O carro e as cidades

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  • Waldeck Ornelas

Publicado em 8 de abril de 2021 às 05:19

- Atualizado há um ano

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As grandes transformações pelas quais tem passado a sociedade humana geralmente demoravam muito tempo para acontecerem. Agora é diferente, os avanços tecnológicos e as inovações fazem com que elas ocorram com grande rapidez, literalmente na noite para o dia. É preciso mudar a nossa cabeça, para recepcioná-las com a mesma intensidade.

Um grande exemplo disso é a relação entre o carro e as cidades. O automóvel – que por várias décadas dominou o nosso imaginário – começou por conta própria a sair de cena, mas continua influenciando negativamente a nossa noção de cidade. Sob esse aspecto, o novo futuro já é agora, mal começou e estará consolidado em 5-10 anos, mesmo no Brasil. Vejamos alguns sinais:

O carro será elétrico: a Neoenergia anunciou uma rede de abastecimento de Salvador a Natal; a Volvo, em parceria com a ENEL X e a Estapar, está implantando uma rede de 250 estações de recarga ainda neste trimestre; o E-Garagem está oferecendo franquia para abastecimento de carros elétricos. São várias as iniciativas para facilitar a circulação do veículo elétrico, que começa mais caro e diminuirá o acesso de muitos.   O carro será autônomo: todas as indústrias automobilísticas estão trabalhando nessa direção, com os primeiros resultados já alcançados. Ou se reinventam ou terão que fechar as suas fábricas, como ocorreu com a da Ford em Camaçari.   O carro será compartilhado: assim como as estações de bicicletas, o Itaú lançou o VecItaú, que começa a operar no segundo semestre em São Paulo. Em várias cidades de muitos países o carro compartilhado já está disponível para as pessoas.

O carro individual será demandado por aplicativo: todos já conhecemos o Uber, que permite o pedido de um veículo para transporte. Esse processo vai se aprofundar: logo, logo ele virá sem motorista!

Com todas essas inovações, vai diminuir muito o número de veículos em circulação, desafogando o tráfego, um problema crucial nas nossas cidades, por conta do modelo rodoviarista dos últimos setenta anos.

O Brasil tem o hábito de sempre chegar atrasado: quando Brasília era construída para ser uma moderna capital já os princípios urbanísticos em que se apoiava eram amplamente questionados. Mas ainda hoje as nossas cidades se apoiam naqueles mesmos princípios. Agora, no mínimo, é imperioso romper com o domínio do automóvel: túneis, viadutos, elevados, só se justificam quando parte indispensável de um projeto de transporte público.

O novo ideal é morar, trabalhar, consumir e distrair-se em um mesmo bairro, onde a mescla de usos e de edificações trazem o dinamismo e a vitalidade das ruas. Daí que grandes metrópoles, como Paris, estão buscando transformar-se em “cidade de 15 minutos”, onde as pessoas possam atender às suas demandas em um pequeno espaço territorial, dispensando os grandes deslocamentos.

Neste momento, a pandemia causada pelo coronavírus tem feito com que os prefeitos das grandes cidades, mesmo no Brasil, busquem resolver a crise do transporte com medidas de escalonamento das atividades. Com isto, pelo motivo errado estão chegando à solução certa: reduzir os picos de transporte nas cidades. Isto vai se refletir também na redução do fluxo de carros de passeio, mas é pouco em relação ao automóvel. Impõe-se criar restrições ao veículo individual como meio de transporte. Em contraposição ao modelo rodoviarista, o cardápio das novas soluções inclui transporte público moderno, rápido e eficiente.

Paralelamente, é preciso implementar os benefícios urbanísticos da cidade compacta, estimulando a mobilidade ativa – a pé e de bicicleta – e transformando as cidades: é indispensável aproximar moradia, trabalho, consumo e lazer.  

Waldeck Ornélas, especialista em planejamento urbano-regional, é autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.