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Paulo Leandro
Publicado em 14 de dezembro de 2019 às 05:00
- Atualizado há um ano
Uma ação tem valor moral no íntimo, na imanência, na boa vontade de fazer o bem ou só pode ser avaliada quando se vê o resultado na experiência, na prática, no resultado, no efeito desta intenção positiva?
Pode ser que o treinador do Flamengo, Jorge Jesus, tenha honrado o nome de santo e de salvador, ao unir as duas pontas desta questão central para o nosso bom convívio, sem resposta conclusiva.
O Jesus campeão visitou o Instituto Nacional do Câncer, no Rio, e anunciou a disposição de transferir o dinheiro correspondente aos direitos autorais de sua biografia, para o setor de pediatria do estabelecimento.
A biografia, ‘Mister Jesus, quebrando paradigmas no futebol’, de autoria do escritor Pedro Braz, tem o selo da editora All Book.
Embora tenha sido útil para divulgar o livro, a boa ideia tem seu mérito num mundo onde torna-se a cada dia mais incomum ser-do-bem.
Se conhecemos a dor do outro, que sofre com uma doença, e temos como ajudar, por que não dar a força?
O Jesus campeão só não escapou da antiga desconfiança de se misturar caridade com vaidade. Há quem considere moral a ação, apenas se realizada no anonimato.
Unir imagem pessoal com caridade, para os mais exigentes, poderia ter efeito de oportunismo. Mas seria proibitivo pensar numa boa tabelinha entre boa vontade e compaixão?
Além de atiçar nossa reflexão sem-resposta para identificar a origem do valor moral, o Jesus do Fla nos lembra a inclinação natural por sentir a dor do outro. Há pessoas mais compassivas, outras menos, ou é possível desenvolver empatia?
Exemplo mais forte de humanismo é o do jogador Sadio Mané, senegalês, cuja significação do nome também é auto-explicativa por remeter à saúde e à inocência. Sabe-se da importância de sua benevolência com seus irmãos africanos.
Em sua sabedoria dos craques de caráter, Sadio ajuda com doações frequentes a quem mais precisa em seu país de origem. Pergunta este grande representante da compaixão o que faria “com 10 ferraris, dois aviões ou 20 relógios com diamantes?”.
Chegamos, aqui, a outra questão irrespondível, e por isso mesmo, capaz de nos alçar voo a maiores abstrações: por que Sadio tem tão desenvolvido este senso de compaixão e tantos outros, em condições iguais ou melhores, não conseguem?
Sadio não pôde estudar, jogou bola descalço e passou fome, como tantos outros pequenos senegaleses. Hoje, aplica parte do dinheiro pago pelo Liverpool da Inglaterra para construir escolas e distribui 70 euros (185 reais) mensais a cada família de sua região.
Também dá de presente roupas, sapatos e garante comida para quem precisa e não apenas em tempo de Papai Noel.
Sadio Mané construiu até estádio no Senegal, onde é o principal destaque da seleção nacional. O mundo do ‘fútil-ball’, inserido no mundão da Babilônia, está cheio de exemplos egóicos, celebridades, contratações milionárias, a alegria de quem tem contas obesas e estoura o dinheiro com consumo sem noção... quem vai julgar?
Podemos louvar com mais frequência os raros exemplos de compaixão e caráter, como os de Jesus e Sadio: quem sabe não multiplicamos estas ações do bem? Quem monta lindos presépios, mas ignora os carentes, ainda pode mudar e ser campeão da vida.
Paulo Leandro é jornalista e professor Doutor em Cultura e Sociedade