Jequié foi o grande sertão de Dalva de Oliveira

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Publicado em 9 de junho de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Agoniado pela tarde quente de outono deste sertão baião, a pergunta mais premente é? O que fazer para espantar o tédio – e, quiçá, não perder a esperança jamais? Escancaro o coração. Esmiúço a mente. Desparafuso neurônios. Desconjunto o cérebro. Reconstruo memórias. Nada. De repente, num átimo, em barrocas letras garrafais, nome de mulher emerge das paredes do quarto: Dalva de Oliveira. Não entendo nada. Por que diabos essa grande, enorme, inigualável musa da canção brasileira resplandece assim nos porões de minha alma? Então penso um pouco + e a luz se faz. Sim, claro. Tudo a ver. Em tempo no qual nem eu havia nascido, a ‘estrela Dalva’  fizera questão de gravar canção intitulada ‘Sertão de Jequié’. [Você sabia?]

Estrelíssima da música brasileira – e de todas as bocas de Matilde que fofocavam sobre a vida frenética que protagonizava -, Dalva de Oliveira fez pedido a Luiz Gonzaga – sim, ele mesmo, o velho e grande Lua – para quem o carioca Klecius Caldas (1919-2002) e o recifense Armando Cavalcante (1914-1964) tinham composto ‘Sertão de Jequié’. A diva foi direto ao assunto: - Amo essa música. Quero gravar. Você deixa? [Como resistir a pedido feito com tal clamor vindo de artista tão espetacular? Lua abriu aquele sorriso enorme e disse: - Pode gravar, minha linda!]

Essa dobradinha improvável – a rústica Jequié e a gloriosa Dalva – começou a ser urdida quando ela se apresentou, em noite de gala, no Cine Theatro Jequié, com plateia lotada de 1200 lugares, no começo de 1950. Recebida com frenesi pelos fãs nativos, foi também paparicada por ricos italianos imigrados para estas bandas desde o final do século 19 – que a cercaram de mimos e regalos. Com a gravação de ‘Sertão de Jequié’, Dalva de Oliveira quis retribuir esse carinho. [Quase 70 anos depois, decido circular pela área central desta cidade e descobrir fiapo, vestígio, fagulha, dessa parceria inusitada].

Flano por mais de uma hora pelas ruas e praças que Dalva de Oliveira passou – desfilou em carro aberto, seguida por séquito de fãs. Paro às margens do Cine Theatro Jequié, hoje desleixado e abandonado. Paro também em frente ao hotel onde se hospedou, o City Hotel. Derrubado, foi erguida no local loja de eletrodomésticos. Nenhuma pista da ‘estrela Dalva’ – nada de Dalva. Também não há estátua em homenagem à diva. Nem virou nome de praça, rua ou padaria.  [Quanta ingratidão!]

Volto pra casa desencantado, e cantarolo baixinho – e desafinado: - ‘Deixei meu ranchinho pobre, no sertão de Jequié, vim pro Rio de Janeiro, só pra ver como é que é’. Subo a ladeira de casa, sussurrando o final da letra, que diz assim: – ‘Mas nada é mais bonito, que as ‘muié’ e a lua, que ‘alumia’ meu sertão de Jequié’. 

Ressalto, com vigor: 1. É única (grande e preciosa) canção brasileira a exaltar – e com que grandeza! – esta cidade de beleza árdua mergulhada em eterna lassidão. 2. ‘Não há, oh gente, oh não, luar como esse do sertão’ – olha aqui o Luiz de Gonzaga de novo, de volta a esta história.