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Da Redação
Publicado em 22 de junho de 2019 às 05:00
- Atualizado há um ano
Estou sentado numa mesa na calçada da Rua da Estrela, Centro Histórico de São Luís. O suco de bacuri, denso e bem gelado, tem seu valor, mas o negócio fica bem melhor adicionando dois dedos de Tiquira.
Na noite anterior, o grupo Boi de Maracanã coloriu essa e outras ruas. Havia muita, muita gente. Agora está tudo mais calmo. Um cara passa vendendo castanha, turistas escolhem o que almoçar, uns tantos tiram selfies com a decoração junina ao fundo e, de algum dos bares do entorno, surge um reggae bem cadenciado, bom pra essa hora do dia.
Descalços, só de short, dois garotos, coisa de 9 ou 10 anos, pisam sobre o paralelepípedo como se não fosse nada. Ali mesmo, onde passou e vai passar o bumba meu boi, eles brincam com uma bola que há algum tempo deixou de ser bola.
Golzinho individual, com a lixeira de aço no papel de uma trave. A outra é constituída por uma torre de três paralelepípedos, matéria concreta que, na fluidez da infância, vira campo e ao mesmo tempo baliza.
Não tem tática, é mano a mano o tempo todo, um contra um, marcação cerrada. Até que o mais alto acha uma saída. Tabela com o meio-fio e pega a bola do outro lado - mesclando 1-2 com drible da vaca -, sai sozinho na cara do gol e rola a ex-bola entre a lixeira e as pedras. Tomo um susto quando, aqui sentado, ouço ele narrar: “Gooool! De Maaarta!”.
Acho que a Tiquira agora bateu, só que logo percebo mais dois na mesa também rindo da propagada autoria. Foi aquilo mesmo, um sinal dos tempos. E um bom lembrete de que já vai começar Brasil e Itália. Onde assistir?
O diretor paulista sugere o telão montado na Rua Portugal, onde a atmosfera faz jus ao momento, com bandeirolas dançando e centenas de pessoas reunidas para ver a Seleção Brasileira. Problema é achar onde sentar.
Nossa sorte é a diretora de arte maranhense, que nos guia a outro local. Entramos num beco, subimos uma via estreita e chegamos a um casarão antigo, com parte da fachada em azulejo colonial.
Uma longa escada de madeira leva ao segundo pavimento, onde se misturam grafites, esculturas, cartazes de cinema, gravuras e livros, muitos livros. É a Resistência Cultural Upaon-Açu, ou Re(o)cupa, uma ocupação permanente que recuperou um imóvel largado, dando-lhe vida através da arte. E que, pra completar, ainda projeta a Seleção feminina na parede de uma sala ampla. É quase um cinema.
Espero que você tenha visto o jogo, porque o Brasil jogou bem, especialmente no segundo tempo. E, quando a juíza marcou aquele pênalti meio mandrake pra gente – com VAR e tudo -, o que presenciei foi uma ocupação lotada, porém silenciosa, aflita, com a expectativa em suspensão até Marta tirar a goleira italiana da foto. Aí teve berro, abraços e grito na janela, afinal, é Copa do Mundo.
E com essa Copa, seja lá qual for o resultado, a Seleção feminina entrou efetivamente no nosso calendário e no nosso imaginário. Não podemos deixar que saia.
Assim teremos sempre gols de Marta, Cristiane, Formiga, Andressinha e por aí vai. Nos campos ou fora deles. O que é um ótimo sinal dos tempos.