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Natal dos pobres e abastados

  • Foto do(a) author(a) Nelson Cadena
  • Nelson Cadena

Publicado em 22 de dezembro de 2022 às 05:00

. Crédito: .

Cavalinhos e bonecas eram os presentes de Natal convencionais das crianças do século XIX e início do século XX, suponho eu. Bonecas e cavalinhos aparecem nas gravuras e ilustrações das revistas, no saco do Papai Noel, o nórdico e o americanizado. O cavalinho era um objeto de desejo das crianças baianas; nos relatos das festas populares da elite, Senhor do Bonfim, Santo Antônio da Barra e Nossa Sra. de Santana, no Rio Vermelho, publicados nos jornais, há sempre registros de cavalinhos para entreter os pequenos. Eram cavalinhos de madeira, bem esculpidos, se mexiam, balançavam com o peso da criança.

Os cavalinhos de madeira do saco de Papai Noel eram diferentes. Tipo um pau de vassoura com cabeça de cavalo, caprichada no feltro e no acabamento. Cavalinho para montar, andando quase correndo. Ainda sobre as festas populares, os cavalos de verdade eram presença obrigatória desses eventos, nas corridas de argolinhas. Os anúncios dos jornais da época ofereciam baias para locação, inclusive nas pousadas. Se o cavalo de verdade encantava os adultos, óbvio que o cavalo de mentirinha encantava as crianças.

Já as bonecas de porcelana eram o objeto de desejo das meninas. Imagino que seja o brinquedo mais antigo, mais tradicional, valia para brincar de mamãe. Na época de Natal os adultos se presenteavam entre si com artigos importados e os ricos chegavam a presentear os amigos com um ‘moleque escravizado’, como registrou Mello Moraes Filho. As crianças ganhavam, além das bonecas de porcelana e os cavalinhos, bolas de gude e soldadinhos de chumbo. Dizem que foi a família real que trouxe, em 1808, estes dois últimos itens citados, que logo se popularizaram.

Os pobres não tinham acesso a brinquedos de porcelana, madeira, chumbo, o que seja. Mas um grupo privilegiado de pobres  -  já explico o porquê privilegiado - recebia brinquedos no Natal. Fruto de doações do comércio: as firmas Walter Meister, Westhalen Bach, Casa Manso, A Mod a, Tude Irmãos, Padaria Santo Antônio, dentre outros. Alguns desses brinquedos eram pendurados na grande árvore de Natal, montada na hoje Praça Castro Alves, antes conhecida pelo povo como Praça do Teatro.

Para a criança pobre ganhar brinquedo deveria apresentar cinco cupons publicados nos jornais. A ação de cuponagem tinha o objetivo de vender jornal. Óbvio que criança pobre não lia jornal, nem sabia ler, e não tinha recursos para comprar e nem sabia da promoção. Para adquirir os cinco cupons que lhe garantiam o direito de troca por um brinquedo, tinham que conhecer algum adulto que comprasse jornal. Diante desse quadro, imagino que as crianças pobres eram escolhidas, selecionadas pelas famílias que tinham recursos e influência social.

De boas intenções o inferno está cheio, o céu já vazou, não vamos ser hipócritas, em todo caso, as crianças presenteadas que de fato eram pobres gozavam de um dia de divertimentos, assistiam, inclusive, sessões gratuitas de cinema mudo, no dia 25 de dezembro. A mídia estimulava as boas ações de Natal e promovia os espetáculos de rua que incluíam os Reis Magos e as pastorinhas, elementos que evoluíram para os Ranchos e Ternos das Festas de Reis.

Natal era a oportunidade dos vendedores de rua, afrodescendentes, fazerem um dinheirinho. Vendiam figuras de barro para os presépios natalinos, pão de ló, bolinho inglês, pastelões e outros quitutes. E negros de ganho ofereciam na rua, para os abastados, leitões com o focinho apertado com barbante e marrecos com as asinhas enfeitadas com lacinhos de fita.   

Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às quintas-feiras