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O Rio já teve mais lâmpadas do que Paris, a Cidade Luz


 

Novo livro de Ruy Castro, Metrópole à Beira-Mar, que biografa o Rio de Janeiro, revela aspectos de pioneirsmo da capital fluminense

  • Fernanda Santana

Publicado em 15/03/2020 às 05:50:00
Atualizado em 20/04/2023 às 23:16:07
. Crédito: divulgação

Numa visita ao Rio de Janeiro, na década de 1920, Albert Einstein experimentou vatapá com pimenta. A cidade que conheceu em 1925 foi a mesma por onde circulavam outros cientistas, como Marie Curie, e personalidades. Do Rio dos anos 20, saíram também o primeiro cantor famoso, Chico Alves, o primeiro torcedor de futebol, e outros tantos primeiros. Em pouco mais de 400 páginas do livro Metrópole à beira-mar, o escritor Ruy Castro se dedica a contar essa terra de primeiros num dos períodos de maior efervescência do local.

A cidade com mais lâmpadas elétricas que Paris inicia os anos 20 depois de sobreviver à Gripe Espanhola. Depois de 15 mil mortes, a nova década é abordada como uma ode aos novos tempos. Nasceu depois de um dos maiores carnavais da cidade, o de 1919, e atravessou os anos com o vigor de fatos e personagens que entrariam para a história do Brasil – contada, pela primeira vez, fora do ponto de vista de São Paulo, na opinião do autor.

“O que aconteceu no Rio dos anos 20 foi um tsunami e influenciou todo o Brasil. O Rio era a metrópole, a única cidade brasileira com mais de 1 milhão de habitantes. Recebia gente do Brasil inteiro e era normal que as coisas acontecessem aqui primeiro”, disse, em entrevista ao CORREIO.

Foram quatro anos de pesquisas a boa parte do que foi impresso no período para que Ruy Castro entregasse ao leitor uma biografia do Rio moderno. É possível acompanhar desde o momento da abertura das primeiras avenidas até a construção de monumentos como o Cristo Redentor, em 1922, e visitas marcantes.

Descobrindo personagens - A descoberta de um novo Rio de Janeiro vem acompanhada da descoberta de personagens desconhecidos do grande público. Os nomes apresentados são acompanhados das suas respectivas histórias e, assim, conhecemos figuras como a cantora lírica Bidu Sayão, a repórter e diretora de teatro Eugênia Álvaro Moreyra e Ismael Nery.

Conhecer o Rio contado por Ruy é, portanto, uma oportunidade de conhecer personagens importantes, mas, até então, desconhecidos.  

“Não os escolhi [os personagens], eles se escolheram. À medida que fui, digamos, desbravando o Rio de 1920-1930, eles foram aparecendo com naturalidade. Eram famosíssimos na época, e, se ficaram esquecidos do grande público de hoje, que pena para o grande público [risos]”, contou Ruy.

Os personagens são trazidos à luz em suas qualidades e defeitos. O escritor Lima Barreto é apresentado como homófobico e xenófobo com evidências e depoimentos que reforçam os rótulos. Os personagens têm  suas histórias entrelaçadas e o escritor os aproveita, também,  para contar como estava organizada a sociedade da época.  

Epicentro - As letras e uma nova forma de viver certamente merecem destaque na obra de Ruy. Os jornalistas e escritores compõem boa parte dos personagens de ‘Metrópole à beira mar’. É na década de 20, como sugere Ruy, que surge a própria instituição do repórter, o jornalista que ia para a rua e voltava com a notícia. O primeiro teria sido Ernesto Senna, do Jornal do Comércio.

Era época de bonança para os jornais, que chegavam a veicular mais de uma tiragem pro dia e tinham até críticos carnavalescos. É quando surgem jornalistas como João do Rio e Irineu Marinho, fundador do Jornal O Globo e pai de Roberto Marinho, proprietário do grupo Globo. Os escritores também viviam seu epicentro. Só no Rio, existiam 40 livrarias para todos os gostos.

“Em 1920, o mundo era dos jornais. Eles não pagavam impostos e podiam rodar várias edições por dia”, resumiu Ruy. Todos os temas, do jornalismo à música, são tratados para construir a imagem de um Rio de Janeiro ao mesmo tempo encantador e excludente, onde até os menos abastados tinham pianoe as favelas eram rasgadas nos morros. A saga dos anos modernos segue até às portas da Revolução de 30, com a conclusão de que o Rio "tocara o Brasil para frente". Até os dias da batalha, Ruy Castro consegue traçar um panorama de um Rio de Janeiro que revolucionou os padrões existentes.