Documentário resgata a cozinha patrimonial e a influência africana na culinária baiana

Chef Leila Carreiro, do Dona Mariquita, pesquisa nos terreiros e quilombos pratos da cozinha baiana para incluir no cardápio da casa

  • Foto do(a) author(a) Ronaldo Jacobina
  • Ronaldo Jacobina

Publicado em 10 de julho de 2021 às 10:56

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: João Lins/Divulgação

Ao longo dos anos, muitas receitas da chamada comida de raiz vêm se perdendo. Seja pelo desuso, seja pelas novas técnicas da gastronomia contemporânea, seja pelo desconhecimento ou até mesmo por não se encaixarem na culinária comercial. 

Mas nem tudo está perdido. Para nossa sorte, muitos estudiosos se dedicam à pesquisa e resgate das tradições culinárias que vieram lá da África, matriz da comida com DNA baiano. Um destes profissionais é a cozinheira Leila Carreiro, que há 15 anos comanda o restaurante Dona Mariquita, no Rio Vermelho, cujo cardápio privilegia receitas tradicionais na forma como ainda são preparadas nos terreiros ou nos quilombos. Leila Carreiro pesquisa a cozinha de raiz há mais de uma década (Divulgação) A paixão de Leila pela cozinha patrimonial começou a partir da leitura do livro A Cozinha Africana na Bahia, do pesquisador Guilherme Randal. “Quando li esse livro, que me foi dado pelo autor, mergulhei nesse universo e resgatei diversos pratos que foram incluídos no cardápio do nosso restaurante. Daí não parei mais de buscar conhecimento sobre receitas que caíram em desuso”, conta a cozinheira. 

Assim, Leila Carreira tornou-se também uma pesquisadora da gastronomia de herança africana e passou a acalentar o sonho de produzir um documentário para contar essa história. E a oportunidade veio justamente no período de vacas magras provocado pela pandemia, que por pouco não levou o seu restaurante à bancarrota. 

Buscando alternativas para continuar seu trabalho Leila entrou de cabeça no projeto Cozinha Patrimonial - A influência africana na culinária baiana, um documentário que estreia hoje no canal do projeto no YouTube.  Pratos apresentados no documentário foram incluídos no cardápio (Divulgação) O audiovisual, que mistura videoaula e videoreportagem, nasceu graças ao edital de Prêmios de Preservação dos Bens Culturais Populares e Identitárias da Bahia Emilia Biancardi 2020, via Lei Aldir Blanc, e busca levar para a tela um vasto repertório de estudos construídos a partir de um caldeirão de referências da autora. 

Para dar ainda mais peso ao projeto, a cozinheira convidou o antropólogo Vilson Caetano, a mestra griô Vó Cici, Ananias Viana, membro da comunidade quilombola do Kaonge, e o historiador Elmo Alves.   Focado na preservação e na promoção das culturas identitárias afro-brasileiras, o documentário destaca especialmente três ingredientes: o quiabo, o inhame e a pimenta. 

“A proposta é colocar em primeiro plano receitas que chegaram à Bahia pelas mãos de homens e mulheres escravizados, oriundos de diversas regiões da África, mostrando como a cultura alimentar desses povos ancestrais foi apropriada pelos baianos”, explica. O antropólogo Vilson Caetano fala sobre cozinha de herança africana no doc (Divulgação) O audiovisual destaca ainda técnicas e utensílios, o simbolismo das comidas votivas das religiões de matriz africana e as releituras decorrentes da fusão com as influências portuguesa e indígena são alguns dos aspectos abordados no trabalho. 

A produção acompanha Leila Carreiro em visitas a terreiros e comunidades quilombolas, compras em feiras e, claro, mostra a chef de cozinha em ação, ensinando a preparar receitas que irão compor o Banquete Patrimonial. Como o Amalá na Gamela, que é uma quiabada com pirão de angu que homenageia o orixá Xangô e cuja receita a cozinheira disponibiliza para os leitores do CORREIO.

Vale destacar, dentre as visitas feitas pela equipe, o quilombo Kaonge, onde se concentra 70% da produção de quiabo que abastece a capital baiana. Imperdível! Para assistir, clique aqui.

RECEITA

Amalá na gamela (Quiabada com angu) 

Ingredientes: 1 cento de quiabo/2 cebolas/1 pimentão/4 dentes alho/1 molho coentro/100g de camarão seco/ 250g de bacon/250 salpresa/ 250g de charque/ 500g de músculo bovino/1 fio de azeite de dendê

Preparo: Corte todas as carnes em pedaços pequenos. Coloque as carnes salgadas para dessalgar por duas horas. À parte, faça o mesmo com o camarão. Lave o quiabo e corte em rodelas. Corte a cebola, o pimentão e o coentro e amasse o alho. Numa panela de pressão, coloque o bacon para fazer a gordura do fundo e acrescente o alho amassado e todas as carnes cortadas (não precisa colocar óleo nem sal). Após a panela pegar pressão, deixe cozinhar por 20 minutos. Desligue, tire a tampa, acrescente os temperos e mexa. Depois coloque o quiabo, o camarão e o fio de azeite de dendê e cubra de água deixando cozinhar por mais 10 minutos. 

Angu de farinha  

Ingredientes: 100g de farinha de mandioca/ 2 dentes de alho/ 600ml de água/ sal.Preparo: Numa panela coloque meio litro de água com sal e o alho amassado. Antes de ferver, vá colocando a farinha aos poucos e mexendo sempre até engrossar e virar um pirão. Continue mexendo até começar a soltar da panela. Sirva quente com a quiabada. Se quiser, acrescente algumas pimentas malaguetas inteiras para decorar.

Serviço: @donamariquita Rua do Meio, nº 178, Rio Vermelho – Telefone: (71) 3334-6988