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Da Redação
Publicado em 18 de maio de 2022 às 05:15
Falta desde dipirona injetável para aplicar em pacientes com dores e ocitocina para indução de partos até medicamentos essenciais nos tratamentos mais graves contra o câncer, leucemia, esquizofrenia e HIV. É essa a situação atual do sistema público de saúde baiano, que sofre com a falta total ou risco de desabastecimento de 35 medicamentos dos cerca de 120 que são fornecidos pelo Ministério da Saúde (MS). A informação é da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab). Dos 35, 18 estão com estoque zerado e 17 quase no fim.>
O desabastecimento atual é influenciado pela guerra entre a Rússia e a Ucrânia. O conflito joga o valor do dólar para cima e reduz a capacidade de entrega dos medicamentos por parte dos fornecedores. No entanto, o superintendente de Assistência Farmacêutica, Ciência e Tecnologia da Sesab, Luiz Henrique Gonzales d’Utra, afirma que os atrasos nas entregas do MS são comuns há pelo menos três anos e meio. "Todo mês tem 10, 15 ou 20 medicamentos em falta", afirma. >
O MS respondeu sobre o desabastecimento por meio de nota, mas sem citar o que tem provocado os atrasos nas entregas para a Bahia. "O Ministério da Saúde trabalha sem medir esforços, juntamente com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), para verificar as causas e articular ações emergenciais para mitigar o desabastecimento dos medicamentos citados", afirma trecho da nota da pasta federal.>
O desabastecimento não atinge apenas os estoques da Sesab e dos hospitais. Nas farmácias, desde que a guerra começou, o desabastecimento começou a ser notado e, no fim de abril, chegou ao ápice. É isso que conta Débora Almeida, farmacêutica de uma rede privada de farmácias em Salvador. >
"Desde o fim de abril percebo isso [a falta de medicimentos] de maneira mais intensa, principalmente dipirona, amoxicilina e azitromicina. São medicamentos com saída diária, que não conseguimos lidar com a demanda atualmente", conta a farmacêutica, que cita a guerra e os surtos gripais como razões do problema. Para a farmacêutica Ivonete dos Santos, os problemas internacionais fizeram o desabastecimento chegar a um nível nunca antes visto por ela. "Nunca vi acontecer anteriormente. A falta dos antibióticos não se restringe somente a crianças, alguns medicamentos também se encontram em falta para adultos. Acredito que isso acontece de fato por falta de matéria-prima dos grandes laboratórios", opina.>
Alta demanda Pediatra imunologista, Celso Sant'Ana também cita a alta demanda por conta dos casos gripais e a guerra na Europa para justificar o desabastecimento: "A razão é a desorganização do fluxo do comércio internacional devido à paralisação das cadeias produtivas dessas medicações, que se iniciou devido a pandemia e se agravou com a invasão da Ucrânia pela Rússia. Aliada a isso, também está a política de covid zero na China e Índia, que são países produtores dos insumos para essas medicações", explica Sant'Ana. Pacientes relataram a falta de amoxicilina, clavulanato, azitromicina, anti alérgicos e dipirona.>
Luiz d'Ultra destaca ainda a importação dos insumos como um dos principais problemas. "Com a guerra, o aumento do dólar e outras questões, alguns medicamentos estão em falta no mercado. Dos insumos farmacêuticos, 99% são importados, em geral, da China e da Índia. Por conta do aumento do dólar, dificulta o planejamento da indústria e a aquisição. Por isso, fornecedores pedem para sair dos contratos que têm, alegando falta de produto", acrescenta o superintendente, pontuando que a falta no mercado não se traduz em falta nos hospitais da Bahia, ao menos por enquanto. Impacto na saúde pública>
Os 18 medicamentos zerados na rede pública são usados em tratamentos de glaucoma, distúrbio metabólico, Parkinson, Alzheimer, epilepsia, esquizofrenia, paraplegia, acromegalia, artrite reumatóide, esclerose múltipla, anemia falciforme e câncer. Já os 17 remédios com baixa no estoque tratam esquizofrenia, fibrose cística, Alzheimer, diabetes, acromegalia, epilepsia, pacientes imunossuprimidos e câncer. O estoque dos 35 medicamentos atende 16.799 baianos com as doenças citadas e custa mais de R$ 6 milhões.>
Para o superintendente da Sesab, todos são essenciais para o atendimento no sistema público. No entanto, os medicamentos de alto custo causam mais preocupação, já que sua ausência pode representar risco de vida para quem depende das substâncias. "Como a família evita surtos de um paciente com esquizofrenia sem uso de medicamento? É lastimável. No caso da leucemia, se o paciente está em tratamento e isso é interrompido, ele agrava a doença. É menos prejudicial não começar do que interromper o tratamento. Um prejuízo à vida que é inestimável", afirma d'Ultra.>
Sobre o motivo de o estado não repor com financiamento próprio os medicamentos em falta, Luiz d'Ultra afirma que não há viabilidade econômica. "São R$ 6 milhões em remédios nesta lista. Se toda vez que o Ministério da Saúde não fornecer, a gente bancar isso, não vai ter recurso que aguente. A obrigação é deles de fornecer. Compramos alguns por entender o sofrimento da população e a disponibilidade do mercado, mas nem sempre tem disponibilidade", completa.>
Em Salvador A Secretaria Municipal de Saúde de Salvador (SMS) respondeu por nota sobre a disponibilidade dos medicamentos de atenção básica na capital: "Dos nove medicamentos com suposto desabastecimento, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece quatro na capital: Amicacina Injetável; Amoxilcilina 250MG; Dipirona Injetável e Gentamicina Injetável; todos esses estão com o estoque completo. Os demais não fazem parte do elenco de medicamentos distribuídos pela pasta", diz o texto. >
Veja os medicamentos em falta e quais estão no fim na Bahia: (Foto: Reprodução/Sesab) *Colaborou Esther Morais**>
**Com a orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro>