'Ele acordava a gente com o violão': programa em homenagem a Moraes Moreira relembra histórias

Cantor das multidões foi o tema do programa Os Carnavais de Moraes, promovido pelo CORREIO

Publicado em 16 de fevereiro de 2021 às 17:26

- Atualizado há um ano

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Moraes Moreira é indestrutível. Foi assim que Paulinho Boca de Cantor falou do amigo, velho companheiro dos Novos Baianos e autor de centenas de composições que ele, ainda hoje, canta todos os dias. Mas não é só para Paulinho que Moraes está presente o tempo todo: na tarde desta terça-feira de Carnaval (16), amigos, colegas e parceiros, cada um no seu canto, contaram velhas histórias do cantor das multidões no programa ‘Os Carnavais de Moraes’, produzido pelo CORREIO.

Transmitido ao vivo pelas redes sociais do jornal – Facebook, Instagram e YouTube –, o programa foi apresentado pelos jornalistas Osmar Marrom Martins e Jorge Gauthier e contou com as participações, ao vivo, de Paulinho Boca de Cantor, Armandinho e Larissa Luz. Eles contaram memórias dos seus Carnavais com Moraes Moreira e também cantaram suas músicas preferidas.

Moraes também foi lembrando, em depoimentos coletados para o programa, por nomes como Davi Moraes – o filho que, nos últimos anos, se transformou em parceiro de palco e de estrada –, Carlinhos Brown, Márcio Victor, Thiago Dantas – do Bloco Alvorada –, Ricardo Chaves, Bell Marques, Sarajane, Margareth Menezes e Daniela Mercury.

Quem acompanhou a transmissão ao vivo pôde ouvir Paulinho cantar Mistério do Planeta, Armandinho soar os acordes de Chame Gente, Larissa Luz cantar Preta Pretinha e Acabou Chorare. Ainda rolou Pombo Correio, com Márcio Victor, Chão da Praça, com Ricardo Chaves, Carnaval em cada esquina, com Bell Marques, Frevo do Trio Elétrico, com Sarajane, e Monumento Vivo, canção de Moraes e Davi para Daniela Mercury. Armandinho foi um dos convidados do programa ao vivo (Foto: Reprodução) As histórias contadas atravessaram décadas. Paulinho Boca de Cantor falou sobre os primeiros anos ao lado de Moraes nos Novos Baianos e como o grupo foi formado. “Moraes e [Luiz] Galvão chegaram do interior em 1968 e as famílias deles achavam que eles eram uma dupla de compositores para fazer músicas para os outros cantarem. Quando eu me juntei a eles, o Tom Zé disse: ‘Vocês têm que seguir juntos porque vocês ficam mais fortes. Já tinha a Baby [Consuelo], aí chega o Pepeu [Gomes] e aí foi que a gente criou essa nova família, essa trupe musical que deixou um legado muito grande e que é referência para novos artistas”, contou.

Amigo inseparável de Moraes, Paulinho falou da felicidade em participar da homenagem ao amigo.“A gente fica muito feliz em participar dessa homenagem a ele. Moraes está presente na minha vida todos os dias. Nós éramos amigos inseparáveis, a ponto de minha mulher dizer: ‘Seu namorado tá aí no telefone lhe chamando’. Ele me ligava 10 vezes por dia”, contou Paulinho.Ele escolheu duas músicas para cantar em homenagem ao parceiro: Mistério do Planeta, do álbum Acabou Chorare (1972), e Incendiou o Brasil, do Trio Armandinho, Dodô e Osmar. Paulinho Boca de Cantor contou histórias desde o tempo dos Novos Baianos (Foto: Reprodução) História de Chame Gente Um dos maiores sucessos de Moraes Moreira, Chame Gente é uma parceria com Armandinho lançada em 1985. Mas essa história começou bem antes e foi contada por Armandinho durante o programa. Ele contou que fez, em 1976, uma saudação ao Carnaval. Nada mais era do que a melodia inicial de Chame Gente.“Moraes pediu pra pegar a saudação do Carnaval de 1976 e botar em frevo. Quando ele mostrou a letra, rapaz... a letra veio caindo... Quando ele falou: ‘Sagrado e profano, o baiano é...’, eu falei: Carnaval! E ele: ‘Não, rapaz, a palavra ainda não é essa...’. E eu: claro que é, bote aí, Carnaval”, lembrou Armandinho, aos risos.O nome, Chame Gente, veio três dias depois desse primeiro encontro, na hora de fazer o refrão. “Ele me ligou pra fazer o refrão e a gente já tinha falado dos bairros, Vitória, Lapinha, Caminho de Areia. E aí ele: ‘Bora falar do Chame-Chame’. Quando ele foi ‘Chame, chame’, eu emendei: Chame gente!”, contou, sinalizando que a música completou 35 anos e é apontada por diversos artistas como um hino do Carnaval e da Axé Music.“Eu acho que o que ele fez, o que ele realizou, vai ser uma coisa que vai ficar, independente da ausência física, e cabe à gente manter isso tudo vivo como a gente está fazendo aqui agora, manter isso tudo brilhante e passar para as gerações seguintes, de quem não conhece, não viveu, para manter ele pulsando aqui”, disse Larissa.Influências A cantora Larissa Luz, que também participou do programa ao vivo, contou que fez uma versão de Preta Pretinha e que teve a oportunidade de agradecer a Moraes pela contribuição dele para a música e para o Carnaval.

Para Larissa, uma das grandes memórias dos Carnavais de Moraes foi vê-lo cantando no trio próximo ao dela, e parar tudo para ouvir. Larissa Luz cantou Preta Pretinha e Acabou Chorare (Foto: Reprodução) Ricardo Chaves também homenageou o mestre e confessou: “Foi ouvindo Moraes Moreira que eu aprendi a gostar de Carnaval e que eu quis também ser um Carnaval em cada esquina. Eu arrisco dizer que, se não fosse Moraes, nada teria sido como foi”, disse, antes de agradecer a Moraes pela arte e de cantar um trechinho de Chão da Praça.

Bell Marques também deu uma palinha de sua música preferida, Carnaval em cada esquina.“Eu, quando vi Moraes cantando pela primeira vez, eu quis cantar igual a ele. Nunca consegui, mas continuei tentando”, brincou Bell.O cantor Edu Casanova também cantou Carnaval em cada esquina para falar de Moraes. O vídeo está no Instagram do CORREIO: "Moraes trouxe a influência do frevo de Olinda pro axé, pra música feita nos trios elétricos da Bahia. Moraes, pra mim, é meu mestre na composição, tendo grandes sucessos em todo o país. Eu sou fã, sou aluno de Moraes", disse.

Já Carlinhos Brown disse já ser familiar cantar as músicas de Moraes Moreira. “Mas, eu gostaria que as gerações futuras conhecessem a influência de Moraes na geração de agora”, contou. Ele afirmou que os dois filhos, Clara e Miguel, estão fazendo um musical sobre os Novos Baianos.

Respirava música Por falar em filho, Davi Moraes também participou do programa. Ele gravou um vídeo falando do pai e agradecendo a homenagem. “Falar do meu pai é falar de uma história de um grande ser humano, de um grande artista, que fazia amigos por onde passava e que levava com ele uma carga gigantesca de suingue, de diversidade musical. Veio a se tornar o primeiro cantor de trio elétrico, tantos feitos gigantescos. Fora isso, um grande pai, a quem devo uma eterna gratidão que estava sempre ali como parceiro, como mestre, como companheiro de estrada”, disse Davi. Davi Moraes falou sobre o pai e agradeceu por homenagem (Foto: Reprodução) Armandinho, que disse ter formado uma nova família com Moraes após a saída dele dos Novos Baianos, contou que Moraes estava sempre produzindo.“Ele era um cara que acordava a gente com o violão na mão, antes de escovar os dentes, tomar café. A gente era muita música”, recordou.Não por acaso, os Novos Baianos não queriam que ele deixasse o grupo, o que aconteceu em 1975. “A gente não queria que Moraes saísse porque ele era o timoneiro. A gente morava junto e tocava o dia inteiro, era tudo no dedo e no gogó. Quem gosta dos Novos Baianos, gosta do primeiro ao último disco, gosta do nosso estilo e vida, da nossa rebeldia na ditadura, da nossa revolução”, disse Paulinho Boca de Cantor.

Influência O programa contou com a participação de mais artistas: Márcio Victor deu uma palinha de Pombo Correio, sucesso de Moraes em música de Osmar Macedo de 1978, disse que conhecia e era amigo de Moraes e de Davi. “Não tem como ter Carnaval sem ter a presença nos nossos corações do Moraes moreira. É como ele diz, ‘Mancha de dendê não sai’, eu adoro essa música e tenho até vontade de tatuar”, afirmou. Márcio Victor contou que quer tatuar 'Mancha de dendê não sai' (Foto: Reprodução) Sarajane disse que falar de Moraes Moreira é falar de alegria e de poesia, e agradeceu. “Que você seja a nossa grande estrela no universo nos abençoando sempre!”. Margareth Menezes falou da importância de Moraes para a música brasileira, não só para o repertório de Carnaval.

“Moraes traz toda uma maneira de cantar, nos brindando com coisas fantásticas, as inovações melódicas. São coisas que deram uma renovação na música popular brasileira para sempre, é quase um novo estilo. Moraes significa essa chegada do novo. Ele foi uma ponta de lança de tudo isso”, declarou Margareth.

A última participação no programa foi da cantora e compositora Daniela Mercury. Depois de receber de Moraes e de Davi a música Monumento Vivo, canção inédita pedida por ela e gravada em O Canto da Cidade, Daniela fez um frevo em homenagem a Moraes. Quando o Carnaval chegar foi gravada e lançada este ano com Gal Costa.“Moraes Moreira é o Carnaval. Quando eu falo em Carnaval, só penso nele. Moraes me deu um presente que batiza esse gênero [axé] também: no álbum o Canto da Cidade, ele fez Monumento Vivo. E eu tinha que agradecer a ele compondo um frevo para ele. Convidei Gal para nós duas juntas cantarmos esse frevo para ele, que chama Quando o Carnaval chegar”, disse Daniela.Não viu? Acompanhe o programa na íntegra:

CORREIO produziu especial 'Os Carnavais de Moraes' Moraes Moreira foi o grande homenageado do especial de Carnaval do CORREIO em 2021, primeira vez na história moderna da folia soteropolitana em que a festa foi suspensa. Desde a última quarta-feira (10), uma série de reportagens especiais tem sido publicada pelo jornal, que também fez entrevistas ao vivo com artistas, podcasts e vídeos especiais. Na tarde desta terça (16) foi a vez do programa ‘Os Carnavais de Moraes’.

Todo o material já publicado, inclusive os vídeos e programa transmitidos ao vivo pelo E–Stúdio e ITS Brasil, podem ser acessados no site do jornal e nas redes sociais – Facebook, Instagram e YouTube. 

As entrevistas, feitas nos dias 10 e 15 de fevereiro, foram conduzidas pelo jornalista Osmar Marrom Martins com Daniela Mercury e com Alberto Pitta, do Cortejo Afro. Já o programa em homenagem a Moraes Moreira teve apresentação, além de Marrom, do jornalista Jorge Gauthier. Há, ainda, uma mixtapes de Mauro Telefunksoul, com músicas que seguem a cronologia do Carnaval baiano, que pode ser acessada por QR code, tanto no impresso quanto no digital.

A série de cinco podcasts, produzida por Vitor Villar, também está disponível no site do CORREIO e no Anchor, Spotify e Apple Podcasts. Quatro episódios já foram lançados: o primeiro é sobre como Moraes revolucionou o Carnaval baiano em seu primeiro ano na folia. Ousado que só, pegou o microfone 'meus amigos' e tornou-se o primeiro cantor do trio elétrico.

O segundo fala sobre como Moraes adaptou a levada do ijexá, ritmo típico dos afoxés, para a guitarra e para o trio elétrico. No terceiro episódio, falamos da criação do maior hino do Carnaval da Bahia: a música Chame Gente, lançada em 1985 e considerada pelo próprio Armandinho a sua melhor composição.

No quarto episódio, já no ar, falamos do exílio de Moraes no Carnaval do Recife, que teve seu momento mais crítico nos anos 2000. Irritado com os rumos da folia em Salvador, loteada pela indústria do Axé Music, o mestre ficou por sete anos se apresentando apenas em Pernambuco.

O Correio Folia é uma realização do jornal Correio com o apoio da Bohemia Puro Malte e da Drogaria São Paulo.  A transmissão é da ITS Brasil e E_Studio