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Gabriel Amorim
Publicado em 13 de março de 2019 às 06:00
- Atualizado há 2 anos
Idosa foi atacada pelas abelhas em casa, no Barbalho; insetos invadiram cinco imóveis na Rua Ibirapuera (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) De janelas e portas fechadas, com medo. É assim que estão vivendo os moradores do Loteamento Lanat, no Barbalho, em Salvador. Na última sexta-feira, por volta das 15h, os moradores da região foram vítimas de um ataque de abelhas. Picada por centenas delas no quintal de casa, a aposentada Igna Santos, 74 anos, conhecida como Ninha, não resistiu.>
Dona Igna, que é irmã de Ubirajara Tavares Gomes, conhecido como Bira do Jegue, morreu no último domingo, no Hospital Ernesto Simões Filho, no Pau Miúdo, onde estava internada. A Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) foi procurada, mas não informou a causa da morte da aposentada. O Samu, que a socorreu, não forneceu mais informações sobre o atendimento. O CORREIO não conseguiu confirmar a causa da morte, mas teve acesso a imagens que mostram a idosa com picadas na região do rosto, cabeça, braços e pernas. >
O problema com as abelhas não é novidade para os moradores da região. No mesmo dia em que dona Igna foi atacada, as abelhas invadiram cinco casas na Rua Ibirapuera, no Barbalho, e outros moradores foram ferroados.>
Obras Os ataques começaram, segundo os moradores, depois que trabalhadores de uma obra na região atingiram uma colmeia. A obra é do Atacadão Atakarejo, que está sendo erguido no local.>
Procurada, o Atakarejo informou, por meio de nota, que “estava ciente de que a região tinha uma grande incidência de abelhas”, mas que “o fato ocorrido não tem nenhuma interferência direta com a empresa”. “O Atakarejo lamenta bastante o incidente e ressalta ainda que este não aconteceu dentro do local onde está sendo realizada a obra”, diz a nota. Na região há uma obra do Atakarejo; vizinhos dizem que trabalhadores atingiram colmeia; empreendimento nega (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) Antes do ataque fatal a dona Igna, uma pessoa foi picada há cerca de um mês. “Estava no quarto e senti a picada de uma abelha. Quando fui fechar a janela, vi várias delas vindo em direção à casa”, contou o estudante que se identificou como Alexandre, 18. Ele e a irmã, Ana Gabriela, 20, contaram que, naquela ocasião, informaram o caso à empresa responsável pela obra.>
“Ela morreu por negligência. Eles sabiam”, disse Ana Gabriela. “Eu nunca vi uma coisa daquela, era coisa de filme, os médicos disseram que deviam ser umas 500 picadas”, completou.>
A jovem estava chegando em casa no momento do ataque e foi impedida de se aproximar da casa de dona Igna, ao ser alertada por outros moradores. “Não me deixaram descer. Quando a vi, ela já estava entrando na ambulância, completamente inchada”, relatou. Ana Gabriela é vizinha de dona Igna: "Quando a vi, já estava na ambulância", disse (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) Mais picadas Moradora da mesma rua, a aposentada Tereza Ferreira, 86, foi picada na região dos olhos, queixo e orelhas. “Foi uma correria, todo mundo fechando as casas, tentando se proteger. Não tinha como ajudá-la”, explicou.>
Um dos moradores que ainda tentaram ajudar a socorrer Igna, o vidraceiro Rosemberg Nascimento, 58, contou que se assustou com a quantidade dos insetos. “Me cobri com um lençol e fui fechar o fundo da casa, quando a vi. Pensei em sair, mas não tinha como entrar no meio das abelhas. Foi quando joguei um lençol para ela e fiquei dizendo para ela abrir o chuveiro do quintal”, contou.>
A idosa ainda tentou seguir as instruções dos vizinhos e chegou a se molhar, se cobrir com lençol e com um saco plástico entregue por outro vizinho. Apesar das tentativas, dona Igna não resistiu e faleceu dois dias depois.>
Preocupação A morte da moradora deixou a comunidade com medo e preocupada. A conciliadora judicial Maria Cristina Santos, 52, tem se precavido: “Eu não abro mais as janelas. Tá todo mundo triste e com medo. Tem gente saindo daqui”.>
A dona de casa Maria José Ferreira, 49, conta que os próprios moradores buscaram uma solução. “Chamamos uma empresa na quinta, e ela levou o orçamento para os responsáveis pela obra”, explicou. Segundo os moradores, o orçamento apresentado para o serviço de retirada da colmeia era de R$ 800, mas o valor foi recusado pelos responsáveis pelo empreendimento. No dia seguinte à recusa, houve o ataque a dona Igna.>
Segundo os vizinhos, a colmeia foi retirada no sábado. Procurada, a Secretaria Municipal de Saúde informou que, em razão das abelhas não transmitirem doenças, não é feito um controle dos insetos em Salvador e não há um registro de quais bairros tiveram mais ataques.>
O corpo de dona Igna foi sepultado nesta terça-feira (12) à tarde no Cemitério Municipal de Plataforma, no Subúrbio.>
Polícia Ambiental não remove os animais Um dos problemas enfrentados por quem sofre um ataque de abelhas é, depois do transtorno à saúde, conseguir se livrar da colmeia, que acaba continuando no local onde houve o ataque.>
Em Salvador, quem precisa “se livrar” de abelhas acaba tendo que contratar uma empresa especializada na remoção dos animais. No caso dos moradores do Barbalho, onde aconteceu o ataque na sexta-feira passada, o orçamento para o serviço ficou em torno R$ 800 - o que corresponde a 80% de um salário mínimo.>
A Polícia de Proteção Ambiental (Coppa), ligada à Polícia Militar da Bahia, órgão comumente chamado para fazer a remoção dos animais, informou, por meio de nota, que não é responsável por fazer o manejo dos animais sinantrópicos - aqueles que se adaptam à vida entre humanos, como abelhas, cupins, formigas, pulgas, piolhos, mosquitos, moscas e outras espécies nocivas.>
Em nota ao CORREIO, a Coppa informou que tem como missão “coibir crimes ambientais” e que “não compete à referida unidade da Polícia Militar fazer o manejo de animais sinantrópicos - a exemplo de abelhas, conforme Instrução Normativa do Ibama nº 141/2006”.>
Apesar do posicionamento da companhia, o documento do Ibama diz que “fica facultado aos órgãos de segurança pública, Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Defesa Civil, o manejo e o controle da fauna sinantrópica nociva, sempre que esta representar risco iminente para a população”.>
A mesma instrução assegura que pessoas físicas e jurídicas habilitadas possam fazer o controle desses animais, sem a necessidade de autorização do Ibama.>
Em 2016, o Ministério Público da Bahia expediu uma nota técnica orientando promotores e órgãos públicos a respeito do manejo das chamadas abelhas africanizadas, por representarem risco à saúde pública.>
O que o veneno das abelhas pode provocar no corpo humano? Efeitos do veneno - A histamina, a melitina e outras enzimas conhecidas como hialuronidase e fosfolipase presentes no veneno das abelhas provocam a queda da pressão. O veneno destrói glóbulos vermelhos. Abelhas ‘enfurecidas’ podem provocar a morte. As informações são da Fiocruz. - Efeito neurotóxico: O veneno atua sobre o sistema nervoso.>
- Efeito hemorrágico: Aumenta a permeabilidade dos capilares sanguíneos.>
- Efeito hemolítico: Destrói os glóbulos vermelhos.>
Reações à picada - Dor forte durante os primeiros dois a três minutos, proporcional ao número de ferroadas recebidas. - Inchaço mais ou menos acentuado. - Vermelhidão no local. - Coceira no local, podendo atingir todo o corpo. - Aumento de temperatura corporal, principalmente no local. - Dificuldade para respirar. - Cor azulada nos lábios (casos de alergia). - Vômito e perda de consciência (casos de alergia).>
Recomendações - Não mexer com abelhas se não for apicultor ou não tiver conhecimento. - Não mexer em dias chuvosos - as mais agressivas estão na colmeia. - Não chegar perto das abelhas sem devida proteção. - Usar vestuário limpo e sem cheiro desagradável às abelhas. - Evitar esmagar abelhas, pois o cheiro do veneno se espalhará entre as demais, motivando uma reação agressiva. - Estudar a biologia delas e seguir as orientações de um técnico. - Não atacar as abelhas. - Usar roupas brancas e de origem vegetal, como algodão. Lã motiva a agressividade. - Evitar movimentos bruscos, porque as abelhas enxergam com facilidade objetos em movimento. - Usar chapéu ou cobrir o cabelo com um pano, pois elas são atraídas por óleos e perfumes. >
Fui picado. E agora? - Retire o ferrão, sem apertar a bolsa do veneno, para que ele não se espalhe. - Aplique gelo no local inchado. - Evite esfregar o local da picada. - Evite tomar banho ou passar álcool no corp, para não aumentar as reações. - Procure assistência médica.>
*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier e da subeditora Clarissa Pacheco>