Jornalismo (Artificialmente) Inteligente

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  • Marcio L. F. Nascimento

Publicado em 21 de agosto de 2019 às 14:00

- Atualizado há um ano

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Chegará o dia em que leremos notícias de jornais feitas por robôs? Não, esta não é uma pergunta retórica. E a resposta é positiva: sim, já é possível ler pequenos tuítes (sentenças com até 140 caracteres) e mensagens de WhatsApp feitos por robôs virtuais. Mas, não, ainda não existem bons textos feitos por robôs-jornalistas, embora seja possível encontrar na internet sites que geram textos, inclusive jornalísticos, aos montes.

O progresso da inteligência artificial é avassalador: até os programas revisores de texto mais simples verificam (e eventualmente corrigem) a gramática e a ortografia, como ocorreu com este texto.

Como outro exemplo, em alguns jornais, como o CORREIO, já é possível ouvir escritos publicados, como este, a partir de uma inteligência artificial chamada www.AUDIMA.co. Este robô virtual simplesmente lê os textos, convertendo-os em áudio, facilitando assim aqueles que apresentam alguma deficiência na visão (como catarata), são (semi-) analfabetos, estão com vista cansada (presbiopia) ou simplesmente não têm tempo de ler, pois estão por exemplo dirigindo algum automóvel.

Hoje em dia, jornais publicam 24h, a qualquer momento, e não apenas em edições matutinas, vespertinas ou mesmo noturnas, como antigamente. A necessidade de informação continua sendo a mesma: quem vai informar primeiro? Quem noticiará mais rápido?

As novas tecnologias são uma realidade. É preciso compreendê-las para retirar bons proveitos. No Seminário O Futuro do Jornalismo, patrocinado pelo CORREIO, ocorrido em 26 de julho de 2019, foram apresentados alguns casos de sucesso. Um primeiro exemplo foi o www.Jota.info, site focado em cobertura do Judiciário tem um robozinho virtual chamado @ruibarbot, em homenagem ao grande polímata brasileiro Ruy Barbosa de Oliveira (1849 - 1923), monitorando processos no Supremo Tribunal Federal. Melhor do que qualquer pessoa, avisa praticamente de modo instantâneo se determinado processo avançou (ou não), e com frequência qual é a situação. Para tanto, o robô virtual visualiza todos os documentos digitais à disposição e seleciona alguns que apresentam determinada relevância por meio de programação apropriada. A frase mais comum enviada por meio de tuíte envolve a sentença: “o processo tal” está parado há “tanto tempo”. O lema do robozinho baseia-se em famosa frase do grande Ruy: “justiça tardia não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”.

Um segundo exemplo correspondeu à apresentação da Operação Serenata de Amor, projeto de inteligência artificial com foco na investigação de gastos públicos. O robozinho virtual chama-se Rosie (@RosieDaSerenata), em homenagem à personagem que é uma empregada doméstica robô da série animada de televisão Os Jetsons. Rosie monitora e divulga gastos suspeitos de deputados federais e senadores, basicamente alertando quando, por exemplo, um parlamentar apresentou um consumo de alimentação muito superior ao esperado no exercício de sua função. Há exemplos como o do consumo diário de um tanque de combustível por dia durante trinta dias obtido por meio da leitura de Rosie nas notas fiscais entregues.

Após avaliação e confirmação, em geral o deputado(a) ou senador(a) é questionado pelo gasto, e não tendo justificativa razoável, deve devolver o dinheiro aos cofres públicos. A operação Serenata consegue acessar com velocidade um grande e variado volume de dados e notar tais inconsistências, verificando sua veracidade melhor que qualquer ser humano.

Um último e curioso exemplo envolve o Gerador Automático de Artigos denominado SCIgen. Consiste num programa elaborado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts que gera aleatoriamente textos desconexos em forma de trabalhos científicos. Apenas a partir dos autores, indicados por um usuário, o software produz um artigo livre de contexto, elaborando todos os elementos necessários a artigos científicos (e prioritariamente na área da Ciência da Computação). Tais artigos contêm portanto: resumo, introdução, resultados experimentais, conclusão e referências, incluindo gráficos e diagramas, todos fakes.

Em 2005, tal programa de inteligência artificial conseguiu a proeza de publicar um artigo em conferência internacional: Rooter: A Methodology for the Typical Unification of Access Points and Redundancy, este aceito no 9th World Multiconference on Systemics, Cybernetics and Informatics (WMSCI 2005). O evento ocorreu de fato em Orlando, Estados Unidos, entre os dias 10 e 13 de julho de 2005. Por meio de doações, o registro deste artigo foi pago pelos autores ao custo de 390 dólares. Outras experiências de submissão são apresentadas no site do SCIgen, que passou a ser considerado o programa de inteligência artificial que primeiro conseguiu a publicação de artigo claramente falso e aceito em evento científico. Não à toa, o lema do programa consiste em “maximizar diversão, ao invés da coerência”. Embora nem tão inteligente assim, deve-se reconhecer que os criadores da plataforma SCIgen ao menos têm bom humor.

Não se deve ter receio do que pode fazer a inteligência artificial – isto já é realidade, embora ainda não seja feita ainda de forma muito inteligente, pois os programas são relativamente simples. De fato, os robôs virtuais ainda são muito tolos, mas relativamente espertos para realizar grandes feitos de forma veloz, voraz, e em grande volume visando a veracidade. Ao futuro somente cabe aguardar por inteligências artificiais realmente inteligentes, com capacidade de pensar.

Marcio Nascimento é professor da Escola Politécnica, Departamento de Engenharia Química e do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências da UFBA

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