Obras Sociais de Irmã Dulce inauguram Centro de Pesquisa em câncer nesta sexta (12)

Pacientes adultos e que tenham tumores sólidos poderão se candidatar a tratamento

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  • Da Redação

Publicado em 12 de agosto de 2022 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Ana Albuquerque/CORREIO

Pacientes com câncer terão um novo espaço para tratamento especializado e gratuito a partir desta sexta-feira (10), quando será inaugurado o Centro de Pesquisa Oncológica das Obras Sociais Irmã Dulce (Osid). Primeiro desse tipo totalmente voltado para pessoas atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), em Salvador, o centro fica localizado no terreno do antigo abrigo de idosos, Dom Pedro II, na Cidade Baixa. Quando a pesquisa clínica começar, os pacientes que atenderem aos critérios de pesquisa poderão testar tratamentos em primeira mão, sendo acompanhados de perto por uma equipe especializada. 

Um dos objetivos do centro de pesquisa das Osid é testar novos tratamentos em pacientes reais. Para isso, as indústrias farmacêuticas que desenvolvem novas drogas contra o câncer fazem parcerias com o centro e a partir daí um protocolo é desenvolvido e os pacientes são submetidos aos procedimentos.

Nesta quinta-feira (10), a reportagem conheceu o novo espaço e conversou com as pesquisadoras que fazem parte da equipe. A expectativa é que até o final do ano, entre seis e 10 protocolos de tratamento já estejam em desenvolvimento na unidade. O centro de pesquisa ampliará o acesso de pacientes do SUS ao que há de mais novo nos estudos contra o câncer, mas também será aberto ao público em geral, como explica a médica oncologista e diretora do centro, Lívia Andrade, que trabalha desde 2003 na área.  

“A ideia é a gente poder ajudar o máximo de pacientes possível. É claro que o uso [dos medicamentos, quando lançados no mercado] não será exclusivo dos pacientes do SUS, mas acredito que a maior parte deles será do serviço público de saúde, porque a restrição de acesso a tratamentos para esse público é maior”, afirma a especialista. 

Como as Osid já possuem uma unidade de alta complexidade em oncologia que atende pacientes diversos, os que se encaixarem no perfil do tratamento experimental poderão ser encaminhados para as pesquisas clínicas. 

Pacientes adultos 

Para se encaixar no perfil de paciente que será atendido no centro de pesquisa, é preciso ser adulto e os tumores devem ser sólidos. A coordenadora do centro, Tiana Carvalho, explica que esses tumores são os palpáveis: “Tumores sólidos são aqueles que atingem órgãos, como próstata, mama, cabeça e pescoço, pulmão…Já os tumores líquidos estão relacionados ao sangue, como linfomas e leucemias”. 

Ainda não é possível saber quais tipos de câncer poderão ser submetidos aos tratamentos desenvolvidos, uma vez que nenhum protocolo foi iniciado ainda. Mas a médica Lívia Andrade explica que tumores de mama e próstata devem constar porque já são pesquisados amplamente em diversos países. “Devemos trabalhar com protocolos internacionais patrocinados por indústrias farmacêuticas e que são submetidos em todo o mundo”, diz. 

O foco do centro deverá ser a imunoterapia, tratamento dirigido que visa combater o câncer através da ativação do próprio sistema imunológico do paciente. “Na oncologia, nós utilizamos drogas as mais diferenciadas e modernas e aí entra a imunoterapia, que tenta estimular o próprio sistema imunológico. A terapia convencional faz o trabalho dela, mas infelizmente acaba lesando células sadias também”, explica a oncologista Lívia Andrade.

A inauguração ocorre em um momento de crise para as Osid e instituições filantrópicas em todo o país. A entidade baiana, que atende anualmente cerca de 2,9 milhões de pessoas, acumula um déficit de recursos da ordem de R$ 30 milhões.

“Trabalho há muitos anos aqui e esta é uma crise que eu nunca havia presenciado. Conseguir inaugurar, logo neste momento de dificuldade, esse Centro de Pesquisa que terá um impacto tão importante na vida dos pacientes, dá um gostinho de vitória até maior do que se fosse em outros tempos. A instituição precisava desse acalento para revirgorarmos nossas energias e seguir adiante”, afirma Lívia Andrade.

Dose de esperança

Maria José Carneiro, 51, é paciente das Obras Sociais Irmã Dulce, mas quando participou de uma pesquisa clínica teve que ser encaminhada para outra unidade de saúde, já que a Osid ainda não contava com o Centro de Pesquisa. Sua batalha contra o câncer começou ainda em 2013, quando descobriu um câncer de mama. Mesmo realizando quimio e radioterapia, a paciente precisou retirar uma das mamas na cirurgia de mastectomia. 

Poucos anos depois, já em 2018, dores insuportáveis no corpo fizeram com que Maria José, que nunca teve plano de saúde, procurasse novamente cuidados médicos. Depois de realizar exames, veio a descoberta de um câncer nos ossos em estado de metástase. “Eu me apavorei, achei que era o fim de tudo, foi uma experiência terrível que eu não desejo para ninguém”, relembra. 

A paciente foi encaminhada para uma pesquisa que estava sendo desenvolvida do Hospital Santa Izabel na época, onde recebeu o tratamento durante três anos. O câncer parou de progredir e as dores felizmente cessaram. “Eu fiz o acompanhamento e costumo dizer que essa pesquisa foi a segunda chance de vida que Deus me deu”, afirma. Em geral, os pacientes são indicados para estudos clínicos por indicação dos próprios médicos. 

Um dos lados positivos da pesquisa, além do acesso a tratamentos diferenciados, é que os pacientes passarão a ser acompanhados de perto pelos especialistas e utilizarão os serviços das Obras Sociais Irmã Dulce. “Essa é uma grande chance para os pacientes oncológicos porque o protocolo envolve todo o tratamento e não só a medicação diferenciada. Todos os exames necessários e cuidados caso ocorram eventos adversos são fornecidos pela pesquisa clínica”, explica Lívia Andrade.

O cenário mais esperado pela equipe é que os tratamentos tenham resultados positivos e que medicamentos possam ser disponibilizados ao público em geral, mas para isso um longo caminho ainda precisa ser traçado. “Os protocolos demoram, no mínimo, dois anos, que é um tempo necessário para que se estimule o sistema imunológico. Mas normalmente o paciente continua no tratamento enquanto estiver tendo benefício, o que pode levar até dez anos ou mais”, explica a enfermeira Tiana Carvalho.  

A oncologista Lívia Andrade lembra que como há muita burocracia no Brasil, é possível que pacientes SUS ajudem a testar medicamentos que comprovadamente tenham efeitos positivos contra o câncer, mas que antes deles estarem disponíveis no próprio sistema único de saúde, sejam disponibilizados na rede privada. 

“Demora cerca de três a cinco anos para demonstrar que uma medicação é eficaz , aí sim ela é posta no mercado para ser distribuída. A grande vantagem da pesquisa é que o paciente terá acesso a isso antes. Mas isso é sempre um desafio para o SUS porque essas drogas novas não são imediatamente incorporadas na rede”, explica. “Mesmo que o profissional tenha todo esse trabalho de comprovar a eficácia, não vai ver o tratamento sendo aplicado na maior parte dos pacientes tão cedo”, complementa. 

Mas nem sempre é assim. Enquanto todo o mundo buscava e fazia testes com vacinas contra a covid-19 no início da pandemia, a Osid conduziu o estudo da vacina Pfizer, que, quando devidamente aprovada pelos órgãos sanitários, foi largamente distribuída ao público. “A história da pesquisa na Osid é longa, temos centros de pesquisa aqui há muitos anos. Inclusive fizemos parte do protocolo de vacina da Pfizer que teve muito êxito e ajudou muitas pessoas”, diz Lívia Andrade.

*Com a orientação da subchefe de reportagem Monique Lôbo.