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Da Redação
Publicado em 10 de março de 2019 às 05:00
- Atualizado há um ano
Estreei no jornalismo por obra e graça do ‘deustino’. Tinha 21 anos. Cursava – e odiava – Administração de Empresas na Universidade Federal da Bahia (UFBA) - onde passei a estudar Jornalismo em 1977. O que de fato me siderava era cinema. Via dois ou três filmes por dia – e meus ‘chapas’ sabiam – (eu tinha um milhão de amigos) – dessa paixão.
Certa manhã de agosto de 1975, Jônatas Conceição – com quem perdi, coisas da vida, completamente o contato – estudante de Letras, me encontrou no Vale do Canela, nesta Salvadores, e anunciou, cheio de alegria: - O cara que escreve sobre cinema em A Tarde vai tirar três meses de férias. Vai lá e se oferece. Fui lá – me ofereci – e me aceitaram no ato. [Detalhe: o crítico titular era politicamente reacionário – pior, homofóbico – e eu, bem, eu era/sou eu, sou o que sou desde o berçário – e nadar contra a corrente sempre foi meu hobby predileto].
Nessa nova função que me arrebatava, escrevi algo que não deveria e que na verdade me arrependi de ter escrito. Fui chamado às pressas à sala do imediato do dono do jornal, que, apoplético, me disparou perdigotos fétidos e adjetivos selvagens. Depois dessa catarse histérica, na qual quase teve um troço, decretou: - Volte amanhã e fale com Doutor Jorge! Manhã seguinte, ao entrar na sala do dono do homem que decidiria o meu futuro, eu tremia e suava. Mandou-me sentar. Gentil, ofereceu-me água. Aceitei, Em voz cadenciada e afável, como lhe era peculiar, afirmou sem hesitações: - Jovens comunistas escrevem bem. O senhor não é exceção, escreve muito bem para a sua idade. Poderia contratá-lo, mas não vou fazê-lo. O senhor seria má influência na redação. Mas quero que o senhor seja nosso colaborador. Poderá fazer frilas quando quiser. Converse com o chefe de reportagem!
[Meu coração saltou pela boca. Quis beijar aquele cavalheiro distinto que me tratava de maneira tão firme e tão cordial. Pensei em lhe apertar a mão, balbuciei um obrigado inaudível, e ouvi: - Agora pode ser retirar!]. [Escrevi, e fui remunerado, por muuuitos textos que escrevi para o jornal A Tarde].
Apesar da minha fama, procedente, de ‘enfant terrible’, sempre me faziam convites de trabalho. Em junho de 1979, seis meses depois de o CORREIO DA BAHIA – hoje este CORREIO* - ser inaugurado, fui contratado para integrar a equipe de craques do Caderno 2. Fizemos história. Produzíamos ótimas entrevistas, reportagens instigantes, edições arrojadas – sob a batuta do sisudo e competente jornalista Gutemberg Cruz.
Um dia me passaram a seguinte pauta: escrever texto sobre os 20 anos do antológico jornal O Pasquim. Escrevi texto demolidor. Procurei emular o espírito irreverente e sarcástico do ‘hebdomadário’ no qual aprendi a ‘ler’ no começo da adolescência. Resultou texto polêmico e recheado de ousadias retóricas. Choveram elogios. A alegria durou pouco. Depois do almoço, soube: seria demitido. Mandaram-me conversar sobre a questão com Dudu, o diretor comercial.
Subi a escada para o segundo andar esbaforido. Bati à porta, e vi rapaz que me parecia espelho – jovem, de bela estampa e sorriso franco. Pediu com voz suave: - Sente-se! Obedeci. Perguntou com ironia: - Então você é o ‘famoso’ Rogério Menezes??!!. Já tinha ouvido falar sobre você, mas só agora leio o seu texto. Quer saber? Acho bacana. Aconselharam-me que o demitisse. Mas não vou. Pode continuar trabalhando conosco. Escreva sempre dessa maneira divertida e atraente, mas, por favor, ‘manere’ na linguagem. [Agradeci, apertei-lhe a mão, e desci para avisar sobre minha não demissão aos queridos colegas, que vibraram]. [Fiquei no jornal por mais dois anos, talvez três. Nunca mais revi Dudu].
[Quem era quem nesta trama]. [Doutor Jorge era Doutor Jorge Calmon (1915-2006), honra e glória do jornalismo baiano, e homem elegante no trato e na maneira de vestir – sempre usava ternos impecáveis. Dudu era Luiz Eduardo Magalhães, deputado federal por três mandatos e que se tornou um dos políticos mais notáveis da República no final do século XX. Morreu precocemente, de infarto, aos 43 anos, em 1998]. [Só me resta repetir o que meus ancestrais diziam: - ‘Que Deus os tenha em bom lugar’! Amém!]