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Amanda Palma
Publicado em 27 de julho de 2017 às 11:07
- Atualizado há 2 anos
Casar, fazer um testamento, habilitar uma união estável, registrar um imóvel, obter cidadania brasileira definitiva e até mover um processo estão mais caros na Bahia. O aumento das taxa judiciária adotada pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-BA), que em alguns casos passa de 100%, fez a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF).Foto: Evandro Veiga/Arquivo CORREIOA alteração nos valores, aprovada no ano passado, entrou em vigor em março e os efeitos já começam a aparecer para quem precisa acionar a Justiça para tentar resolver algum problema ou fazer um procedimento mais simples.>
Entre os serviços afetados pelo aumento estão causas em geral (processos) e outros relacionados à área penal e dos setores de imóveis e cível, como fornecimento de certidões negativas ou positivas, escritura de testamento e revogação ou aprovação dele. Os novos custos valem para qualquer serviço da Justiça comum, incluindo cartórios privatizados da esfera estadual. Além dos cartórios, “entrar na Justiça” ficou mais caro.>
DiferençasUma certidão negativa, que custava R$ 14,04, foi para R$ 15,30. Uma habilitação de casamento ou de conversão da união estável em casamento, que custava R$ 159,47, subiu para R$ 173,82. Já um desarquivamento saiu R$ 38,90 para R$ 42,40.No entanto, o maior reajuste de valores foi da taxa para “causas em geral” - aquelas movidas na Justiça, diferente dos serviços em cartórios. Isso porque, além de as taxas terem subido, houve redução na quantidade de faixas de valor - eram 16 e agora são 12 - o que também provocou mudança nos valores de cada uma.Acesso mais difícilSegundo o conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Bahia (OAB-BA) Oscar Mendonça, o reajuste realizado pelo TJ-BA fere a Constituição porque não altera a qualidade dos serviços oferecidos e dificulta o acesso à Justiça. Ele disse também que essa é a primeira vez que a OAB questiona os reajustes dos serviços do Tribunal de Justiça.>
“Nas 11 primeiras faixas, houve uma majoração que gravitou entre 9% e 33%, o que é bastante significativo. Da 12ª faixa em diante, ou seja, até a 16ª, houve aumento de 176% na comparação com o ano anterior. Isso é um absurdo”, explica. O reajuste foi divulgado em janeiro e passou a valer a partir de março. >
Antes, as causas com valor de até R$ 1 milhão tinham taxas fixas de R$ 9.084,78. Agora, a partir da nova tabela, a última faixa tem valor máximo de R$ 198 mil, com taxa fixa de R$ 4.950. Com valores acima deste, a taxa custará 2,5% do valor da causa. Antes, a faixa até R$ 198 mil tinha uma taxa fixa de R$ 3.721,24.>
InflaçãoEm nota, o Tribunal de Justiça da Bahia informou que o estudo de composição da nova tabela levou em consideração alguns pontos, entre eles, “precificação dos novos itens criados nas tabelas com taxas justas para os usuários e as serventias” e a atualização dos itens vigentes pelo índice da inflação acumulado até a vigência da tabela, estimado em 9%.>
Desses 9%, 6,5% correspondem à inflação e 1,5% para dar conta da entrada da Procuradoria-Geral do Estado (PGE) na divisão da arrecadação. Além da PGE, também participam a Defensoria Pública e o Fundo do Aparelhamento Judiciário.>
O TJ disse ainda que, “no âmbito judicial, a tabela ganha nova metodologia de cobrança, seguindo a tendência nacional, possibilitando que litigantes com causas de menores valores sejam menos onerados, corrigindo o efeito regressivo da incidência das taxas sobre as ações. Além disso, já fora previsto na nova sistemática, o efeito do Novo Código de Processo Civil que entrou em vigor em 18 de março deste ano”.>
Alternativas De acordo com o advogado Felippe Cardozo, sócio do escritório BCM Advogados, agora se procura alternativas para resolver os problemas sem precisar acionar o Judiciário. “A gente não consegue entrar com ações judiciais por causa do volume das custas. A gente tenta, na verdade, que as custas sejam pagas ao fim, porque o Judiciário não prescinde dessa arrecadação pra chegar ao seu objetivo”, explica.>
Como alternativas, o advogado cita a arbitragem e a autocomposição, que são modos de mediar conflitos de uma maneira mais simples, sem precisar acionar a Justiça. “Houve um aumento do número de processos de inadimplência e indenizatórios e a gente não consegue resolver esses processos. Se paga uma taxa alta e o processo se arrasta por um ano”, exemplifica.>
Já o advogado Sérgio Gustavo Carvalho aponta que pode haver uma banalização dos pedidos de gratuidade dos serviços. >
Para OAB, aumento faz cidadão desistir de açõesNo dia 2 de junho deste ano, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) a fim de tentar barrar o aumento das taxas judiciais praticadas pelo Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) e aplicar a tabela anterior “em razão de ofensa aos dispositivos constitucionais”.Segundo o conselheiro Oscar Mendonça, da OAB-BA, o processo está na fase em que aguarda um posicionamento do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Na ação, a OAB alega que as taxas em vigor desde março deste ano são excessivas.“Os limites e percentuais fixos na lei (reajuste aprovado) se mostram excessivos e comprometem o direito sagrado de acesso à Justiça, que é um dos princípios básicos de um estado democrático de direito, porque o cidadão termina por desistir de acionar a Justiça por conta das altas taxas que precisa pagar para ter esse atendimento”, afirma o conselheiro Oscar Mendonça.Ainda de acordo com ele, não há justificativa para se elevar tanto as taxas. “A taxa é contraprestacional, ou seja, diferente do imposto que não tem ligação com o serviço prestado, na taxa é preciso que haja contraprestação, com equivalência. Não se pode arrecadar mais e deixar o mesmo serviço. É preciso justificar o aumento. Nesse caso, houve um desvio de finalidade”, completa.De acordo com o STF, o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo, determinou a adoção do rito do Artigo 12 da Lei 9.868/1999, para que a ação seja julgada diretamente no mérito, sem prévia análise do pedido de liminar.O ministro determinou que sejam solicitadas informações ao governador do estado, Rui Costa (PT), e à Assembleia Legislativa da Bahia (Alba), responsáveis pela elaboração dos dispositivos questionados. Em seguida, os autos serão remetidos à advogada-geral da União e ao procurador-geral da República, sucessivamente, para manifestação sobre o caso.O CORREIO procurou o governador do estado, por meio de assessoria de comunicação, mas não obteve retorno sobre o recebimento dos questionamentos do STF até o fechamento desta edição. A Assembleia Legislativa da Bahia também foi procurada, mas está em recesso parlamentar.>