Metamorfose Ambulante

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  • Horacio Hastenreiter Filho

Publicado em 1 de março de 2022 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Raul Seixas musicou a crítica à mesmice e ao conservadorismo na impagável melodia Metamorfose Ambulante. O baiano dizia que preferia estar sempre a mudar que manter sempre a mesma opinião sobre as coisas. Num mundo em permanente e acelerada mutação, ninguém será capaz de negar o mal de se arraigar a velhos dogmas e posições. No entanto, como já dizia outra canção, o que dá para rir, dá para chorar, questão só de peso e de medida. 

O eleitor de Bolsonaro de 2018 tinha, entre tantas convicções, algumas certezas. A primeira delas é que o Brasil precisava livrar-se da corrupção, elegendo um presidente honesto. Em segundo lugar, deveria se desembaraçar do Centrão fisiológico e chantagista que impedia uma agenda de avanços para o país. Na ordem do dia, estavam, ainda, o resgate do nacionalismo e a necessidade de implementação de uma agenda liberal. Mais importante que tudo, no entanto, era livrar o país do comunismo, afinal “a nossa bandeira nunca será vermelha”.

A tolerância à corrupção no bolsonarismo chegou antes mesmo da posse do novo mandatário. Ainda em 2018, o país inteiro ficou sabendo das estripulias do filho Flávio e do amigo Queiroz, que, se mulher não traz para nós, não deixou de abastecer generosamente as finanças da primeira dama. O Centrão foi chegando sorrateiramente, de mansinho, mas, desde a eleição de Arthur Lira se instalou de forma definitiva no governo e hoje funciona como seu cérebro, coração e aparelho excretor, impedindo, até o momento, o avanço de mais de 160 processos de impeachment contra o presidente.

O nacionalismo adquiriu formas estranhas com continência à bandeira americana, presença frequente da bandeira israelense em manifestações, além de uma interminável lista de concessões aos interesses estadunidenses. Com o bolsonarismo, nasceu o nacional-entreguismo. A agenda liberalizante, independente do juízo de valor a ela atribuída, em termos de reforma, tem na previdenciária, bancada por Rodrigo Maia, o seu único item de execução. 

Mais surpreendente, no entanto, foi a recente visita de Bolsonaro à Rússia de Vladimir Putin, às vésperas de um conflito gigante com as potências ocidentais, na qual não faltaram afagos ao presidente russo e, para estarrecimento dos seus fiéis seguidores, onde realizou homenagem aos soldados comunistas.

Sob o ponto de vista da canção do Maluco Beleza, o bolsonarista se tornou o protótipo da metamorfose ambulante, flexibilizando e reinventando novas modalidades de integridade, nacionalismo e liberalismo e reconhecendo que, afinal de contas, aqueles deputados e senadores ávidos por recursos públicos que estão com o governo, qualquer que ele seja, não são assim tão maus sujeitos. Mais difícil tem sido se posicionar em relação ao conflito Rússia e Ucrânia nesse momento, mas se o mito se derrete pelo camarada Putin é porque, certamente, ele é um bom companheiro.

*Horacio Nelson Hastenreiter Filho é professor associado da Escola de Administração da UFBA