Flavia Azevedo: Quem tem medo de travesti?

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  • Flavia Azevedo

Publicado em 8 de julho de 2017 às 15:33

- Atualizado há um ano

A moça disse, numa mesa cheia de gente, que não concorda que travestis (e/ou mulheres trans) utilizem os banheiros públicos femininos. Ela tem medo de ser estuprada. Uma viagem tão recheada de absurdos que eu nem sei por onde começar minha contestação. Foi inevitável pensar que ela reprime um desejo por mulheres trans. No entanto, preferi segurar meu cérebro Rodriguiano e só pedi à moça que me contasse um único caso em que uma mulher trans estuprou qualquer outra mulher. Em contraposição, que pensássemos juntas nos inúmeros casos de mulheres trans agredidas por homens. Se ela, a moça, fosse uma mulher trans apertada pra fazer xixi, em que banheiro público escolheria entrar? O que acharia mais seguro e natural? A moça preferiu não responder, mas, pela cara que fez, acho que passou pela cabeça dela que mulheres trans deveriam andar com fraldas geriátricas. Ou mesmo não sair de casa. Ou que todas deixassem de existir. Sim, ainda estamos nesse nível.Vamos supor que essa moda pegue. Que mulheres trans passem a ser, oficialmente, obrigadas a utilizar banheiros masculinos. Como seria o controle disso? Não faço idéia, mas não queria ser a coitada que trabalharia como "fiscal de gênero" nas portas dos banheiros. Os métodos de adequação de gênero avançaram, felizmente. E eu não garanto, de jeito nenhum, adivinhar se uma mulher (ou um homem) é cis ou trans, atualmente. Mesmo as mulheres trans que não quiseram (ou ainda não puderam) transformar seus órgãos sexuais masculinos em femininos, conseguem ficar extremamente femininas até em minúsculos biquínis. Quando querem e acham que devem, claro. Uma técnica maravilhosa que me faz pensar, mais uma vez: como seria esse controle nas portas dos banheiros, gente? E os humanos de outros gêneros? Vão fazer xixi onde? Até agora, só falamos de três, mas há muitos e tantos outros. As pessoas não deixam de existir porque essa moça só reconhece como legítimos os homens e mulheres cis. Talvez a solução para o problema da moça seja, ela mesma, andar de fraldinha. Pelo menos enquanto todos os banheiros do mundo não passarem a ser individuais e liberados para todas as gentes, como é o certo. Como deviam ser. Enquanto isso, eu, mulher cis, quero dizer que reconheço inúmeras diferenças entre mulheres e que, nenhuma delas, me faz pensar em excluir a coleguinha do universo feminino. Nem do banheiro feminino. Porque eu não estou autorizada a definir o gênero de qualquer pessoa além de mim mesma. Nem quero. Adoro estar viva para aprender que a existência de um pênis (ou de um corpo que já foi masculino) pode ser percebida apenas como uma das diferenças entre mulheres. E que isso é lindo e enriquecedor. E que o mundo anda pra frente, sim. Por mais que moças bobinhas insistam em atrapalhar a viagem.Flavia Azevedo é produtora e mãe de Leo

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