Na ‘caldeira do diabo’, o embate entre o bravo guerreiro e o dragão da ‘soldade'

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Publicado em 24 de fevereiro de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Sob o sol escaldante do sertão, sair de casa nas primeiras horas da manhã é desafio acachapante. Eu topo, e ando cerca de oito quilômetros pelas margens da rústica Avenida C.B. A garrafinha de água filtrada congelada  durante a madrugada fica morna na metade da travessia. A camisa de manga comprida com proteção solar encharca-se de suor.  O boné hering e os óculos escuros comprados por vinte dinheiros – tentam manter intactos o meu cérebro e os meus olhos. [Caminhava + até semana passada. Depois do susto – empenei  o ombro direito em evidente sinal de fadiga muscular; a ponto de pensarem que eu era caminhante bêbado – con sultei médico. Recebi recomendação: diminuir o ritmo. Obedeci.

[Neste calor ‘senegalesco’, esta cidade construída em vale-buraco cercado por grandes morros já amanhece fornalha. Às 5 da manhã, o silêncio sepulcral  demora a ser quebrado. Ninguém quer acordar desse torpor profundo. Os galos pararam de cocoricar. Os passarinhos nativos cantam, com menos viço, mas cantam: heróis da resistência. Os cachorros começam a latir aos poucos, cheios de preguiça. Só considero esta ‘caldeira do diabo’ – (epíteto surrupiado do título em português da série americana 'Peyton Place’, com Mia Farrow garotíssima no elenco, e que as crianças de minha gera&cc edil;ão certamente relembrarão) – enfim acordada quando motoqueiros a 100 por hora rasgam o asfalto de rua vizinha].

Depois dessa travessia pelas cercanias do centro urbano, adentro o fuzuê do comércio local. Depois de passar na loja de meu irmão para pedir a ‘bença’ e prosear um bocadinho, aproveito as sombras das marquises, adentro a pequena selva urbana – e esbarro com as gentes da terra – e tudo vira zoada só e dissonante num sertãotãotão em transe.

Nessa algazarra na qual se misturam buzinar de carros, cacarejares de motocicletas, e vozes humanas de todas as cores e naipes, sempre passo rente a pelotões de citadinos – rapazes e moças bastante jovens – que distribuem panfletos de propaganda. A maioria divulga ofertas de operadoras de crédito – em bom português, operadoras de agiotagem, Quase nunca pego nenhum papel vindo dessas mãos suplicantes. Passo direto, e disparo meu mantra preferido: - Obrigado, querido! Ou – Obrigado querido!

Em certa manhã resolvo aceitar alguns panfletos. Logo no primeiro papel recolhido recebo um ‘obrigada’ tão efusivo e simpático que ganho o dia. Olho para trás. Preciso registrar a dona dessa voz tão gentil e acolhedora. Trata-se de garota de não mais de 16 anos, sardenta, branquela, risonha e franca, que repete ‘obrigada, moço!’.

Volto dia seguinte para reencontrar essa voz risonha e franca que me saúde novamente de maneira tão efusiva. Não a reencontro. Mas vou reencontrá-la. Agradecimentos afáveis e sorridentes, nesta pátria inglória na qual os sabiás já não cantam mais há tempos, são o melhor que há. [Bem a propósito, que São Glauber Rocha proteja o Brasil neste momento de ´kaos’ abissal!]