindo. São três santos. Santo Antônio, São João e São Pedro. É um mês abençoado. A festa mudou bastante, é verdade, mas continua muito bonita”, afirmou.

Ele acredita que o sucesso do São João da cidade tem relação com a receptividade do povo, com a culinária saborosa, e com as paisagens. “Amargosa não fica em nenhuma passagem. Você não passa por Amargosa, você precisa vir a Amargosa. E se vir, você vai amar”, aposta.

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Investimento Em 2019, último ano de arraiá antes da pandemia, a festa movimentou cerca de R$ 16 milhões durante seis dias. Naquele ano, Amargosa exibiu 20 atrações musicais famosas com nomes de peso como Geraldo Azevedo, Xand Avião, Targino Gondim, Estakazero, Dorgival Dantas e Marília Mendonça.

A prefeitura afirma que para manter a cidade na lista dos principais destinos no São João é preciso investimento. O diretor de Cultura e Turismo de Amargosa, Carlito Munhoz, contou que os preparativos começam cedo. “Amargosa se prepara para esta data praticamente desde que o próprio São João acaba, quando os investimentos começam a ser feitos nas melhorias para o próximo ano”, disse. Prefeitura começou a investir na festa nos anos 1990 (Foto: Regina Vaz/ Acervo Pessoal) A cidade também tinha festas particulares no São João. Elas começaram nos anos 1950, quando um clube da cidade organizou um evento com quadrilhas, jogos e até casamento na roça, com direito à noiva chegando de charrete. A professora Regina Vaz, 80 anos, guarda algumas fotos, mas lamenta o fato de nenhuma ter o registro da charrete.

“Foi um evento grande e que até então era uma novidade. Depois disso, outros grupos começaram a organizar suas próprias festas, mas era algo particular. Na cidade mesmo, o clima era diferente. As famílias se reuniam para celebrar, mas não tinha apresentações. E as festas particulares também não tinham esse caráter que tem hoje, de show, de espetáculo. Elas também mudaram bastante”, contou.

Atualmente, existem grupos como o bando anunciador Acorda Maria Bonita e o famoso Arrastapé Zona Rural que fazem suas próprias festas dentro do São João da cidade. Para quem não mora na região, no entanto, o Forró do Piu Piu é o mais conhecido. Em 2019, aconteceu a 23ª edição da festa, com uma grade com nomes como Léo Santana, Zé Neto e Cristiano, Lambassaia, Forró do Tico e Wesley Safadão. Forró do Piu Piu também é tradição (Foto: divulgação) São João digital do CORREIO  Nesta quinta-feira (24) tem arraiá no CORREIO. Para animar os baianos que estão sentindo falta dos festejos juninos, cancelados pelo segundo ano consecutivo por conta da pandemia, o jornal traz o São João no Correio Ao Vivo. Funciona assim: primeiro, você arrasta o sofá e a mesa, e deixa a sala livre. Em seguida, arruma um parceiro de dança e sintoniza nas redes sociais do jornal. Depois, é só aproveitar as atrações.  

A festa começa cedo, as transmissões acontecerão a partir das 18h30, pelo Youtube, Instagram e Facebook do jornal. Nesta quinta-feira (24), principal dia da folia, haverá as participações de Fulô de Mandacaru, Léo da Estakazero, Cicinho e Juli de Assis, Targino Gondim e Bete Nascimento.

O São João no Correio conta com o apoio da Perini, Mahalo, E Stúdio, ITS Brasil, Hotel Vila da Praia e Blueartes.