O que só os ingênuos não viram

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  • Da Redação

Publicado em 11 de maio de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Corria o ano de 2017, mês de março, quando este mesmo canto de página (ou este mesmo link, caro leitor ou bela leitora virtual), exibiu exatamente o título acima.

Sei que autocitação é uma das coisas mais cretinas que existem, mas agora, neste 2019 um tanto atropelado, permita-me a cabotinagem de batizar um novo texto com o título de outrora, simplesmente porque não tenho ideia melhor.

Naquele fatídico março de 2017, o Barcelona havia tomado um sapeca do PSG em Paris e, ingênuo que sou (era), resolvi me meter numa reunião de serviço exatamente no horário do jogo de volta, quando o Barça foi pra cima e, evocando tudo que não se pode explicar, deu forma à impensável virada.

Chegou maio de 2019 e lá estava o Barcelona de novo, só que dessa vez no papel oposto: sacudindo o Liverpool na primeira partida. Vamos ser sinceros? Pouca gente acreditava na reviravolta.

Mas entre não acreditar e de novo ser o abestalhado que só vê a história pelo replay, alguma coisa eu devo ter aprendido.

“Visita técnica terça de tarde”, a chefe Liliu sugeriu. “Perainda, quinta é melhor. Terça e quarta tá barril”, tangenciei. E então, ao menos dessa vez, consegui ver aquilo que só os ingênuos não viram.

Ingênuos como Rodrigo, que mal foi morar em São Paulo e já tá dando vacilo. A épica peleja ia pelos 3x0 quando ele apareceu no grupo de amigos com um “Tá de sacanagem. Nem quis ver porque achei que eram favas contadas!”. Juvenil. Pelo menos deu tempo de ver o quarto gol, que entrou pra história antes mesmo de entrar na súmula.

E deu tempo de ver a catarse do mosaico humano cantando em uníssono que aquele time nunca andará sozinho, fazendo despertar os fantasmas, revirando memórias de conquistas e tragédias, correndo o mundo através de mensagens e notícias para avisar aos ingênuos de tudo que é canto que eles precisavam ver imediatamente o que só eles não viram.  

São jogos como este (e como o do dia seguinte) que fazem do futebol uma engrenagem motocontínua para sustentar paixões. Porque aprendemos desde a infância que, neste jogo, é possível alimentar sempre a esperança de vencer, sem necessariamente ser o mais alto, o mais forte, o mais rico ou o melhor do mundo.

O futebol é o que é porque, numa escala bem superior a outras modalidades, permite a ruptura da lógica, que é quando entram em campo os mitos, as alegorias e tudo o mais que não se pode apontar num quadro tático.

São episódios em que o jogo deixa a dimensão palpável, cartesiana, e salta no abismo da epifania, como no gol que deu a classificação ao Liverpool.

Este mesmo Liverpool que, há muitos anos, começou a ser o gigante que é pelas mãos do treinador Bill Shankly, dono de uma dessas frases que volta e meia ecoam por aí. Foi ele quem disse: “Algumas pessoas acreditam que futebol é questão de vida ou morte. Fico muito decepcionado com essa atitude. Posso assegurar que futebol é muito mais que isso”.  

Pois é. É o tipo de coisa que só os ingênuos não veem.

Victor Uchôa é jornalista e escreve aos sábados