Índice mapeia áreas na capital com risco de impactos causados por mudanças climáticas

Dado ajuda a identificar áreas para mitigação prioritária por parte do poder público

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  • Da Redação

Publicado em 29 de julho de 2020 às 06:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

As cidades precisam se adaptar para receber as consequências das mudanças climáticas. Portanto, saber a vulnerabilidade de um local é de extrema importância para que os governos possam agir e evitar desastres ambientais. Apresentado nessa terça-feira (28), com a participação do climatologista Carlos Nobre, o Índice de Risco Climático aponta o nível de vulnerabilidade de bairros da capital em relação às questões climáticas.

Parte integrante do Plano de Mitigação e Adaptação às Mudanças do Clima (PMAMC), o índice aborda os riscos de elevação do nível do mar, seca, deslizamento, ondas de calor, doenças transmissíveis e inundação. Foram feitas projeções até o final deste século.

Tanto para o risco de inundação pluvial como de ondas de calor, o índice aponta que quase todas as prefeituras-bairro possuem áreas de risco crítico para estes dois fatores, com exceção do Subúrbio/ Ilhas e Barra/ Pituba. O Calabar lidera o risco de ondas de calor em 2050, enquanto Novo Horizonte (em Tancredo Neves) corre maior risco de inundação naquele ano, se nada for feito até lá.

As porções sudoeste, oeste e noroeste de Salvador são as regiões que mais poderão ser afetadas pelo risco de seca meteorológica. Os maiores valores para ameaça estão nas prefeituras-bairro do Centro/ Brotas, Subúrbio/ Ilhas, Itapuã/ Ipitanga, Cidade Baixa, Liberdade/ São Caetano e Cabula/ Tancredo Neves. Em 2100, o Arenoso seria o bairro com a maior probabilidade de sofrer com o fenômeno.

Ainda de acordo com os modelos, quatro áreas de Salvador podem ser mais fortemente impactadas pela elevação do nível do mar até 2050. São elas: porções de Ilha dos Frades e Ilha de Maré em sua totalidade, a região de Paripe, uma faixa que se estende da Península Itapagipana até o Comércio (com exceção das áreas mais elevadas) e uma sequência de manchas descontínuas ao longo da costa que vão do Porto da Barra até a fronteira nordeste do município.

A prefeitura-bairro Liberdade/São Caetano é a que possui um índice mais elevado de risco de deslizamentos. Em 2100, Boa Vista do São Caetano lideraria o ranking de bairros com mais ameaça de deslizamento.

As mudanças climáticas também podem afetar a ocorrência de doenças transmissíveis. Levando em conta o Aedes aegypti, transmissor da dengue, chikungunya, febre amarela e zika, o modelo aponta que toda cidade de Salvador possui alto risco de doenças transmissíveis. 

“O clima é um condicionante da ocorrência desse vetor, ele não é um determinante. Outras características como a questão da vulnerabilidade e o cuidado dentro de cada casa é que faz com que o vetor tenha mais condições de se proliferar”, ressaltou a gerente de risco climático e adaptação Way Carbon, Melina Amoni.

Amoni ainda ressaltou que é necessário cruzar os dados de risco ao analisar as áreas de adaptação prioritária. “Depois de olhar para cada uma das ameaças, se faz a combinação dos riscos para priorizar as ações de redução de mais de um risco”, disse.

As populações com mais adensamento e mais vulneráveis são as que mais sofrem com as mudanças climáticas e a ocorrência de eventos extremos, aponta a diretora de Resiliência da Secretaria Municipal de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência (Secis), Adriana Campelo. “Fazer um plano de mudança climática dá um norte para a preparação para que esses eventos não aconteçam. Objetivo de ter um plano é que a gente seja capaz de fazer a adaptação climática da cidade. O índice nos ajuda a entender nossos riscos para que possamos trabalhar esses riscos”, afirmou Campello, que também ressaltou que o estudo é um retrato do momento atual da cidade e usou os dados do Censo do IBGE de 2010.O climatologista Carlos Nobre, referência brasileira em estudos sobre aquecimento global e pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe), ressaltou que existem limites para a adaptação. “Para diminuir o risco, temos que atingir os objetivos do Acordo de Paris. Se continuarmos neste caminho, em 2100, o mundo tropical não existirá mais para humanos. A adaptação é para o presente, as mudanças estão todos os dias acontecendo. Para o futuro é necessária a redução de emissões de gases estufa”, afirmou.

Na mesma linha de Nobre, Sérgio Margulis, ex-economista do Banco Mundial e consultor especialista da WayCarbon, ressaltou que pensar nas ameaças do presente é fundamental. “Vemos as projeções de 2100, mas Salvador tem uma série de problemas que já não atendem aos problemas de hoje. Vamos começar por aí. Se tivermos resiliência para as condições atuais, vamos estar mais preparados para resiliência do que vier lá para a frente”, relembrou.

Ainda de acordo com Margulis, adaptação é complicada por ser única de cada localidade. “Nosso plano envolve tanto mitigação quanto adaptação, hoje nós falamos sobre a parte de adaptação e vulnerabilidade. Lembrando que todas as ações de mitigação são ações globais e se aplicam mundialmente para todos os países. Já a adaptação é uma questão exclusiva de cada cidade e localidade. A agenda de adaptação é mais difícil nesse sentido”, explicou.

O secretário municipal de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência, João Resch, apontou que a capital baiana tem um compromisso na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. “Salvador chega a um momento de destaque. Um momento muito bacana de aprendizado hoje com as referências aqui de todo consórcio que está elaborando o plano. Todos são pessoas técnicas que agregam com o nosso pessoal técnico e também com a participação popular. Também buscamos a transversalidade com outros planos da cidade. A gente tem muito a colher com esse plano finalizado”, disse Resch.

O diretor geral da Defesa Civil de Salvador (Codesal), Sosthenes Macedo, apontou ainda que as mudanças climáticas intensificam desastres ambientais que são capazes de deixar vítimas, como os casos de alagamento e deslizamento de terra. “A Codesal trabalha de forma sistêmica para que a resposta que seja dada à população em risco seja feita da forma mais breve possível. As mudanças climáticas impactam enormemente na nossa vida, observamos um acréscimo vigoroso de chuvas na nossa capital. Registramos o semestre e o trimestre mais chuvosos dos últimos 36 anos em Salvador, o que leva risco para a população que vive nessas áreas mais afetadas”, afirmou.

Iniciado em janeiro de 2020, o PMAMC é uma iniciativa da Prefeitura financiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), com apoio do C40, da Agência GIZ de Cooperação Alemã e elaborado por um Consórcio composto por WayCarbon, ICLEI e WWF. Ao final do plano, ele deve ser usado como base para a política de mudança do clima de Salvador, afirmou Campelo.

*Com orientação da subeditora Fernanda Varela