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Da Redação
Publicado em 23 de agosto de 2020 às 13:00
- Atualizado há um ano
Na minha infância e adolescência, meu pai era uma força dupla para mim: era ao mesmo tempo herói e fonte do meu maior medo. Engenheiro com fama de gênio, dotado de incríveis habilidades manuais, campeão em vários esportes, era o meu ídolo. Mas, bem menos talentoso, eu sofria por temer jamais realizar o desejo de deixá-lo orgulhoso.
Como se vê, ser pai não é fácil para ninguém, mas, a Defensoria da Bahia fez um debate, transmitido por seus canais no Youtube e Facebook, que elevou o nível da discussão. Três homens conversaram sobre o tema e as suas experiências. Vale lembrar que, enquanto eu sofria por ter um pai bom demais em tudo, milhões de pessoas não têm pai nenhum ou são completamente abandonados por eles. “Quando a gente fala de paternidade, geralmente fala de uma história real de negligência”, “eu não tive a figura de pai para me dar o exemplo”, “eu não tenho relação de afeto com meu pai”, disseram os três.
Ao definir o que é ser pai, todos ressaltaram que a figura paterna é o resultado de um processo. “ A gente vai se tornando pai”, “ser pai é ir se descobrindo junto com o filho”, “eu vou construindo a paternidade diariamente, ser pai é um desafio”. Hoje, cuidando da minha filha e sentindo a admiração dela por mim, compreendo como até o meu pai, que parecia tão seguro, travava a mesma batalha e tinha as mesmas dúvidas.
Educar uma criança pressupõe o constante esforço de conhecer a si mesmo e ao mundo, para tentar ser melhor e fazer melhor. Ao falar de como pretendem educar os filhos em mundo racista, machista e homofóbico, um dos debatedores disse que, primeiro, a gente tem que se desintoxicar; outro lembrou que é necessário entender as limitações da criança, para não transpor para ela a carga que sofremos. O terceiro resumiu: ser pai é um exercício de aprendizagem.
O desafio, a negligência e os preconceitos podem influenciar a paternidade desde antes da assunção a esse papel. A espera pela criança nem sempre é igual. Um dos debatedores considera que, quando a esposa engravidou, ele também engravidou. Outro não teve espera, pois, quando casou, o marido já tinha um filho. Sim, ele não gerou a criança e compõe um casal de dois homens. O terceiro vivenciou a experiência de uma forma muito mais intensa. Esse pai gestou o filho no seu próprio útero. Trata-se de um homem transgênero. Quando nasceu, era considerado uma mulher. Como se vê, apenas um deles corresponde ao padrão tradicional.
Muitos leitores foram educados para não aceitar que a paternidade e a sexualidade podem ser diferentes. Meu pai foi um deles. Mas, notem como é impossível adivinhar quais frases foram proferidas por cada um dos pais no debate com a Defensoria. Por mais diferentes que sejam os dramas pessoais, as orientações políticas, as relações com o corpo, ou as preferências afetivas de cada um, na essência a paternidade plena é igual. Há muitos tipos de família, mas só o amor importa, só o amor fica.
Quanto ao meu pai, dedico esse texto a ele, que ainda é o meu herói. Quem sabe a minha constante vontade de melhorar não o deixe orgulhoso?
Ps: Segue o link para o debate:
Rafson Ximenes é Defensor Público Geral da Bahia
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