‘De fato, nós lemos muito pouco’, diz co-fundador da Tag Livros

Em entrevista ao CORREIO, Arthur Dambros, analisa o futuro do setor no Brasil e comenta também sobre como o clube de assinaturas conseguiu crescer na pandemia

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  • Priscila Natividade

Publicado em 29 de novembro de 2020 às 16:00

- Atualizado há um ano

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Em um país que perdeu 4,6 milhões de leitores em quatro anos, onde só pouco mais da metade tem hábitos de leitura (52%) e o livro mais lido é a Bíblia — dá para enxergar um futuro para o varejo de livros? Os números mais recentes da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró Livro, em parceria com o Itaú Cultural, demonstram um cenário de queda no percentual de leitores, porém, não desanima o mercado, sobretudo, o online, que mostra que o brasileiro precisa combater a fama de que não gosta de ler.

“Os números não mentem e, de fato, nós lemos muito pouco. Mas temos muito potencial. O jeito é falar de livro com gosto, com prazer, com empolgação. Ou seja: eu acho que brasileiro gosta de ler, sim — só precisa descobrir”, é o que defende o co-fundador e vice-presidente da Tag Livros, Arthur Dambros.

Segundo dados  do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no segmento de livros,  o varejo acumula  uma queda no ano de 30,5%. Enquanto isso,  46% dos brasileiros aumentaram o volume de compras online durante a pandemia,  conforme aponta a bandeira de cartões de crédito, Mastercard. O cenário favorece negócios como a  Tag, que  cresceu quase 20% nos últimos meses.

Na Bahia, 52,6% dos assinantes estão no clube Curadoria e 47,4% são do clube Inéditos. Ainda de acordo com Arthur, seis em cada dez dos assinantes são do gênero feminino. “A pandemia fez com que nós focássemos mais nas interações digitais, desenvolvendo novas funcionalidades no aplicativo e criando campanhas de leitura conjuntas para engajar os associados”, acrescenta Dambros.  

A gente tem visto nos últimos tempos o fechamento de lojas físicas de grandes varejistas de livros, surgimento de autores via perfis de redes sociais. O futuro do mercado editorial está no online?

O modelo de megastore tende a não mais se sustentar, mas penso que veremos, aos poucos, um aumento do número de livrarias menores, com foco em curadoria e atendimento, afinal, muitos leitores, adoram  a experiência de circular pelas livrarias.Ou seja, o varejo físico não vai morrer, e talvez até pare de reduzir e comece a crescer. Porém, acredito  que as taxas de crescimento dos canais online do mercado editorial seguirão sendo maiores.O que esse futuro reserva ao segmento?

Teremos um varejo físico mais como experiência do que como um simples canal de vendas e o online permitirá novos modelos de negócios,  e com sorte conseguiremos fazer os livros serem mais lidos, falados, consumidos. Assim, conseguiremos dar mais visibilidade e trazer mais inovação, dando a relevância que o livro merece, quem sabe transformando-o em “pauta de conversa de bar”, tanto quanto são os eventos esportivos, os filmes e os seriados.

Distanciamento,  e-commerce e  lazer no ambiente doméstico, como a leitura. Como a  Tag cresceu na pandemia? 

Sim. O impulsionamento do varejo online teve alguns efeitos positivos sobre nós. A comodidade de receber em casa e o auxílio que o clube oferece na curadoria dos livros, além do relacionamento entre a própria comunidade, aumentaram o número de assinantes no período. 

Qual o caminho para a inovação e integração entre o mundo on e offline?Cada um entende de que forma serve ao leitor: que valor eu entrego? O varejo online não compete com o varejo offline. São formas diferentes de oferecer algo. E o que ele quer de um e o que do outro? Entender e responder isso com produtos e serviços é o que precisamos fazer.

 De que maneira a Tag faz essa curadoria? E o brasileiro gosta ou não gosta de ler?Precisamos lutar contra esse estigma do brasileiro que não gosta de ler.  A nacionalidade não é a causa própria da não-leitura. As causas estão por trás disso. Mas acredito que o próprio fato de a Tag ser referência global em clube de livros, reconhecida internacionalmente pelo Quantum Publishing Innovation Award, e de sermos brasileiros, indica que temos a crescer ainda nessa quantidade de leitores. 

 Como ser realmente diferente no mercado de livros e transformar o produto em experiência?O segredo é pensar no cliente, no que é valor para ele e de que forma eu posso criar produtos e serviços que entreguem esse valor. Sempre partir daí. Na Tag, supomos que as pessoas gostariam de uma experiência de consumo diferente e fomos concebendo isso pensando no leitor. Os livros surpresa para gerarem expectativa e permitirem uma fuga da zona de conforto. A revista para dar conteúdo pré e pós-leitura. O modelo de assinatura para dar periodicidade à leitura. Enfim, uma comunidade para trocar opiniões, impressões e fazer amigos.

QUEM É

Arthur Dambros  é gaúcho, co-fundador e vice-presidente da Tag — Experiências Literárias, clube de assinatura de livros, pioneiro no Brasil. Em 2018,  a startup,  que nasceu no Rio Grande do Sul, foi reconhecida internacionalmente pelo Quantum Publishing Innovation Award, na London Book Fair de 2018, como a inovação do ano no mercado mundial do livro. Arthur é formado em Administração de Empresas pela UFRGS.