Motoristas de app apostam em escudos de isolamento para evitar coronavírus

Alternativa traz mais segurança para motorista do que para o passageiro, afirma infectologista 

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 1 de setembro de 2020 às 05:49

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arisson Marinho/CORREIO

Divisórias que separam motoristas de aplicativo de passageiros estão se tornando comum em Salvador. Para se proteger da covid-19, escudos de plástico têm sido colocados nos carros, isolando quase que totalmente passageiros de profissionais. Na capital baiana, tanto Uber como 99 já doam ou vendem o equipamento de proteção para os motoristas desde julho.  

Mas bem antes disso, já tinha motorista adepto à tendência. “Eu coloquei no dia 27 de fevereiro, um dia depois da quarta-feira de cinzas e dois dias depois de se confirmar o primeiro caso de covid-19 no país”, disse, orgulhoso pelo feito, o motorista de aplicativo Marcelo Oliveira, 37 anos. “Na época, muita gente me chamou de doido, disse que não havia necessidade. Agora, tá todo mundo botando”, completou.  

E quem olha para o escudo do carro de Marcelo pode até pensar que é de uma nave espacial, pela quantidade de incrementos: lâmpadas LED, ar-condicionado que vai direto para o passageiro, sistema de comunicação com microfone e alto-falantes e local específico para colocar dinheiro ou cartão de crédito.  “É um negócio meio que diferenciado. Tudo isso não surgiu de uma hora para outra. Primeiro, eu vi que quando chovia o passageiro precisava fechar a janela, então bolei o sistema de ar. Depois, percebi que de noite ficava escuro, então bolei o LED. Logo depois, percebi que o passageiro não ouvia muito bem a minha voz, então criei o sistema de comunicação. Tudo isso sozinho”, disse o motorista, que possui anos de experiência trabalhando na área de eletrônica.  A qualidade do serviço é refletida nas dezenas de avaliações dos clientes, que Marcelo fez questão de mostrar ao CORREIO. “Atendimento diferenciado. Muito bem apresentável, bem preparado diante de pandemia que estamos vivendo”, escreveu um passageiro. O sucesso fez com que outros motoristas chamassem Marcelo para instalar o equipamento no seu próprio carro, principalmente aqueles que só sentiram seguro de voltar a trabalhar com a proteção.  

“Eu fui a primeira pessoa que teve o escudo instalado no carro por ele. Isso foi em junho. Na época, ele viu no meu status do WhatsApp uma mensagem na qual eu descrevia que estava com medo de sair de casa. Ele se solidarizou, veio, colocou e não cobrou nada”, afirmou a dona Neuza Kurie Arimitsu, 71 anos. Aposentada, descendente de japoneses e baiana de coração, ela usa o trabalho de motorista de aplicativo como uma ‘terapia’. “Gosto de conversar com as pessoas, conhecer lugares e de vestir a camisa da empresa”, afirmou.   Cheia de vida, dona Neuza não pensa em parar de dirigir (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) O motorista Neuton Neto, 32 anos, disse também ter colocado a proteção no seu carro logo no início da pandemia. A dele, porém, não possui vedação total. "Eu fiz isso, pois se chover o passageiro ficaria abafado. Acho que o cliente usando a máscara e ficando aí atrás, já tem uma segurança", disse. Inclusive, Neuton pôs um adesivo na porta dianteira do passageiro orientando que não é permitido a entrada por lá. "As vezes ainda aparece alguém querendo ir na frente, mas então fazemos esse alerta", explicou.

Já Raildo Honorino Neto, 42 anos, colocou a proteção no seu carro no início desse mês e gostou tanto do resultado que decidiu mantê-la até mesmo para depois da pandemia. "É algo que me deu muita segurança. Não estava rodando antes da proteção", disse o rapaz, que gastou R$ 70 no serviço.

Tendência  O porta-voz do sindicato dos motoristas de aplicativo, Jean Moura, confirmou que, embora não seja obrigatório o uso, os escudos de isolamentos se tornaram uma tendência na área. “É uma proteção contra o vírus, tanto para os motoristas, como para os passageiros. E nós apoiamos essas medidas que trazem segurança”, disse. No entanto, o sindicato não possui um levantamento de quantos motoristas já aderiram a prática.  

A Uber não informou a quantidade de escudos do tipo que foram instaladas em Salvador pela empresa. O mesmo fez a 99, que disse ainda que, em todo o Brasil, 10 mil escudos serão distribuídos gratuitamente para seus colaboradores - Confira no final do texto as condições para adquirir seu equipamento.  Marcelo se tornou referência no assunto (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Já Marcelo garante que, após dona Neuza, instalou o escudo para outros 45 veículos da cidade. Dessa vez, ele não fez de graça. “Cobrei apenas o valor do material, que pode variar de R$ 50 a R$ 500, a depender do que o cliente deseja. O meu custou o valor máximo, pois tem muitas adaptações”, disse. Frederick de Almeida, 29 anos, foi um dos que optaram pelo valor mais em conta.  

“Eu só voltei a rodar quando essa proteção foi instalada, em julho. Fiquei parado por quatro meses, por medo da contaminação. Tenho uma filha de três anos, sogra, pai e mãe mais velhos. Então, há uma preocupação com a saúde deles”, afirmou Fred, como prefere ser chamado. Por conta das novas regras de segurança durante a pandemia, os motoristas não transportam quatro ou mais passageiros e ninguém pode ir no banco da frente. “Normalmente, eles entendem e até agradecem pela segurança”, disse.  

Moradora de Narandiba, Lucineide da Hora, 34 anos, não está saindo de casa durante a pandemia, mas quando precisa, dá preferência para um motorista que ela conheceu durante a pandemia e que tinha o escudo. “Eu fiquei surpresa pelo conforto e segurança. Quando eu saia antes ficava morrendo de medo e, agora, quando preciso sair é com ele. Só não vou quando ele não está disponível. Aí chamo um outro motorista pelo aplicativo. Mas de ônibus eu não vou, pois não me sinto segura”, disse.   Mensagens podem ser colcoadas no escudo de proteção (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Segurança  Para o médico Matheus Todt, infectologista da S.O.S. Vida, o equipamento de proteção oferece mais segurança para os motoristas do que os passageiros. “Essa tela diminui a possibilidade de transmissão do coronavírus entre quem está na frente e no fundo do carro. Mas se uma pessoa entra contaminada no carro e, depois, vem uma outra pessoa e coloca a mão no mesmo local que ela tinha posto e depois a leva para a boca, por exemplo, ela se contamina”, afirmou.  

Todt descreveu ainda o perigo de contaminação que está presente numa viagem do tipo. “Existe perigo pelo fato da proximidade entre as pessoas presentes no carro. O problema aí não estaria nem no ar-condicionado. O problema são as gotículas que saem de uma pessoa contaminada e, também, a possibilidade de acesso às superfícies que podem estar contaminadas”, disse.  

Por isso, manter as medidas de higiene e distanciamento básicas, como uso de álcool em gel, máscara e não sentar no banco da frente, próximo ao motorista, é algo fundamental. A própria higienização do local onde o passageiro esteve é importante, embora o infectologista destaque que esse processo de higienização não é feito facilmente.  “A superfície do banco do carro, por exemplo, possui um material que não tem facilidade de higienização. Mas é importnate que seja limpado constantemente o local onde os passageiros colocam o braço e a mão, como a maçaneta da porta, seja a de dentro ou a de fora”, disse.    Quanto ao tipo de material usado na construção desse escudo de isolamento, Matheus disse que o plástico é uma boa opção. “O que importa é que seja um mateiral impermeável e que o escudo esteja totalmente vedado. O ideal é que não tenha nada aberto, pois a gotícula é pequena, pode passar em algum buraco. É difícil, mas pode acontecer”, explicou.  

Como adquirir seu equipamento de proteção: 

Marcelo: Entre em contato com ele pelo telefone (71) 99117-3840. Preço: De R$ 50 à R$ 150, a depender do serviço desejado. 

Uber: No Centro de Higienização, localizado Estacionamento Estapar, na Avenida Luís Viana, 7416 - Alphaville I. A divisória é oferecida gratuitamente aos motoristas parceiros que estão na categoria Diamante do programa de fidelidade Uber Pro. Para os demais parceiros, o desconto varia por categoria. O preço cheio da divisória seria de R$ 150. Além de quem recebe gratuitamente, os outros podem ter 75%, 50% ou 40% de desconto. Com o menor desconto, sai por R$ 90. 

99: Na Base de Segurança instalada no Shopping Paralela, que fica na Av. Luís Viana, 8544. A empresa informou que não vende o equipamento, mas apenas o distribui gratuitamente aos motoristas que possuem mais corridas, em etapas, para não gerar aglomerações, através de um convite pessoal enviado pelo aplicativo 99 de motorista.

* Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro