Ferryboat Agenor Gordilho será afundado para virar atração turística

Naufrágio controlado está previsto para o segundo trimestre deste ano

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  • Gabriel Amorim

Publicado em 9 de março de 2019 às 08:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto de Antonio Saturnino/Arquivo CORREIO

Foram 45 anos servindo à travessia Salvador-Itaparica e levando em cada viagem até 600 passageiros e 90 veículos. Depois de anos de serviço e parado desde o final de 2017, o ferry-boat Agenor Gordilho vai ganhar uma nova função. Está previsto para o segundo trimestre deste ano o naufrágio controlado da embarcação, que passará a servir de atração para o turismo de mergulho. 

Segundo informações da Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia (Agerba), responsável pela fiscalização do serviço, a vida útil de embarcações como a Agenor Gordilho gira em torno de 30 anos. Portanto, diante da idade do barco e do custo benefício de uma recuperação, a reforma não era indicada. Desta forma, o Governo do Estado decidiu atribuir função turística ao ferry, que havia passado por uma reforma de cerca de R$ 5 milhões em 2013.

Meio ambiente

A nova atração deve naufragar na própria Baía de Todos-os-Santos até o meio deste ano, mas os estudos para a realização do afundamento já estão acontecendo desde setembro de 2018. Hoje, o Estado aguarda licença ambiental do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema). 

O ferry, que se encontra no terminal marítimo de Bom Despacho, em Itaparica, está em fase final de preparação para o procedimento. Isso inclui a retirada de peças que possam representar riscos aos mergulhadores, bem como de todo material potencialmente tóxico, evitando a contaminação do meio ambiente. Antes do afundamento, a embarcação será vistoriada. Equipes da Marinha e de órgãos ambientais também realizarão inspeções, segundo informações da Secretaria de Turismo do Estado da Bahia (Setur).

Para a professora do Instituto de Química da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Tânia Tavares, toda preocupação com a preparação do barco para o naufrágio deve visar a proteção do meio ambiente.“A embarcação precisa estar livre de combustível, com os tanques limpos, por exemplo. Não pode haver esse tipo de material e é preciso estudar o local para que tenha profundidade suficiente”, Tânia Tavares, professora da UFBA.  Segundo a professora, se estes cuidados forem tomados, o naufrágio controlado não é prejudicial ao meio ambiente, desde que ocorra de maneira pontual. O que não pode acontecer é o afundamento de diversas embarcações numa mesma região “Se forem muitas, o equilíbrio ambiental pode ser quebrado, possivelmente diminuir a biodiversidade, afetar as cadeias alimentares. Não há como prever exatamente”, esclarece. Ferry foi reformado em 2013, ao custo de R$ 5 milhões (Foto: Evandro Veiga/ARQUIVO CORREIO) Investimento

Para realizar todo o processo do naufrágio, a Setur contratou uma empresa do Espírito Santo, especializada nesse tipo de serviço. O contrato, no valor de R$ 410 mil, prevê que a empresa atue na realização de estudos prévios de localização e de impactos ambientais do naufrágio, no processo de afundamento e no posterior monitoramento ambiental e obtenção de liberação para o turismo de mergulho. Com o valor investido, o Governo do Estado pode naufragar até três embarcações.

O investimento do estado no setor de turismo náutico e de mergulho, segundo a Setur, visa manter a Bahia alinhada com um dos principais focos do Programa Nacional de Desenvolvimento do Turismo (Prodetur). A ideia é oferecer infraestrutura, como marinas e bases náuticas, na Baia de Todos-os-Santos.

“O trabalho vai proporcionar maior visibilidade para a Baía de Todos-os-Santos, intensificando o turismo náutico e o turismo de mergulho, atrativos com potencial para atrair visitantes de todo o mundo, com alto poder aquisitivo para movimentar a economia na zona turística”, explica o subsecretário estadual do Turismo, Benedito Braga.

Turismo

Para conhecer a história de Salvador através de navios naufragados não é preciso nem mesmo ter experiência prévia em mergulho. Os curiosos que desejam experimentar a aventura de mergulhar em navios afundados, mas nunca praticaram a modalidade tem quatro opções diferentes. E não é preciso nem ir muito longe, na região entre as praias do Porto e do Farol da Barra já é possível encontrar naufrágios visitáveis. É o caso do navio Reliance, que naufragou no século XIX e se encontra próximo ao Cristo, na Barra.

Segundo explica a mergulhadora Fernanda Fernandes, da escola e operadora de mergulho Galeão Sacramento, aqueles que não tem qualquer experiência de mergulho podem realizar o chamado ‘batismo’. O primeiro passeio submerso de um turista curioso pode ir até dez metros de profundidade. No caso da embarcação no Cristo, é possível chegar até nove. 

Para mergulhos mais profundos, é preciso experiência prévia comprovada através de curso. O curso certifica até que profundidade aquele mergulhador pode chegar. Os mergulhadores mais experientes têm, segundo a escola, mais cinco opções de embarcação para conhecer. Investir em um mergulho embarcado, para conhecer um barco naufragado custa R$ 350 na escola de mergulho, valor que cobre o passeio em dois locais diferentes. 

Para Fernanda, as expectativas são as melhores com a nova atração a ser adicionada à lista de sítios de mergulho. “Nós tínhamos um naufrágio muito famoso e muito visitado, mas ele foi engolido por um banco de areia e não é possível ver mais nada. Esperamos que essa nova embarcação volte a trazer turistas para mergulhar em Salvador”, disse.  

Conheça naufrágios onde mergulhar na baía de Todos-os-Santos:Reliance  - O navio a vapor, construído em ferro em 1883, ía do Rio de Janeiro para Nova York, transportando mais de 5,5 toneladas de café; além de passageiros, que viajavam para Pernambuco, e tripulantes. A embarcação, que faria escala no porto de Salvador, naufragou na baía de Todos os Santos, na chamada Ponta das Quintas (entre o Farol da Barra e São Lourenço, atualmente Morro do Cristo), após uma tempestade. Os passageiros se salvaram e a tripulação conseguiu recuperar apenas metade da carga.

Santíssimo Sacramento  - O galeão português afundou em 1668 após colidir com a crista do Banco de Santo Antônio, na região do Farol da Barra. Dos quase 500 passageiros à bordo, salvaram-se apenas 70. Um dos mortos foi o general Francisco Corrêa da Silva, que assumiria o Governo-Geral do Brasil. O Farol da Barra foi erguido após o trágico acidente do Santíssimo Sacramento, para sinalizar a outros navios dos perigos submersos nas águas da baía

Santa Escolástica  - A fragata naufragou em 1700. Foi construída no arsenal da Marinha da Bahia, tendo afundado em sua viagem inaugural, quando se dirigia ao Quênia, para levar combatentes contra o bloqueio árabe à colônia portuguesa de Mombassa. Mais uma vez, a ruína da embarcação foi o temido Banco de Santo Antônio, na saída da baía.

East Indiaman Queen  - O navio da Companhia das Índias Orientais foi a pique em 1800, após um incêndio acidental, enquanto estava ancorado no porto de Salvador. No acidente, morreram 30 soldados, seis passageiros e 70 marinheiros.

Maraldi  - O naufrágio ocorreu em 1875, quando o navio seguia viagem para Buenos Aires, na Argentina, com uma carga de couro e lã que teria destino final em Antuérpia (Bélgica). Ao entrar no porto de Salvador para abastecer-se de carvão, água e comida, o navio foi arrastado por uma forte correnteza e se chocou contra os recifes da região do Forte de Santa Maria

Cavo Artemidi  - O cargueiro de bandeira grega afundou em  1980, quando saia do porto de Salvador, onde havia parado para reabastecer-se de combustível. A embarcação  se dirigia para Brighton, na Inglaterra, levando 16,8 mil toneladas de ferro-gusa, do Espírito Santo para a Europa. Na saída do porto, o navio primeiro  bateu no Banco da Panela e ficou encalhado. Depois foi arrastado e bateu no Banco de Santo Antônio.  *Com orientação do chefe de reportagem Jorge Gauthier