Desobedientes e atemporais

Por Flavia Azevedo

  • Foto do(a) author(a) Flavia Azevedo
  • Flavia Azevedo

Publicado em 2 de agosto de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Num mundo obcecado por juventude e cheio de regrinhas sobre o que devemos ou não fazer, a cada idade, o que têm em comum as mulheres que "envelhecem" sem vergonha, sem preocupações excessivas e cheias de vitalidade? Desobediência pura. Donas de si, lá vão elas passando pelo tempo, como se nada houvera. Chegam e se vão os 50, os 60, os 70 e tá tudo bem a ponto de chamar a atenção. A despeito do que queiram nos vender como "fonte da juventude", todas elas confirmam que o segredo é apenas um: cada uma do seu jeito, disse "dane -se o padrão". Hoje, a gente tá aqui pra desafiar limites, conhecer essas histórias e trocar inspirações. Jane Carvalho, 54 anos, jornalista "Resolvi correr uma maratona quando diziam que era exagero, que não era saudável, que era maluquice e que eu ia envelhecer rapidamente. Na época eu tinha 44 anos. Hoje, a minha paixão são as provas de longas distâncias (acima de 100km) de trilhas em montanhas. Gosto de passar dias e noites em contato com a natureza. Não tenho o menor problema de dizer a minha idade. Hoje, menos incômodo do que quando eu era jovem porque nessa época sempre me davam muito menos que eu tinha. Gosto da minha idade porque aprendo cada vez mais a usufruir o melhor que a vida oferece. Ela não tem trazido restrições. Pelo contrário, sou independente financeiramente e posso dizer que meu corpo hoje é mais forte e aguenta fazer muito mais do que fazia quando era mais jovem. Não posso reclamar. Hoje, muitos me questionam o fato de viajar sozinha para lugares remotos e de gostar de correr ultramaratonas. Acho que isso não tem a ver com a minha idade. Está mais relacionado ao fato que são coisas diferentes, fora do padrão. Ao mesmo tempo intrigam e fascinam. Sempre gostei de vestir o que gosto. Tenho estilo esportivo e adoro biquíni de lacinho, por exemplo. Se teve alguém que me olhou esquisito por causa disso nunca notei. Não me vejo deixando de fazer algo que quero por causa de minha idade. Pelo contrário, hoje me permito cada vez mais deixar de fazer o que não quero. E somente o tempo lhe permite ter esse luxo". Sônia Jonas, 74 anos, historiadora "Envelhecer é uma dádiva, porém difícil pra caramba, principalmente por nos dar a certeza da nossa finitude. Contudo, a vida tem que ser vivida com muita vontade e com sentido, independe da idade cronológica. Esta tem que ser só um detalhe e não um peso. As cobranças sempre existirão em relação às mulheres, na família e na sociedade, em qualquer idade (mais ou menos), a depender da cultura em que vivem. Que conquistem e usufruam então, da sua liberdade, com responsabilidade e a segurança da sua importância no mundo". Sued Tosta, 61 anos, administradora "Sou filha de uma mulher de 86 anos proativa e jovem, neta de outra que aos 101 anos falava de liberdade e independência feminina, mesmo sem ter vivido. Tenho três filhos e sete netos. Destes, dois com 18 anos, já parceiros nas atividades sociais, culturais e esportivas como ciclismo (meu hobbie), stand up, rappel e viagens. Ter 61 anos não me limita a ação alguma. Visto o que gosto e como me convém. Escolho vinho, cerveja ou uísque e bebo quando quero. Namoro, pois sexo nos deixa ativas e bonitas. Percebo olhares aplausivos e ou críticos, mas sigo pelo que me faz bem, pois, vi muitas mulheres jovens partindo desse mundo por buscarem melhorar corpo sem melhorar mente e sabe onde estão? Mortas. Até os dias atuais, tenho vivido normalmente conforme vivi dos 20 aos 40 anos, usando esse período como medida de consentimento e plena condição física, mental e intelectual. Tenho vida social, sexual, intelectual e física ativa e normal". (Foto: Amanda Ortega) Stella Carrozzo, 53 anos, artista plástica, curadora, gestora cultural "Dos 20 aos 30, perdi algum tempo me preocupando com esta questão (da idade), a partir daí, não mais. Em nosso corpo, as respostas: a lei da natureza, que é uma lei inexorável, diz: tudo é impermanência. O universo material é todo composto de partículas ou “unidades indivisíveis”, com qualidades básicas da matéria: massa, coesão, temperatura e movimento, que se combinam para formar estruturas; estas partículas, na verdade, estão surgindo e desaparecendo constantemente. Nosso corpo é exatamente assim; logo, não há sentido algum, para mim, em se preocupar com algo que acontecerá inevitavelmente, queiramos ou não. Isso, obviamente, não me impede de cuidar do meu corpo. Quero viver bem por algum tempo, ainda, mas não lamento o tempo que passou. Vivo o presente. Adotei práticas que provavelmente me permitirão prolongar, com qualidade, meu tempo de vida: medito e procuro ter uma conduta cada vez mais ética comigo e com o próximo, nado e caminho regularmente, sou vegetariana (mas por uma questão ética e moral, por respeito aos animais, por isso, tampouco consumo leite e derivados), deixei de fumar e beber, bebo muita água. Quando quero, danço e, sobretudo, rio muito de mim mesma. Ser feliz, hoje, é atividade das mais subversivas. E leio poesía: a poesia é revolucionária. Já recebi de amigas “conselhos” para não usar determinadas peças de roupa sob a alegação de que não são adequadas à minha idade, ou de que uma relação com homens mais jovens está fora de cogitação. Fui muito criticada por, “nesta idade”, mudar de país e querer começar nova vida. Viver só, então, com um filho de 13 morando com o pai, para alguns (homens e mulheres) é um escândalo! Por sorte, como dou cada vez menos importância à opinião alheia, estes “conselhos” são descartados imediatamente e eu vivo da maneira que acho correta. Não sei – e sinceramente não me interessa minimamente – o que esperam ou pensam de mim. A única coisa que sigo é a minha consciência, que está muito bem fundamentada no amor e respeito a mim mesma e ao próximo – e, sobretudo, aos menos favorecidos."