Está preocupado com o futuro? Especialista diz que é preciso focar no agora

'O futuro já está aqui, só não está bem distribuído', diz Conrado Schlochauer

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  • Perla Ribeiro

Publicado em 12 de novembro de 2018 às 06:20

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO

Quase todo mundo quer saber como estará a vida daqui a cinco, dez anos ou as transformações que as tecnologias vão implementar no mercado de trabalho. Na contramão dessa tendência, o embaixador da Singularity University Capítulo São Paulo e um dos fundadores da Affero Lab, maior empresa de Aprendizagem Corporativa do Brasil, Conrado Schlochauer, se define como “presentista”. Para ele, o futuro é o aqui e agora e é preciso saber enxergar e aproveitar as oportunidades.

“Há pessoas que fazem o mundo pra frente. Tem sempre alguém olhando pra frente. Tem uma frase de um livro que diz: o futuro já está aqui, só não está bem distribuído. O conhecimento de tecnologia está mal disseminado”. Como exemplo, Schlochauer diz que, no Brasil, muitas vezes as pessoas vão buscar e desenvolver soluções nas empresas para coisas que, se pesquisarem na internet, elas já estão lá. 

Então, a dica é aproveitar o conhecimento que já existe e saber o que fazer com ele. “A gente está vivendo uma hype de futuro, de tecnologia, mas vai passar. Você começa a ler muito blog dessa área e depois de seis meses começa a achar desinteressante porque não tem tanta novidade assim”.

Mas, diante de tanta novidade, com tanta coisa vindo num ritmo tão veloz, faz o quê? Ele mesmo tem a resposta. “A gente não tem que dar um passo à frente, é dar o passo do agora. Meu olhar é para o aprendizado e é também para não ficar distante. Tem gente que diz: tecnologia não é para mim. É para você, sim. Tem que usá-la para repensar a lógica das coisas que você está fazendo”, ensina.

Para demonstrar isso na prática, Conrado cita o Airbnb, plataforma que oferece hospedagens no mundo inteiro, reúne 2,9 milhões de anfitriões e uma média de 800 mil estadias por noite. Ele diz que enquanto um grupo de executivos de uma grande rede hoteleira  internacional discute quantos fios deve ter o lençol novo dos quartos, chega um estagiário e diz que, em São Francisco, nos Estados Unidos, tem três caras alugando quarto com colchão de água e que esse negócio vai pegar. “O não olhar de oportunidade é um risco que a gente tem”.

Não ficou claro ainda? Vamos para mais uma tentativa.  Lembra do tempo que usávamos máquinas fotográficas com filme e depois precisávamos revelá-lo para ter acesso às imagens? Com as câmeras digitais, isso ficou no passado. Hoje, com um bom celular nas mãos, você nem precisa da câmera. Ou seja, a tecnologia avançou, a forma de fotografar também. Quem não acompanhou essa revolução, ficou perdido no tempo. “Quem quebrou a Kodak? Ela mesma e o celular. Antes a gente tirava foto, botava naquele álbum amarelo e saía com ele para mostrar as fotos. Como a gente faz isso hoje? No Instagram, que tem um alcance ainda maior” (Conrado Schlochauer)O tempo inteiro se fala em digital, tecnológico, online... Embora a palavra tecnologia só tenha entrado de vez no nosso vocabulário nos últimos anos, Conrado ressalta que ela sempre esteve presente nas nossas vidas e cita exemplos simples, como uma luz acesa, o som de um carro.

“Estamos com fetiche só com as novas tecnologias. Tecnologia é o que ela sempre foi, um meio para se fazer alguma coisa. Não existe um ente chamado tecnologia. São pessoas que fazem, disseminam e usam a tecnologia. Quando falamos em humanizar é de voltar a lembrar de quem a gente é. Tem que colocar a tecnologia no lugar dela”.

Por isso, é preciso ir além. Mais do que esperar como o futuro vai impactar nas nossas vidas, ele propõe que a gente perceba como já está impactando. Ele diz que, em São Paulo, foi inaugurado um serviço para melhorar a mobilidade. Trata-se de uma bicicleta, a Yellow, que a pessoa precisa do Bluetooth do celular para destravá-la, paga R$ 1 por 15 minutos e depois devolve. “Isso é ser digital também. É usar uma ferramenta que é o celular para entrar por rede móvel num servidor e o Bluetooth para liberar a bicicleta”. 

O PhD em aprendizagem pontua ainda que a gente não tem um modelo novo para esse mundo que é exponencial e global e que estamos tendo dificuldades de adaptação. Ele cita um trecho do livro Obrigado pelo Atraso, que diz que a tecnologia está tendo uma taxa de mudança maior do que a nossa capacidade de se adaptar. “Isso é que é exponencial. Quando a mudança vem, a gente não percebe o que está vindo e, pior, despreza. É isso que vocês podem estar fazendo com a empresa e a carreira de vocês.  Há uma dificuldade de ter um olhar exponencial, de entender essa curva. Quando a mudança vem, é numa velocidade incontrolável”. Schlochauer explica que hoje a gente tem a 'Santíssima Trindade' da modernidade nos negócios, que é digital, exponencial e disruptiva. “Tudo é um dos três, não é? Primeiro, digital não é ser tecnológico. É um jeito de pensar, de atuar no mundo”. No entanto, ele defende que a máquina e a inteligência humana têm que caminhar lado a lado e que o importante é a inteligência aumentada (que combina humanos e máquinas) e não a artificial. 

“Gosto muito de dizer que a Inteligência Artificial hoje em dia é o novo tomate seco. Tudo tem Inteligência Artificial. Óbvio que a gente tem que usar, mas não vai resolver o problema do mundo agora. Gosto muito da metáfora do centauro (figura mítica metade humana e metade cavalo), quando une força e velocidade da máquina, que é a tecnologia, com a alma e o coração humanos”.  

E ele cita também um projeto que pede para as pessoas imprimirem protótipos na internet em 3D para ajudar crianças. Na avaliação de Conrado Schlochauer, isso é pensar digital. 

“Você usa rede, tecnologia, mas usa basicamente a vontade humana e a capacidade humana. Ser digital é isso. É o homo sapiens fazendo o que ele sempre fez, usando as ferramentas para resolver problemas de uma maneira diferente”.

Troque educação por aprendizagem

Em um país marcado por desigualdades, Conrado Schlochauer defende que as tecnologias podem ter um papel efetivo para tentar reduzir essa realidade. E, de acordo com ele, um primeiro passo para colocar isso em prática é trocando a educação pela aprendizagem. 

De acordo com ele, o grande ator no processo de educação é o educador. Já o ator no processo de aprendizagem é o aprendiz. “Então, a tecnologia pode ser usada até para uma coisa bem bacana, porque ela é referência de competência, e isso independe de a pessoa ter feito um curso. Imagine uma pessoa que costura há 38 anos, mas não tem um diploma. Ela não é reconhecida como costureira porque não fez um curso”, explica.

Ele acrescenta ainda que a gente tem tecnologias cada vez melhores, mais baratas e mais eficientes e que é preciso nos apropriarmos delas. Na avaliação do especialista  é preciso empoderar as crianças, jovens e adultos para o processo de conduzir o seu aprendizado, levando sempre em consideração que esse é um processo contínuo e que deve ser trilhado ao longo de toda uma vida. “É preciso que as crianças, jovens e adultos sejam donos desse caminho que acontece a vida inteira”, destaca.

Ainda na defesa de que essa busca pelo aprendizado não deve parar nunca, ele chama a atenção para a necessidade de definir isso como uma prioridade na vida de cada um, estabelecendo  um tempo na agenda para aprender coisas novas.

“Muitos de vocês aqui devem fazem academia, ou jogam futebol, ou caminham. Vocês fazem isso com frequência. Se contar o tempo de transporte com a atividade, vocês fazem isso umas oito horas por semana. Agora, quanto tempo vocês têm na agenda destinado para aprender, para ler, para aprender uma coisa nova? É preciso estabelecer isso”.

O Fórum Agenda Bahia 2018 é uma realização do jornal CORREIO, com patrocínio da Braskem, Sotero Ambiental e Oi, apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador, Consulado-Geral dos EUA no Rio de Janeiro, Federação das Indústrias da Bahia (Fieb) e Rede Bahia; e apoio do Sebrae e da VINCI Airports.

Dicas para abrir a mente:Leia - O primeiro passo é buscar conteúdo. Tem que ler. “Por isso eu falo muito de áudio-livro, a gente tem um preconceito no Brasil, mas ele funciona  no ônibus, no metrô, no carro...” 

Experiências - O segundo passo é ter experiências. “Vai fazer coisa, vai sentir cheiros. Fui na Campus Party, que é esse evento grande. Basta andar meia hora para ver a mudança acontecendo”. 

Redes -  Use suas redes de relações. Se aproxime de uma rede que vai te colocar em contato com novos conteúdos, que possa te proporcionar novas experiências e te colocar em contato com novas pessoas.