O centro da Cidade? 

Por Aninha Franco

  • D
  • Da Redação

Publicado em 12 de maio de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Li um texto escandaloso — aliás, que homem escandaloso!!! – de Milton Santos no livro “Pelo Pelô” (Edufba, 1995), organizado por Marco Gomes, e me perguntei em que lugar está o Centro de Salvador hoje, tema da tese de mestrado de Milton, “O Centro da Cidade do Salvador”, publicado em 1959. Em que Centro está o centro da primeira capital do Brasil que está tão descentrada? 

Uma cidade precisa ter seu Zocalo, sua Praça Maior, sua Ágora. Precisa ter a cabeça que lhe pense, ainda que tenha nascido com duas cabeças, como a cobra, com veneno, a cabeça da Praça Tomé de Souza com o poder militar de Tomé de Souza, palácio, prisão, alfândega. E a cabeça do Terreiro de Jesus na Escola, no Centro Educativo da Companhia de Jesus, controlando e adestrando o pensamento brasileiro em formação, com os Jesuítas aos quais o governador Mém de Sá devotava obediência absoluta e não fazia nada sem consulta e aprovação. 

Em 1760, os jesuítas saíram do Brasil porque o Marquês de Pombal, o português poderoso do momento, pretendeu modernizar as colônias do Reino sem suas companhias, que prepararam centenas de gerações brasileiras para a felicidade e o prazer no outro mundo, depois da libertação do corpo. Com isso, a Colônia não se tornou laica porque a Igreja Católica é quase invencível e estava instalada na Bahia com centenas de ordens, mas a Praça Tomé de Souza fortaleceu-se com a expulsão dos melhores pensadores da Igreja, os jesuítas, que voltaram ao poder através de Francisco, o papa hippie que está aí, mostrando o Vaticano comandado por um humano infalível que tem dúvidas e fez o voto de pobreza. Pensar é fazer a coisa no momento que a coisa precisa!

Até os anos 1970 nada alterou a força da primeira Ágora, do primeiro Zocalo, do Centro inicial alterado — que ironia!!! — por um shopping, uma casa de passagem criada pelos franceses e multiplicada pelos estadunidenses, o Shopping Iguatemi instalado em 1975 numa região distante do Centro original, que se mudou para o seu novo Zocalo aos poucos, os escritórios comerciais e jurídicos, a vida financeira, o centro administrativo espalhados nos arredores do novo bairro, nomeado Iguatemi como o Shopping. 

Enquanto viveu, ACM concentrou todos os centros da cidade e todos os seus poderes em si, às vezes despachando pelos três. Depois dele, o Centro, a Ágora, o Zocalo se multiplicou como Smith em Matrix.  

Defronte do Shopping Iguatemi que perdeu o nome que nomeou o bairro, existe um templo da Igreja Universal do Reino de Deus. É lá a Ágora da Cidade da Baía? Está lá o poder do sucessor de Tomé de Souza, Rui Costa? Está no Iguatemi, no Palácio de Ondina ou no Centro Administrativo? E a Praça Thomé de Souza onde está o Palácio do Prefeito e a Câmara de Vereadores que durante a colônia era tão poderosa com seus Homens Bons e Honestos decidindo todas as questões, da exportação de açúcar à liberação de água ardente aos escravizados? Se Milton Santos estivesse vivo, e retomasse sua tese sobre o Centro da Cidade da Baía que, atualmente, tem tantos centros que centro avistaria? Curiosa!