Entidade faz desfile com crianças para adoção no MT e recebe críticas

Ação foi comparada a "feira de escravos" e acusada de ferir dignidade das crianças

Publicado em 22 de maio de 2019 às 18:13

- Atualizado há um ano

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Foto: Reprodução Uma entidade que ajuda com adoção de crianças de Cuiabá (MT) realizou um desfile com 20 crianças que esperam para ser adotadas e a ação recebeu muitas críticas. O desfile aconteceu na noite de terça-feira (21) e foi a segunda edição do projeto, trazendo crianças com idades de 4 a 17 anos.

O desfile é parte de uma semana de adoção que a Associação Matogrossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara) promove, com apoio da seção local da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Na primeira edição, há dois anos, dois adolescentes foram adotados depois do desfile.

A desembargadora Dora Martins, especializada em direito da infância, criticou em entrevista ao Buzzfeed News a ação. "É um absurdo completo. Você faz uma exposição da criança de forma objetificada: 'Precisamos melhorar o pacote'. Não é isso que estão dizendo ao colocá-la, toda arrumada, para desfilar? Esse desfile fere os direitos da criança. Não é só uma questão ética e moral. É também legal", garante.

"Não pode pegar as crianças e botar na vitrine como se estivessem à venda. Tem de estimular a adoção de forma protetiva, garantindo o segredo de Justiça. A criança no abrigo não é uma coitadinha, uma desgraçada. Ela é um sujeito de direitos", complementa.

Na internet, o evento foi criticado."Constrangedor ! Vexatório! Leilão de Crianças? Apesar das possíveis boas intenções, configura- se Crime previsto no Artigo 232 do ECA: “Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento", postou o advogado Ariel de Castro Alves.

"Olha, gente, sem querer ser chato, mas já sendo. Antes de tudo, devo dizer que a Ampara é uma instituição muito séria. Devo, entretanto, pedir mil desculpas a quem pensa diferente e à Ampara, mas as crianças na passarela para pretendentes ver o quão bonitas, simpáticas e desenvoltas são, parece-me uma antiga feira de escravos, onde os senhores viam os dentes e o corpo dos africanos para negociar o lance. Não acho legal, aliás, acho péssimo", escreveu Eduardo Mahon.

A Ampara informou que divulgaria um comunicado comentando as críticas. Já o Pantanal Shopping, que recebeu o desfile, divulgou uma nota afirmando ser contra a objetificação de crianças e destacando que o desfile teve apoio da OAB e do Ministério Público, entre outros (leia abaixo).

A presidente da Comissão de Infância e Juventude da OAB-MT, Tatiane Ramalho, publicou antes do evento um texto defendendo a realização do desfile. 

"A população em geral poderá ter mais informações sobre adoção e os menores em si terão um dia diferenciado, em que irão se produzir, fazer cabelo, maquiagem e usar roupa para o desfile", escreveu. 

“Esperamos novamente dar visibilidade a essas crianças e a esses adolescentes que estão aptos para adoção. E, como sempre dizemos, o que os olhos veem o coração sente. O convite é estendido a todos que se solidarizam com a causa de alguma forma, para que possam conhecer mais sobre a adoção”, diz o texto.

Leia a nota do Pantanal Shopping:

O Pantanal Shopping informa que repudia a objetificação de crianças e adolescentes e esclarece que o único intuito em receber a ação foi contribuir com a promoção e conscientização sobre adoção e os direitos da criança e adolescente com palestras e seminários conduzidos por órgãos competentes que possuem legitimidade no assunto. O shopping afirma que a ação foi promovida pela Associação Mato Grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara) em parceria com Comissão de Infância e Juventude (CIJ) da OAB-MT e reitera que o evento contou ainda com o apoio do Ministério Público do Estado do Mato Grosso, Poder Judiciário do Estado do MT, Governo Estadual do MT, Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania, Sindicato dos Oficiais de Justiça, Associação Nacional do Grupo de Apoio à Adoção e Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, além do Tribunal de Justiça do Mato Grosso.