Os normais são homens de bom senso

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  • Paulo Leandro

Publicado em 24 de junho de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

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 Ah, o bom senso, quem o teria criado? Há algum parentesco com dona Sophrosine, mãe da temperança, da moderação, do cuidado de si e do outro? O correto, o equilibrado, o meio-termo, o bem-pesado no fiel da balança, aquilo a que precisamos recorrer pois serve de referência para as escolhas da vida...

Todos nós conhecemos, pelo menos alguém, uma pessoa, com este perfil do meu primo zé. Você pode escutar aqui para confirmar se há algum destes ajuizados no seu cotidiano, dizendo-lhe a melhor escolha, entre o anjinho e o diabinho argumentando nos ombros: hhttps://www.youtube.com/watch?v=8cx0qzrAsMU

Dizem que propositalmente o pessoal do Camisa teria elevado o som no momento da gravação deste compacto aí acima, esperado por alguns anormais da Dendelândia, graças à grande audiência de Marcelo Nova, na Aratu FM, às 10 da noite de toda sexta-feira antes de inventarem o subgênero asé. Paravam ruas inteiras para o pessoal apreciar as novidades ainda do tempo do elepê importado por Nova (lembro bem da noite de Nina Hagen: https://www.youtube.com/watch?v=KBvUmL-YagI)

Fato ou mentira, o certo é a presença do homem de bom senso, o meu primo zé, aquele atual defensor da volta à vida dita normal, cujo tédio já a reprovaria, concedendo a uma vida ‘anormal’ uma justa oportunidade.

A coluna é de fútil-ball, bem lembrado, amigo editor, logo, vamos pensar em como seria divertido um campeonato anormal, com os jogadores mantendo a distância de dois metros determinada pela Organização Mundial de Saúde.

Teríamos lances incomuns, nos quais os atacantes partem para cima dos zagueiros em desesperada fuga, pois ninguém quer misturar saliva para depois ganhar o bicho pela vitória e deixar com a viúva uma ajuda para custear a internação hospitalar e o funeral de saco "prástico".

Quem viveu os tempos olimpianos sabe o quanto repudiávamos o mascarado. Era aquele tipinho que catava um, dois, três, mas depois passava curto, a metro e meio, sem verticalizar, como dizem hoje. Improdutivo era esse zorro. Mas, como jogar bola hoje sem a nojenta da máscara?

Os homens do bom senso mais graduados poderiam, pois bem, propor-se a substituir os atletas por suas gordas panças, bem nutridas em transações envolvendo os próprios atletas, em rodízios de três meses: jogador de 23 ou 24 anos hoje tem 20 clubes no currículo, quem ganha com tanta movimentação? Todos, menos as agremiações.

Thêmis, devorada por Zeus, cujo gesto gastronômico o levou a tornar-se justo, está na origem desta sensação de dar a cada um aquilo de seu por mérito, daí a importância de escalar os dirigentes como atletas, pois coragem não lhes falta para derrotar o corona. É justo vê-los em campo, dando o sangue e a vida pela economia do futebol. 

Já há campeonatos voltando devagarinho, algumas liga-de-bunda da vida, mas o plano dos homens de bom senso é reduzir a cautela com a pandemia Mandrake, soltar os leões e supermen no quadrilátero verde e fazer a torcida formar crença na volta de uma saudosa e impossível normalidade.

Aos céticos, sempre desconfiados, deve-se a paranoia da mutação: nada voltará a ser como antes e aí está a oportunidade de reabilitação da humanidade, sem explorar uns aos outros, nem enriquecer para engordar os anjos milicianos do abjeto e frio genocídio dos brasileiros.

Mas, nada: os anjos do bom senso, com seus queixos inexpugnáveis e suas longas asas de brasa, vão unir-se aos seres racionais-reacionais. Sua certeza: o modelo econômico e quem dele exaure fortunas, legais e ilegais, precisa continuar e a bola, esta não pode parar, pois distrai as pessoas.

Cronistas, torcedores, jogadores, massagistas, e toda a galera envolvida com futebol sente o sofrimento da paralisação, por falta de apoio de órgãos cartoriais, beneficiários das quadrilhas de anjos desde 1900 e poucos: são estes os heróis dispostos a desafiar a covid-19?

Seria uma vitória terminar cada jogo sem contágio, e bem poderíamos contar pontos para o time incólume após a testagem obrigatória no vestiário. Ninguém sairia perdendo pois redes funerárias e planos de saúde poderiam patrocinar os clubes do bom senso. Quem testar mais negativo seria campeão, acabou bola na rede!

Voltar logo, urgente, ao fútil-ball, poderá ainda ser uma bela contribuição para apressar a extinção do Brasil, projeto de ocupação dos nossos tutores, cuja primeira fase bateu sua meta com folga, ao atingir mais de 50 mil óbitos quando o esperado eram 30 mil. 

Ainda há mais 209 milhões e pouco a sepultar! É muito jogo pela frente, bota os homens de bom senso em campo!

Paulo Leandro é jornalista e professor doutor em Cultura e Sociedade.