gabriel galo

Nem toda opinião deve ser respeitada

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  • Gabriel Galo

Publicado em 6 de abril de 2020 às 10:41

 - Atualizado há um ano

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Um dos maiores mantras da liberdade de expressão é aquele que afirma que “toda opinião deve ser respeitada”. Esta é, entretanto, uma distorção do que significa liberdade de expressar-se, que é a possibilidade de externar abertamente o seu pensamento. O que não significa que o seja falado deva ser aceito ou respeitado.

Estamos vivendo uma época em que, em nome de uma pretensa popularidade, opiniões infundadas são difundidas e analisadas como se válidas. Está neste debate aparentemente amplo o perigo que deturpa a ética do diálogo. Ao equalizar ciência e achismo, a primeira perde relevância, enquanto a segunda eleva-se a um posto que jamais mereceu.

Mas assim é o mundo da pós-verdade, onde fatos são deixados de lado em prol de um discurso que toque à emoção e a crenças pessoais. É não apenas natural que em meio à pandemia, os instintos mais primitivos sejam ativados, que o medo domine o pensamento e dele se extraia o não-raciocínio. Assim, diante da complexidade e da incerteza, volta-se ao que escreveu o americano H. L. Mencken, “para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada.”

Perante a incapacidade de absorver a estrutura lógica de uma ciência que se ancora em metodologias comprobatórias, com variantes e regras demais, porém estritamente factual, reduz-se o campo de visão ao que determina o estômago e experiências prévias, a ouvir-dizer, encaixando narrativas a ideias pré-concebidas que são o expurgo da ignorância.

Ao considerar a reabertura do comércio e querer promover o isolamento vertical, os pressionadores do poder público abandonaram qualquer cunho científico, qualquer medida verificadora de validez, e apelam a uma crença de que brasileiro tudo pode, com fé, ginga e um jeitinho que é só nosso, mestres da gambiarra que somos.

Enquanto o mundo se fecha depois de dispender das mesmas artimanhas narrativas de cá e ter colhido resultados catastróficos, seguimos com a certeza imutável, porque Deus e o jejum hão de prover, porque a temperatura espanta a pandemia que nem vidro blindado, porque o medicamento milagroso haverá de nos salvar, o que são algumas mortes (milhares, dezenas ou centenas de milhares, e daí?) diante da economia? Os outros lá de fora  é que certamente não foram capazes de torcer o suficiente como a gente, brasileiros com muito orgulho e muito amor!

A pluralidade do debate se faz a partir de premissas que buscam o entendimento, partindo de pressupostos da ética do discurso de Habermas e tendo o princípio fundamental de Aristóteles de que não é necessário discutir com alguém que nega os princípios definidos. Assim, não se debate o que nega a ciência, assim como não se aceita ou respeita o que reduz a humanidade alheia nem o que busca impor comportamentos normativos que dizem respeito à esfera meramente pessoal.

A postura de Átila Iamarino no Roda Viva da última segunda-feira seguiu esta linha ao perguntarem sobre o isolamento vertical. Se não é ciência, portanto, não merece atenção, exemplo semelhante ao de Gabriela Prioli na CNN ao ser confrontada por argumentos vazios de lógica, apelando a justamente o faz as famigeradas fake news: mentiras que, ao se pintarem de verdade, são o ralo da civilidade.

O fato é que o esforço de combater a mentira é muito maior que o de criá-la. Não se há, portanto, de propagar a manipulação. De nada adianta expor a ignorância de quem dela se orgulha. O problema é complexo e extrapola a pandemia, ao se utilizarem das táticas do fingimento aqueles com poder.

À pandemia, há, tão somente, uma alternativa comprovadamente eficaz: fique em casa. Ao fingimento da maior plataforma de gaslighting da história do mundo moderno, estão todos tentando entender como romper a barreira da ignorância que não aceita o científico nem o civilizado sem a catástrofe concretizada, buscando fugir do canto da sereia da teoria de Mencken para escapar da solução fácil que nos trouxe ao obscurantismo.