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Paulo Leandro
Publicado em 17 de junho de 2020 às 05:00
- Atualizado há um ano
Quem nunca sofreu por um clube? Certo da vitória, voltou de cara inchada tomando 1x0? Jogando por um mísero empate sem gols, vem aquele tento, e contra, nos acréscimos, irremediáveis acréscimos? Dando 2x0, levou a dolorosa virada ou perdeu o título no peru do desgraçado goleiro?
Quando íamos aos jogos podia dar três resultados: vitória, empate ou derrota. Agora, isso acabou, e veja o quanto este fenômeno melhorou nossa vida, nossa auto-estima e confiança no Criador! Agora, vivemos para vencer, acabou a escravidão do Egito!
"Ainda bem" que veio o coronavírus – como bem disse o companheiro, forte abraço! – para acabar com esta coisa de caixinha de surpresas no fútil-ball! Nada mais sem graça, especialmente pelo perigo de sofrer por um amor generoso demais – com os outros.
O danado do Youtube até já aprendeu e recomenda para mim sempre uma vitória do Decano. É 3x1 no Atlético Mineiro, fora; 5x1 e outros 5 no Fla-freguês, é 7x2 e rebaixamento do Palmeiras, vixe, é muita alegria para um torcedor só, viva São João!
É só love. Jamais, nunca, em tempo algum, houve sequer um empate desta esquadra desembestada e sediada no bairro onde parecia mais uma cidade subsaariana como falou o presidente da república, prevendo o desastre econômico por causa de umas vidinhas.
Vidinhas, amigo, toscas e substituíveis! Quando se pode curtir tantas vitórias do Nego, quatro a cinco por dia, goleadas humilhantes, não se pensa em vidas! Não vou nem falar no coirmão para não chatear os amigos Santa Bárbara e Botelho em laele no Facebook.
Vidas já não valem nada mais, quero ouvir a tua voz... a letra não era bem esta, mas esta coluna recomenda, como relax, procurar links de jogos memoráveis, destes que fazem a vida valer a pena: depois, é só alegrar-se com um monte de gooooool... e é do Vitória!
Os speakers chamados metralhadoras prevaleceram sobre os apenas descritivos (citavam os nomes dos jogadores com o controle da bola e poucas ações), mas há partidas mais velhas interessantes, não precisa também ver só o seu amor, pode trair que nem vai saber.
Meu preferido é o narrador Orlando Duarte porque junta minhas duas armas preferidas, as winchesters com as quais carrego minha melhor munição; quando a bola transpõe a linha fatal, ele diz, suavemente: “Esporte... é Cultura!”.
Cultura, a TV onde ele trabalhava, era a mesma de Vladimir Herzog, mas este assunto pode desagradar os anistiados, hoje, reorganizados em pelo menos cinco grupos bem preparados (da última vez que contei), imagina a goleada com o banho... de sangue.
O conforto das imagens de televisão, e mesmo sendo uma tv esperta (smart tv) como a nossa, no entanto, eu não troco por uma boa locução, com Jorge Khoury, Valdir Amaral e outros tantos do agrado de Paulo Cézar Gomes, a quem peço completar a convocação.
Mudando de Leão pra Canário, a quatro dias de uma efeméride cívica, a maior desde Canudos e o Paraguay, é dos narradores esportivos o privilégio de narrar o olha lá, olha lá, olha lá, no placarrrrrrrrrrr de Geraldo José de Almeida, de quem ia esquecendo-me.
Já foram tão reprisados os jogos da Copa de 1970, fazendo 50 anos domingo agora, que se torna até hesitante a atitude de dar um tempo na melhor campanha do Vitória em todos os tempos jogando em casa (a minha) a fim de tornar-se campeão pandêmico 2020, enfim, a ESTRELA.
Desde a quarentena imposta para evitar o espalhavírus pelo condomínio, sem contar direito, é claro, estimo ter colecionado mais de 150 vitórias do amazing Nego via telinha magic.
Para quem já fez 56 e sofre de doença degenerativa, a amnésia encontrou grande adversária neste acervo disponível, muito dele organizado por torcedores sábios em novas tecnologias.
Jogadores que a gente nem se lembra mais, outros que passaram só uma temporada, mais alguns cuja contribuição foi pequena, mas existiu, eita, é uma festa de lembranças boas esta ideia de ver o time ganhando todas em um período da vida, sem tropeçar.
Tão mais divertido que acompanhar golaços e outros nem tanto é perceber os decibéis arriando nas vozes tricolores, mostrando um esforço tremendo para mostrar o quanto são profissionais, logo buscando relevantar o voo de uma alegria postiça pelo coirmão.
Vale, sim, o esforço! E a gratidão! Fica, então, aqui, a recomendação a geral para alegrar-se enquanto a coragem não vem. O Estado poderá bater, um dia, à tua porta para te testar, e mesmo se der negativo, você pode ser levado para algum centro goiabeiriano de recuperação.
E então, você lembrará, com saudade, como foi bom curtir com seu grande amor aquela honeymoon da quarentena, seu va-ga-bun-do, enquanto seus amigos e vizinhos estavam por aí, nas ruas, mantendo a economia do país em pé, mostrando o quanto tem sangue brasileiro nas veias...
Paulo Leandro é jornalista e professor doutor em Cultura e Sociedade. Escreve às quartas-feiras.