O corno feliz

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  • Nelson Cadena

Publicado em 17 de março de 2022 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Vão desculpando a redundância do título. Ainda não conheço um corno triste, no máximo amuado, revoltado, nada a ver com o sentimento de tristeza. Todo corno é feliz, ou está a caminho de ser, é questão de tempo e de ajustar os hormônios e a adrenalina e de admitir para si próprio que tomar corno é merecimento.

Todo corno é feliz. É infeliz quando não sabe que tomou corno, apenas supõe, ou não lhe contaram ainda. O estágio de felicidade do corno começa tempinho depois que ele descobre; o chifre é imaginário, mas a ciência já aferiu que corno que se respeita sente aquela coceirinha na testa. Se descobre feliz, se não na hora, logo que o sentimento de revolta passar, quando encara como oportunidade.

É a chance de se livrar de quem não lhe respeitou, um bom motivo para arrumar as trouxas e seguir adiante. E lá, algum tempo decorrido, rir sozinho, valeu a pena! É feliz, também, se o corno é recíproco, pois é a oportunidade de legalizar, caso queira, seu outro relacionamento, e se não é de seu interesse, tudo bem, pelo menos não precisa esconder. Tem parceiros e parceiras que topam o papel de corno, por alguma conveniência social, ou por desamor próprio. Vá entender!

Dor de corno, de todas as dores, é a de menor padecimento. É passageira. E é a única dor que dá para incrementar tomando umas, ouvindo velhos boleros tristes, rancheiras mexicanas, arrochas de sofrência, ou a música brega de raiz. Agradeça a Deus que inventou Waldick Soriano e Reginaldo Rossi. A vantagem é que o choro você encara como dessalinizar o corpo. E nas redes sociais você finge ânimo e posta frases para afirmar a sua estima, reza o mantra que é melhor ficar sozinho do que mal acompanhado, posta isso e repete eu me amo e outros clichês de amor-próprio, da internet, que se não lhe alivia a dor passageira pelo menos lhe alivia o rigor do juízo dos enxeridos.

Ser corno não é tão desconfortável quanto parece. Tem seus atrativos. Suas compensações. Dia das Mães você comemora uma vez, Dia dos Pais você comemora uma vez, Dia dos Namorados você comemora uma vez, já o Dia dos Cornos você comemora duas vezes ao ano, 25 de abril e 25 de novembro. Duas chances de celebrar. E há quem promove festa caprichada, a Câmara Municipal de Lauro de Freitas, por exemplo. Não estou inventando, tem vídeo no Youtube, os cornos todos fazendo profissão de fé, num baita café da manhã cornudo. Como não ser feliz com essas e outras oportunidades de celebrar?

Foi-se o tempo em que o corno escondia a sua condição. Hoje o corno tem tanto prestígio que a busca pela palavra no google nos revela 386 milhões de resultados e até inventaram uma tal Oração do Corno, uma pérola do sentimento profundo do chamado corno manso: “Deus me livre de ser corno/Mas, se eu for, tomara que nunca desconfie/Mas, se eu desconfiar/Tomara que eu nunca tenha certeza/Mas se eu tiver certeza/Tomara que eu nunca sinta/Se eu sentir, tomara que eu nunca saiba/Se eu souber, tomara que eu nunca acredite/Mas se eu acreditar, tomara que eu nunca veja/Mas se eu ver, meu Deus/Tomara que eu nunca reaja/Que é para não magoar/Os sentimentos daquela mulher que eu tanto amo”.

A felicidade do Corno é saber que, uma vez vacinado, pode experimentar de novo, tantas vezes quanto merecer e seguir adiante sem machucar o chifre.

Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às quintas-feiras