No meio do caminho havia Paolo Rossi

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  • Da Redação

Publicado em 5 de julho de 2022 às 19:20

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Foto: Reginaldo Manente/Jornal da Tarde A Tragédia do Sarriá voa no tempo junto com aquele Canarinho que foi lá na Espanha mostrar o que a gente já sabia. Mostrar que o futebol brasileiro jogava por música, que sambava em campo com a bola no pé e fazia o povo feliz.

O sonho encerrado com a derrota para a Itália, naquele dia 5 de julho de 1982, há exatos 40 anos, foi simbolizado na comovente foto do choro do pequeno torcedor vestido com a camisa da Seleção nas arquibancadas do estádio Sarriá, em Barcelona.

Naquele dia, no sertão baiano, um outro menino, esse de 12 anos, também apaixonado pelo futebol da Seleção de Telê, resolveu que não ia trabalhar na feira para poder ver seus ídolos na telinha.

O problema é que, para isso, teve que dar um baratino em seu ditatorial progenitor, que atendia por um nome que parecia ter sido dado por Dias Gomes a um de seus personagens: João do Ouro. Para ele, futebol não reluzia a ouro, e nem em plena Copa do Mundo seu filho merecia refresco.

Mas o menino endiabrado deu um jeito de se pirulitar para ver a partida, mesmo que as consequências depois fossem dolorosas. Antes não tivesse visto, porque não viveria um trauma que lhe fez derramar as lágrimas que todo o Brasil derramou, as mesmas que ele próprio já tinha chorado um ano e meio antes, quando a Seleção perdeu a final do Mundialito para o Uruguai.

A torcida brasileira chorou em 82 porque aquela derrota era pra ser lamentada, e não para se apontar culpados. Chorou pela identificação com um time que era visto de perto pelo torcedor brasileiro, da beira do campo, em tempos que os jogadores e a Seleção atuavam no país, rodando o Brasil pelos nossos estádios.

A revista World Soccer chegou a publicar que se a Seleção de 82 tivesse ganhado aquela Copa, seria celebrada como melhor do que a de 70. O time jogava um futebol mágico, trocava passes como se estivesse treinando e colecionou jogadas que parecem transcender o esporte e tornar-se pura arte.

“É um gol que resume a filosofia do futebol brasileiro”, disse John Motson, o mais famoso narrador inglês, depois de ver Zico entortar Gentile e tocar para Sócrates dominar com elegância e chutar entre o goleiro Dino Zoff e a trave para marcar o primeiro gol do Brasil contra a Itália naquela tarde de calor escaldante do verão da Espanha.

A Seleção Brasileira de 82 conseguiu algo ainda mais difícil do que ganhar uma Copa do Mundo: entrou para o seletíssimo clube (ao lado da Hungria de 54 e da Holanda de 74) das seleções que encantaram o mundo mas não ganharam a Copa. Toda Copa tem um campeão, mas não se sabe quando aparecerá outra seleção como essas três.

Por mais nobre que seja a honraria, trocaríamos ela para ver Sócrates erguer a taça, Zico ser o artilheiro e Falcão ser eleito o melhor jogador da Copa. Era como as coisas caminhavam até encontrarmos Paolo Rossi.

Carrasco para nós, Rossi era o Bambino d’Oro para os italianos. Um carrasco que não tinha cara de vilão, gostava do futebol brasileiro e se tornou amigo de vários dos nossos jogadores. O Brasil merecia ganhar a Copa, mas a verdade é que a Itália mereceu ganhar aquele jogo. Só uma das duas coisas poderia acontecer, e o título ficou muito bem nas mãos da seleção de Rossi, Antognoni, Graziani, Conti, Scirea e Zoff.

De lá pra cá, o acanhado estádio Sarriá já foi demolido, Paolo Rossi não está mais entre nós e a Itália não venceu mais nenhum jogo contra o Brasil. Aquele menino do sertão baiano agora é um cabeludo e presepeiro escritor cinquentão, frequentador dos insalubres recintos das listas dos livros mais vendidos.

A derrota para a Itália lhe foi tão doída que ele perdeu toda a ternura que sentia pela Seleção e virou até uma espécie de Grinch da Copa do Mundo, que bota tanto gosto ruim a cada quatro anos que despreza até ingresso de presente para assistir um jogo de Copa no estádio.

Em 1994, por exemplo, enquanto o país fazia festa, ele não dava muita bola para a partida final, também contra a Itália, que assistiu no Sindicato dos Bancários. É que sua paixão ludopédica foi toda transferida para o Esporte Clube Vitória.

Dias após a eliminação da Seleção de 82, o poeta Carlos Drummond de Andrade juntou os cacos e, docemente, escreveu que já passávamos da metade do ano e era hora de cuidar da vida.

É que no meio do caminho havia Paolo Rossi, havia Paolo Rossi no meio do caminho…