‘Não tenho rancor do assassino, mas quero justiça’, diz mãe de médico morto

Ela conta que perdoa quem o matou, porém, confia na prisão do responsável pelo crime

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  • Hilza Cordeiro

Publicado em 31 de maio de 2021 às 05:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Reprodução

Mãe do médico Andrade Lopes Santana, 32 anos, Dometila Lopes, 56 anos, disse que perdoa Geraldo Freitas Junior, principal suspeito pela morte do filho, assassinado por quem dizia ser seu amigo, na Bahia. O corpo de Andrade foi achado na sexta (28) amarrado a uma âncora no Rio Jacuípe, em São Gonçalo dos Campos. Ele foi sepultado na manhã de sábado em Araci, cidade baiana onde morava e trabalhava. 

“Não existe outro caminho a não ser perdoar. O que é que eu vou fazer? Se Deus colocou no meu coração para perdoar, eu vou perdoar. O que ele coloca, ninguém tira. Vou fazer o quê? Sei que lá do lado de Jesus, meu filho diria: - perdoa, mãe. Não sinto ódio. Só que não é porque eu perdoei, que ele não vai pagar pelos atos que fez, seja lá o que aconteceu, o que ele for dizer sobre o porquê que fez, não justifica tirar a vida de alguém, principalmente, do meu filho", afirmou  ao CORREIO.   'Ele era louco para ser pai, casar', contou a mãe de Andrade, Dometila Lopes (Foto: Reprodução) Nesse domingo (30), Dometila participou de uma missa. Ela disse ainda que acredita no trabalho da justiça para que Geraldo seja punido.“Me perdoem se eu estou perdoando ele. Mas é a Justiça que deve puni-lo. Ele não vai sair tão cedo da cadeia.  O único caminho é perdoar, se quer ir para o céu. O errado é querer fazer justiça pelas próprias mãos.  Ele tem que ficar vivo para poder sentir a dor por ter tirado  a vida de um filho que era doido para ser pai, que queria casar. Tirou essa chance do meu filho de prosseguir, de viver mais 30, 40, 50 anos, de estar aqui hoje entre nós”. Andrade recebeu ainda uma homenagem na sua terra natal, na tarde desse domingo (30). Nascido na cidade de Brasiléia, no Acre, o médico foi lembrado às 16h (horário local) por amigos e parentes que se reuniram na Praça da Ponte, convocados a vestirem roupa branca e máscaras, para fazer um tributo ao rapaz.

"Eu estou muito feliz em ver o carinho que o povo tinha pelo meu filho e reconhecendo quem ele era. Era um menino muito alegre, prestativo e se ele tivesse vivo e se acontecesse algo com algum dos colegas, ele que estaria fazendo isso. Eu acho que o povo está reconhecendo e isso me conforta. Eu vou ficar em paz e espero a justiça na Terra. A gente não paga justiça com injustiça". Homenagem foi feita por amigos e familiares (Foto: Acervo da família) Graduado em uma faculdade privada da Bolívia, país vizinho ao seu estado natal, Andrade se formou e logo foi indicado por um amigo para trabalhar na Bahia, onde veio morar há cinco anos. 

Uma tia dele contou que, nesse domingo, parte da família que veio à Bahia resolver as questões burocráticas ainda estava retornando para o Acre. A mãe, Dometila, e a irmã dele permanecem aqui no estado para tratar de questões restantes sobre os bens do médico.

Andrade foi aluno da Universidade Técnica Privada Cosmos (Unitepc), na cidade boliviana de Cochabamba, a quarta maior do país. A mãe se esforçou para pagar a mensalidade sem que ele precisasse trabalhar na Bolívia para se manter. A família ainda não sabe se o suspeito do crime, o suposto amigo Geraldo Freitas de Carvalho Junior, 32, estudou com ele na Unitepc. Até então, acredita-se que eles formaram amizade em Feira de Santana. Médico foi homenageado em sua cidade natal, no município de Brasiléia, no Acre (Foto: Acervo da família) Ainda segundo a tia, o médico era muito querido e sempre fazia questão de estar presente nas festinhas e encontros de família. Mesmo já adulto, se manteve brincalhão. A tia disse que, em sua memória, ficam as histórias de infância de Andrade na sua casa de férias. Ela lembra que ele foi uma “criança danada”, que gostava de perturbar primos e primas mais novos. "Se fosse brincar de amigo secreto, ele colocava aranha dentro da caixa de fósforo para assustar todo mundo. Quando chegava na hora de dormir, ele dormia na cama de cima, que era para as primas não se vingarem dele. A gente lembra muito de uma história de quando ele pegou o carro da tia e levou as primas mais novas para brincarem no rio e atolaram o carro na estrada de lama. Ele amava brincar”, recorda ela.O médico estava desaparecido desde 24 de maio e foram feitas campanhas na internet e na imprensa para ajudar a encontrá-lo. O corpo de Andrade foi achado por pescadores na sexta-feira (28) amarrado a uma âncora em um rio em São Gonçalo dos Campos. Amigos fizeram o reconhecimento. Andrade morava no município de Araci e trabalhava em cidades da região, como Tucano, Caldas do Jorro e São Domingos. As investigações apontaram que ele foi até Feira de Santana para resolver alguma pendência no Exército. 

Horas depois de o corpo ser encontrado, o suposto amigo dele, Geraldo Freitas Junior, foi preso acusado pela morte. Ele foi o responsável por prestar queixa do desaparecimento na delegacia, em Feira de Santana. Naquela ocasião, a polícia informou que ambos estudaram medicina juntos na Bolívia e depois vieram trabalhar no interior da Bahia. Segundo a família, o acusado chegou a levar a irmã de Andrade até o local onde o carro da vítima foi encontrado.

O CORREIO teve acesso aos registros policiais do depoimento de Geraldo, que declarou que conhecia Andrade há cinco anos. Segundo ele, o médico acreano gostava de frequentar a cidade de Feira de Santana para sair com amigos. Em 2020, Andrade teria contado a ele que tinha sido ameaçado em virtude de questões políticas na cidade de Araci e que, por esse motivo, queria adquirir uma arma. Ainda conforme o suspeito, Andrade o teria procurado porque sabia que ele era frequentador de clube de tiros.

Depois de algumas conversas, Geraldo então teria convencido Andrade a se inscrever em um desses clubes para ter direito à arma. O suspeito afirmou que vendeu uma pistola Glock G25, calibre .380, para o médico pelo valor de R$ 12 mil. A ida até Feira de Santana na data do desaparecimento teria sido para resolver alguma pendência em relação ao registro do armamento.

Delegado responsável por conduzir as investigações do caso, Roberto Leal afirmou em entrevista ao CORREIO que Geraldo se tornou o principal suspeito do crime por cair em uma série de contradições durante o depoimento.