Escolas fecham acordo para até 30% de desconto nas mensalidades

Termo de Ajustamento de Conduta foi firmado com 46 escolas particulares da capital; acordo também versa sobre cancelamento matrícula

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  • Da Redação

Publicado em 4 de junho de 2020 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

A pandemia do novo coronavírus suspendeu as aulas presenciais e impactou a renda de muitas famílias. Nesse contexto, o Ministério Público do Estado da Bahia, em conjunto com o Procon-BA e a Defensoria Pública do Estado da Bahia, firmou, na última terça-feira (2), um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com 46 escolas particulares de Salvador para a readequação dos contratos educacionais durante a pandemia. Com isso, os pais de estudantes destas instituições irão receber descontos na mensalidade até o retorno das atividades nas escolas.

Os descontos já começam a ser praticados no mês de junho e não são cumulativos com outros previamente concedidos aos alunos. O percentual mínimo de abatimento varia de acordo com o nível escolar. Para a educação infantil, que compreende a pré-escola (4 e 5 anos) e a creche (até 3 anos), a redução é de 30% do valor mensal pago, desde que a instituição esteja oferecendo aulas não presenciais com o envio do material didático aos alunos.

Já as escolas de ensino fundamental I darão um percentual mínimo de desconto de 25%. No ensino médio e ensino fundamental II, o desconto é de 20%. Apesar da pandemia, as instituições devem ofertar aulas não presenciais para os alunos.

De acordo com o Grupo de Valorização da Educação (GVE), coletivo que representa as escolas e intercedeu para fechar o acordo, o percentual varia de acordo com cada nível de ensino devido às diferenças no volume de aulas que é possível realizar à distância. “Ficou entendido que quanto maior a redução da carga horária, maior deve ser o desconto ofertado. O serviço remoto para a educação infantil não tem a mesma quantidade de aulas que em outros segmentos”, afirmou o representante do grupo, Wilson Abdon.

Em entrevista coletiva virtual concedida na quarta (3), a promotora de Justiça Thelma Leal explicou que o percentual de desconto foi fruto de um debate entre as escolas e os órgãos para que o valor pudesse caber no orçamento de todos os colégios. “Foi um consenso. Foram feitas propostas, as escolas se reuniram, estudaram as condições financeiras e chegaram nesse valor, que, para nós, é razoável de aceitação”, disse.

As escolas concordam que o acordo é benéfico no enfrentamento das dificuldades financeiras geradas pela pandemia, tanto para as instituições quanto para as famílias. “Ao meu ver, entramos em um estágio de civilidade. Todos os envolvidos e suas dificuldades foram reconhecidos. Quando as relações ficam normatizadas, todos se beneficiam. À escola, ficou possível garantir a prestação de serviço remota que já está acontecendo e conservar empregos tanto de professores quanto de funcionários. Aos estudantes, a manutenção, dentro do possível, do processo de ensino e aprendizagem”, pontuou Lurdinha Viana, que é professora e gestora do Colégio Oficina.

Mesmo com as aulas online, o ajustamento do contrato se fez necessário justamente pela mudança na oferta dos serviços educacionais durante a pandemia. Para a promotora, os custos das instituições de ensino também foram reduzidos com a suspensão das atividades presenciais, o que também pesa em prol das mudanças nos contratos.

“A pandemia é uma causa autorizativa de revisão contratual, que é direito do consumidor, tendo em vista que o serviço educacional, que envolvia uma série de obrigações para o fornecedor, deixou de ser prestado nas condições originalmente contratadas. Ainda que haja a continuidade das atividades pedagógicas de forma não presencial, o fechamento das instituições de ensino pode implicar a redução de custos operacionais a exemplo de água, luz, gás,limpeza, dentre outros”, destacou Thelma.

Em caso de necessidade, os pais podem continuar a fazer negociações com as escolas mesmo após a concessão do desconto. Devido a perda de renda das famílias, o termo prevê que cada caso específico seja analisado pelas instituições de ensino.“Da mesma forma que ouvimos as dificuldade das escolas, sensibilizamos que as instituições de ensino façam a mesma coisa para que haja um cuidado para com a parcela de alunos que não consegue honrar com a responsabilidade com a perda da renda”, explicou a defensora pública e coordenadora da Especializada Cível da Defensoria Pública do Estado da Bahia, Ariana Sousa.

Respaldo Cerca de 50% do orçamento da família de Andréa Machado foi comprometido com a pandemia do coronavírus. Com a situação, ela chegou a pensar em cancelar a matrícula do filho mais novo no Grupo 3 do Colégio Anchieta. A fisioterapeuta optou por manter a matrícula após a concessão de um desconto de 30% por parte da escola, em maio. “O desconto ajudou bastante. Agora, vamos segurar a matrícula porque, na sala do meu filho mais novo, umas cinco crianças saíram e isso impacta no funcionamento da escola”, contou.

Na Casa da Infância, as negociações estão em curso desde o começo da pandemia, segundo a gestora Marília Dourado. Ela ressalta que a escola sempre buscou entender a situação dos pais. “Nossa escola já vem tratando isso internamente com a comunidade, por isso, a assinatura do TAC é positiva no sentido de ter um documento com respaldo jurídico. Muitas escolas estão sofrendo com a pandemia. O grupo trabalhou muito duro para criar um documento capaz de ser um grande guarda chuva para sustentar todas as realidades”, afirmou.

Apesar dos descontos, pais de alunos da Casa da Infância que não tiveram cortes nos rendimentos mantiveram o pagamento integral da mensalidade para auxiliar no equilíbrio do orçamento da instituição após as negociações dos abatimentos. “Estamos abrindo mão do desconto ofertado pela escola para contribuir para um fundo de bolsas e apoiar outras famílias que não estão conseguindo pagar a mensalidade. Assim, evitamos demissões de educadores da escola”, contou a professora universitária Alessandra Reis, 40 anos, que tem duas filhas matriculadas no ensino fundamental.

Cancelamento Os pais que cancelarem as matrículas devido à pandemia também estão protegidos pelo termo. Em caso de cancelamento, há a dispensa da multa contratual. No recomeço das aulas, os pais podem reinserir seu filho na instituição de ensino e fazer o pagamento dos meses com o desconto concedido pela escola no período.

De acordo com o representante do grupo das escolas, os estudantes têm a vaga garantida nas instituições no recomeço das aulas. “Os meses que não foram pagos será refeito o novo contrato, com um cálculo de uma nova mensalidade acrescida o valor que ficou em aberto”, explicou Abdon. Aqueles pais que já pagaram o ano ou um semestre de forma integral serão reembolsados no ato do pagamento do ano letivo de 2021, garantiu Abdon. O valor que foi abatido com os descontos oferecidos em 2020 ficará como crédito para o próximo ano.

A adesão das aulas online impossibilitou a realização de algumas atividades extraclasse oferecidas pelos colégios. Nesses casos, os valores cobrados após 1º de abril por aulas que não ocorreram devem ser devolvidos de forma retroativa para os pais com abatimento nas futuras prestações mensais. Segundo o GVE, as escolas já tinham sido orientadas a suspender as cobranças as atividades complementares, como refeição e transporte. Muitos colégios acataram à indicação, afirmou Abdon, portanto, apenas uma pequena parcela deverá restituir estes valores.

Quem tem filho de até 3 anos matriculado nas creches de Salvador que assinaram ao termo também pode cancelar a matrícula durante a suspensão das aulas. “O termo permite a suspensão deste contrato sem multa porque não há como fazer a reposição ou dar aulas virtuais nas creches. Isso era uma queixa muito grande dos pais pois eles não queriam perder o vínculo com a escola ao cancelar o contrato, mas também não desejavam pagar por um serviço que não estava sendo prestado”, explicou a promotora.

Para tratar das questões de ajuste de contrato ou das aulas online durante a pandemia, as escolas também devem criar e divulgar um canal específico de comunicação em um prazo de cinco dias.

O grupo das escolas avalia que o termo demonstra a transparência e a preocupação das escolas particulares com o ensino durante o período de isolamento social. “Queremos mostrar para as famílias a transparência que as escolas têm na relação de consumo. E que esta relação não é só de consumo, mas também existe uma preocupação com educação e a realização de um trabalho diferenciado. As escolas estão abertas para conversas e pedem que os pais confiem no trabalho realizado neste período”, pontuou o representante do grupo.

Multa Em caso de desrespeito do TAC, as instituições poderão receber multa diária de R$ 600. Para aquelas que possuem regime tributário simples, a pena é de R$ 300 por dia. O acordo é uma forma de evitar a judicialização das queixas sobre o funcionamento das escolas na pandemia. Entretanto, os órgãos podem levar a questão à justiça caso uma instituição se recuse em adequar o contrato.

No caso do Procon, por exemplo, 42 escolas haviam sido denunciadas pela atuação durante a pandemia. As que não entrarem em acordo com o órgão podem enfrentar um processo administrativo.

“As escolas que não assinaram o TAC ou não vieram a formalizar novos TACs mesmo que no mesmo termos podem preferir enfrentar os processos administrativos no Procon ou um processo judicial. No âmbito do Procon, parte das 42 escolas assinaram o TAC. As que não são signatárias seguirão com o processo podendo se defender ou formalizar um acordo. Se a defesa da escola não for aceita, essa escola pode vir a ser multada entre R$ 600 e R$ 6 milhões no processo do Procon. É mais vantajosos negociar do que partir para um enfrentamento, por isso, propusemos o espírito de conciliar”, afirmou o superintendente de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon-BA), Filipe Vieira.

Algumas instituições que não aderiram ao TAC ainda negociam acordos com os órgãos e podem a vir firmar novos termos de ajustamento de conduta. Segundo o representante do grupo das escolas, parte das instituições não signatárias também vão oferecer os descontos firmados no acordo. “Outras escolas, em especial as de bairro e de educação infantil, estão em diálogo para fazer acordos individuais por terem uma situação mais complicada”, disse Abdon.

Pais do Módulo reclamam Enquanto diversas escolas fornecem desconto nas mensalidades, os pais com alunos em instituições que não oferece redução para todos reclamam. É o caso do colégio Módulo da Pituba (não o Criarte), que só dá algum abatimento caso os responsáveis comprovem que houve redução de renda na família.

"É absurdo ter que ir lá com imposto de renda ou boleto do cartão de crédito para comprovar a redução. Todos nós sentimos no bolso essa crise, se não com redução de salário, com aumento de despesas como alimentação e conta de luz. E o Módulo tem uma comunicação péssima que não consegue ouvir o lado dos pais", disse uma mãe que não quis se identificar.

Lista das escolas assinaram o TAC:

Colégio Módulo Criarte Colégio Oficina Escola Kurumi Centro Educacional Villa-Lobos Escola Casa da Infância Escola Mini Mundo Escola Arco Íris Escola Ponto de Partida Escola Gênesis Costa Azul  Escola Pirlilim Escola Pantheon Escola Lápis de Cor Escola Natureza Ltda. Colégio Vitória-Régia Colégio Anchieta  Colégio Anchieta (Anchietinha - Aquarius) Colégio São Paulo  Pindorama Vila Mirim Tempo de Crescer Escola Experimental Colégio Integral Recanto de Viver Escola Cresça e Apareça Escola Sulamericana  Colégio Flamboyants Escola Kimimo Escola Gênesis-Stella Colégio Ômega Colégio Logo Escola Colmeia CEMJ Escola Girassol Colégio Portinari           Escola Tempo de Criança Colégio Ana Tereza e Ludic Escola Pernalonga (Mater Sapiens) Nossa Infância Centro Educacional WALLON Brincando e Construindo Gira Girou Sartre Gurilândia Educandário Nossa Senhora D'Ajuda Dorilândia Colégio Vilas Colégio Nossa Senhora Do Resgate

*Com orientação da subeditora Clarissa Pacheco