Na Bahia, as cidades médias crescem absorvendo habitantes dos municípios pequenos

Dados demográficos são oriundos de estimativa do IBGE, projetada a partir dos dois últimos censos

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  • Wendel de Novais

Publicado em 28 de agosto de 2020 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

O de cima sobe e o de baixo desce. Assim como na música baiana Xibom Bombom, do grupo As Meninas, os municípios baianos têm visto as diferenças se intensificarem quando o assunto é índice demográfico. Cidades como Barreiras e Vitória da Conquista, que estão entre as dez mais populosas em território baiano, seguem recebendo mais residentes e se transformando em centros regionais. Enquanto localidades menores como Catolândia e Lafaiete Coutinho, que estão entre as cinco com menor população do estado, amargam uma queda contínua no número de cidadãos, de acordo com dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

No ranking populacional da Bahia, enquanto 80% das cidades que mais crescem são de médio porte - que têm de 20 a 150 mil habitantes -, 86,3% dos municípios que mais perdem residentes já são pequenos - tendo menos de 20 mil habitantes - segundo dados do IBGE. Os dados são resultado da estimativa apurada por um cálculo matemático e da distribuição das populações dos estados - projetadas por métodos demográficos - seguindo como critério a tendência de crescimento que cada município mostrou nos dois últimos censos demográficos, de 2000 e 2010. 

Mariana Viveiros, supervisora de disseminação de informações do IBGE na Bahia, explicou como o cálculo é realizado e o que é considerado para chegar nesta estimativa. “O IBGE tem um dado de projeção populacional para os estados, que é atualizado de cinco em cinco anos e é formado a partir de um cálculo demográfico que leva em consideração nascimentos, mortes e migração. No caso das taxas de mortalidade e natalidade, utilizamos estatísticas do registro civil. Para a migração, usamos os dados dos censos. A partir da avaliação desses números, o IBGE desenvolve uma projeção das populações dos estados. Considerando a projeção, nós distribuímos a população entre os municípios tendo como critério a tendência de crescimento ou queda que cada uma dessas cidades mostrou no último censo”, clarifica.

Há quem não aprove o método de aferição dessa estimativa. O presidente da União dos Municípios da Bahia, Eures Ribeiro, questionou a eficácia do cálculo. “Não é censo, nós não tivemos esse ano. Essa metodologia para encontrar a estimativa faz com que o resultado não honre a realidade dos municípios. Como você vai fazer uma estimativa a partir de um dado que tem mais de 10 anos? Eu, sinceramente, não vejo eficácia nos métodos que o IBGE utiliza para achar os números que foram apresentados aí”, declara Eures, sem, no entanto, qualquer comprovação científica de suas alegações.

O censo demográfico das cidades baianas iria ser realizado em 2020, mas, por conta dos desdobramentos da pandemia do novo coronavírus, a execução do projeto teve que ser adiada. A divulgação anual das estimativas de população obedece ao artigo 102 da Lei nº 8.443/1992 e à Lei complementar nº 143/2013. Através destas, o Tribunal de Contas da União (TCU) realiza cálculo do Fundo de Participação de Estados e Municípios (FPE e FPM) e elabora indicadores econômicos e sociodemográficos municipais, nos períodos intercensitários. Ranking das cidades baianas mais e menos populosas, segundo estimatva do IBGE, em 2019 e em 2020 (Foto: IBGE/Divulgação) Centros regionais

Os fenômenos de evasão dos municípios menores e crescimento demográfico das cidades de médio e grande porte não é de exclusividade da Bahia. Segundo informações do IBGE, o Brasil inteiro é formado por milhares de localidades de pequeno porte, que pelo tímido ou nulo desenvolvimento, não conseguem oferecer um espaço que atraia ou mesmo mantenha moradores. Os fatores para essa evasão são inúmeros. Economia pouco dinâmica, baixa oferta de empregos e ausências de universidades são uns dos principais porquês para a migração intraurbana. E são esses porquês que mostram como estes fenômenos estão diretamente relacionados. As cidades maiores têm como trunfo de atração a presença de tudo que falta nos municípios menores. 

O fluxo direcionado para os locais com mais estrutura faz surgir o que Mariana chamou de centros regionais, cidades do interior que absorvem o quantitativo populacional de quem está ao seu redor. “A gente tem, aqui na Bahia e em outros estado do país, com um alto grau de concentração em cidades médias e grandes, que acabam atraindo a população. As médias têm se beneficiado populacionalmente falando porque as pessoas optam por ir para locais que estão mais próximos, o que chamamos de centros regionais”, diz. 

Entre as cidades que se caracterizam como centros regionais, estão municípios como Feira de Santana, Vitória da Conquista e Camaçari. Conquista conta com duas universidades públicas reconhecidas, Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), que atraem estudantes de toda região sudoeste do estado, Camaçari recebe milhares de profissionais que trabalham no maior polo industrial do estado e Feira, entroncamento rodoviário e sede de um comércio bem desenvolvido, é ponto de chegada para muitos empreendedores e cidadãos que procuram oportunidade no mercado de trabalho.

Carlos Brito, secretário de planejamento de Feira de Santana, diz que o crescimento populacional é positivo, mas exige responsabilidade. “A nossa cidade tem um comércio muito bem estabelecido e que representa uma oportunidade de renda para as pessoas. Receber essa demanda faz com que a cidade cresça e que a verba direcionada para a administração municipal acompanha o aumento de pessoas. Mas é necessário entender que isso reforça a necessidade de pensar políticas para que esse desenvolvimento aconteça de maneira ordenada”, fala Carlos.

Quem mais diminui

Locais que funcionam como ímã do fluxo populacional retiram habitantes de cidades menores que estão próximos. Essa lógica se repete em todo o estado onde pequenos centros continuam caindo demograficamente e cedendo moradores para diferentes centros regionais. No caso de Catolândia, segunda cidade com menos população no estado, a vilã é Barreiras, que agora está entre as dez mais povoadas da Bahia, com quase 157 mil habitantes, e fica a 29km do povo catolandiano.

O prefeito Gilvan Pimentel confirma o processo migratório dos cidadãos da cidade para Barreiras, embora alegue que a situação tem ficado menos recorrente. “Isso é um fluxo já tradicional. Muitos saem daqui e vão para lá, mas essa evasão está diminuindo. A gente cansou de ver pessoas de malas prontas para fazer essa mudança. Qualquer lugar de Barreiras que você chegar, pode procurar gente de Catolândia que vai ter, com certeza”. Segundo o prefeito, a administração da cidade aposta na reestruturação e otimização dos serviços básicos para frear a evasão. “O que podemos fazer é melhorar a educação, saúde e demais aspectos de nossa responsabilidade. Fazer com que o povo se sinta confortável para ficar”, diz.

Em Lafaiete Coutinho, terceira menor população da Bahia, com apenas 3.693 residentes, a prefeitura também tenta brecar a saída dos moradores para Jequié, que fica a 37km de distância. Segundo Lucas Almeida, secretário de administração, o que se tem feito é proporcionar oportunidade emprego para os habitantes. “A maioria das vagas de emprego que ofertamos são destinadas para pessoas daqui. Tentamos minimizar o número de profissionais de fora que atuavam na cidade e costumavam morar em outro local. Com a população nativa empregada e com renda, esperamos atenuar esse êxodo”, declara. 

Capital baiana estaciona

Com o quantitativo estimado de 2.886.698 moradores, Salvador se mantém, em 2020, como a quarta maior cidade e capital do país, atrás de São Paulo (12,325 milhões de pessoas), Rio de Janeiro (6,747 milhões) e Brasília (3,055 milhões). Se compararmos com a estimativa populacional de 2019 (2.872.347 pessoas), Salvador teve uma taxa de crescimento de 0,50% em um ano, a sétima menor entre as 27 capitais e a terceira menor do Nordeste. 

Sobre isso, Mariana afirma que é um processo comum, que também acontecem com outras capitais do país como São Paulo. “Salvador tem uma centralidade muito importante para o estado da Bahia. Só que muitas pessoas, que têm trabalho ou estudam na capital, acabam não morando na cidade. Não se tem uma taxa de crescimento tão alta porque o que cresce mais são as cidades ao redor de Salvador. No momento, a tímida taxa de crescimento faz com o município se distancie de Brasília, terceira cidade mais populosa, e se aproxime de Fortaleza, quinta colocada do ranking. Mas isso não é exclusividade daqui São Paulo, por exemplo, teve muito isso. O interior paulista e a região metropolitana da cidade receberam muitos habitantes por isso”, informa.

Em território baiano, a situação descrita por Mariana influencia a taxa de crescimento da Região Metropolitana (RMS). A RMS de Salvador é a oitava mais populosa do país e a terceira com mais gente no Nordeste, com estimativa de 3.957.566 habitantes em 2020. O favorecimento da região faz com que quatro dos dez municípios baianos com maiores taxas de crescimento populacional entre 2019 e 2020 sejam da RMS. Camaçari, com avanço de 1,7%, chegando a 304.302 habitantes neste ano; Dias D’Ávila, também com 1,7%, chegando a 82.432 habitantes; Lauro de Freitas, 1,6% e 201.635 habitantes; e Madre de Deus, 1,6% e 21.432 habitantes em 2020.

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro