'Menino criado na base aprende a amar e sofrer pelo Vitória'

Nadson revela que período de transição fazia a diferença para clube revelar jogadores

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 14 de maio de 2019 às 08:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/Arquivo CORREIO

Na semana em que o Vitória completou 120 anos, o CORREIO realiza uma série de matérias especiais falando sobre a trajetória do rubro-negro nos seus mais de 43.800 dias de vida. E não há como falar da grandeza do Leão sem mencionar a divisão de base do clube, força motora para que o time elevasse seu patamar tanto na estrutura quanto no próprio desempenho esportivo. “Só a base salva”, diz a torcida. Mas no Vitória é mais além: só a base forma e só a base faz.

Último jogador a ser convocado para a seleção brasileira jogando por um time baiano, Nadson entende muito bem a mística que gira em torno da fábrica de talentos construída no Vitória. Acima de tudo, ele garante que não se trata apenas de uma mística, senão um projeto de investir nos talentos que existem e estão à espera de uma oportunidade.

Falando em oportunidade, o próprio "Nadgol", apelido que recebeu graças à afinidade com as redes, demorou para ganhar uma chance no Vitória. Seu primeiro teste foi quando tinha acabado de fazer 13 anos. Levado por seu treinador em uma escolinha de futebol, Carlinhos Capenga, ele saiu de Serrinha e foi até o Perônio, campo que o clube utilizava em peneiras e treinos da base, para sua primeira tentativa na capital. Fez o teste e foi reprovado sob a alegação de que era muito franzino para ser atacante.

Ele aguardou quase quatro anos até uma nova oportunidade aparecer. Mais uma vez levado por seu técnico e grande amigo, pegou estrada até Salvador e fez um novo teste, já com 16 anos. Novamente enfrentou as críticas pelo corpo franzino, mas dessa vez acabou ficando para um período maior.

A ideia inicial do Vitória era integrar Nadson à base do clube e depois emprestá-lo para ganhar experiência em outro lugar. Quem o segurou foi o preparador físico Alexandre Coutinho, que pediu para a direção mantê-lo no elenco para disputar o Campeonato Baiano juvenil. A decisão mostrou-se acertada: o Vitória foi campeão da categoria e Nadson marcou 27 gols.“Aí não tinha jeito, né? Me deixaram no clube e fui ganhando mais espaço. Fiquei no clube de vez, depois passei para o júnior e aos poucos fui ganhando espaço no profissional”, conta o ex-atacante.Nadson foi campeão e artilheiro em todas as categorias em que esteve na base. No currículo de formação, foi bicampeão baiano de juniores, campeão do Nordeste e também venceu torneios no exterior - disputar torneios fora do país era algo comum à rotina dos garotos do Leão na época. Nadson teve duas passagens pelo Vitória. A primeira em 2003, saído da base, e a segunda em 2009 (Foto: Claudionor Júnior/Arquivo CORREIO) Contudo, o maior objetivo da divisão de base é revelar jogadores. Segundo Nadson, o grande diferencial para o Vitória ser um gigante nesse quesito era o período de transição entre a base e o profissional: pelo menos duas vezes na semana os meninos da base iam para o campo do Barradão, onde disputavam coletivos contra os profissionais.

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Às segundas-feiras, enfrentavam os atletas que não jogaram no final de semana. Nas sextas, batiam de frente contra o time que finalizava a preparação para a rodada. Isso ajudava em dois pontos fundamentais: o primeiro de todos era conhecer e ser conhecido pelos profissionais. O segundo, entender como os profissionais jogavam, o estilo do treinador. A integração era o grande trunfo para revelar.“É muito bom porque quando o atleta da base sobe já conhece os profissionais, já está enturmado e fica mais solto, mais leve. A gente prova para eles [os profissionais] toda a semana que somos bons de bola. Os profissionais criam um respeito e fica mais fácil para o atleta da base deslanchar. É muita dificuldade você sair com 17, 18 anos da base pro profissional sem conhecer ninguém”, comenta.Quando foi promovido ao elenco profissional, Nadson não deixou a desejar. O histórico fala por si só: logo de cara ele marcou três gols em um Ba-Vi que o rubro-negro perdia por 2x0. O atacante entrou faltando 14 minutos e virou o jogo no Barradão. Depois disso, ele iniciou o Brasileiro como artilheiro após marcar 10 gols em 11 partidas. Para completar, em um jogo pela Copa do Brasil, Nadson marcou quatro gols no Palmeiras em pleno Palestra Itália. E o Vitória goleou por 7x2.“O Vitória passou a ter força quando investiu em sua base e isso está comprovado. Ninguém vai tirar. É a história, o DNA do time”, defende Nadson.História, DNA e até a própria palavra base são vocábulos recorrentes em qualquer conversa sobre as categorias de formação do Vitória. É esse o caminho apontado por Nadson para a reconstrução do clube, hoje rebaixado à Série B nacional.

Lucas Ribeiro, David e Gabriel Paulista foram as vendas mais marcantes do Vitória nesta década, em 2019, 2018 e 2013, respectivamente. Destes, apenas o atacante David, contratado pelo Cruzeiro, não foi levado pelo futebol europeu. Ainda assim, Nadson acredita que há necessidade de dar mais espaço para os atletas revelados na Toca  Nadson foi rejeitado no primeiro teste que fez no Vitória por conta do corpo franzino (Foto: Arquivo CORREIO) “Menino criado no clube cria amor, sofre junto e depende do crescimento do time para crescer na vida também”, afirma o ex-jogador, aos 37 anos. Para ele, é necessário construir uma cultura em que o atleta contratado já chegue ao Vitória sabendo que vai precisar de muito esforço para tirar o espaço da garotada no time principal.

*Com supervisão do subeditor Ivan Dias Marques.