Paciente troca alianças em hospital: 'casamento deixou ela mais forte', diz marido

Comerciante de 34 anos luta contra câncer; família preparou cerimônia em um dia

São 15 anos de relacionamento, um filho de 10 e amor que não se mede. Esse é o resumo da história da comerciante Karla Priscila de Souza Sérgio, 34 anos, com o condutor socorrista Vinicius Freitas Pimentel, que, nesta quarta-feira (26), se tornaram, oficialmente, marido e mulher. E a cerimônia, apesar de não ter sido numa igreja, tinha tudo o que era necessário para selar a união: pastor, alianças, vestido, véu e buquê, além de família e amigos dos noivos.

Karla e Vinicius se casaram dentro do Hospital Teresa de Lisieux, na Avenida ACM, em Salvador, mais especificamente, no 10º andar da unidade. Apesar de o desejo do casamento ser antigo, ele decidiu tomar uma atitude mais concreta após Karla ser diagnosticada com câncer de mama, em dezembro de 2017, e, em março deste ano, descobrir metástase na cervical – por conta do avanço da doença, há duas semanas perdeu os movimentos do corpo do pescoço para baixo.

Durante toda a tarde desta quarta, o quarto 1.015 teve movimentação intensa. Entravam e saíam familiares, amigos e médicos, todos sempre tomados pela emoção que as circunstâncias envolvem. 

As duas irmãs de Karla, Kely Patrícia de Souza Sérgio Vitório e Ana Paula de Souza Sérgio, ficaram com a missão de recepcionar os convidados. A mãe da noiva, dona Maria Auxiliadora, 60, não saiu do lado da filha.

“Eu moro em Minas Gerais e Ana Paula mora em São Paulo. Quando soubemos da piora no quadro de nossa irmã, há duas semanas, viemos para Salvador e o pedido de casamento foi uma surpresa e era um desejo dos dois há muitos anos”, mencionou Kely. 

Ela foi a responsável por preparar todo o figurino e decoração do casamento. “Eu pensei em tudo, mesmo com tempo curto. Pensei até no espartilho, que toda noiva precisa usar”, confessou.

[[galeria]]

Descoberta da doença Uma das melhores amigas de Karla, Marcela Santos Marques contou ao CORREIO que presenciou a descoberta da doença. “Ela começou a sentir dores nos seios. Fez o primeiro exame, com biópsia, e deu que era benigno. Mas as dores se intensificaram e ela decidiu fazer outro procedimento. Foi então que veio a descoberta do câncer e ela, imediatamente, iniciou o tratamento com a quimioterapia”, relembrou.

Ainda de acordo com Marcela, há duas semanas, Karla começou a sentir fraqueza no corpo, chegando, inclusive, a sofrer quedas. “Foi quando ela voltou a se internar e acabou perdendo os movimentos do corpo”. 

Tratamento De acordo com boletim médico do Teresa de Lisieux, a paciente está recebendo tratamento paliativo no hospital desde que descobriu a metástase, em março deste ano.

Outra amiga de Karla, Juçara Fonseca, afirmou que a paciente tem surpreendido a todos com a forma com a qual vem reagindo à situação.“É impressionante porque, quando a gente vem visitá-la, somos nós quem saímos com mais força, mais esperança, tudo graças a ela. Karla não desanima e sempre pede que a gente não perca as esperanças. Para ela, é importante viver um dia de cada vez”, destacou.Casório Filho de Karla e Vinicius, o pequeno Guilherme esteve no hospital para acompanhar todos os preparativos do matrimônio. Ele era puro nervosismo e o comentário de todos era de que o menino parecia o noivo de tanta ansiedade. Os olhos atentos do garoto se preocupavam com o pai, que estava “atrasado”.

Pastor evangélico responsável por realizar a cerimônia, Paulo Henrique aproveitou a reunião familiar e descontraiu o clima de nervosismo. “É o primeiro casamento que eu vejo o noivo atrasar”, brincou. Segundo ele, o momento é especial, porque representa, na religião dos noivos, “a união de dois corpos em um”. 

Fábio Nascimento, que é irmão de Vinicius e cunhado de Karla, estava entre os mais emocionados do 10º andar. “Meu irmão não é muito de falar, ele guarda as emoções. Mas todos nós temos certeza que o amor dele por Karla é enorme e esse casamento representa isso. Eu acho que o amor cura tudo e eu tenho certeza que minha cunhada vai sair desse hospital e eles vão poder fazer outra cerimônia na igreja”, contou.

Ainda de acordo com Fábio, a maior preocupação de toda a família e amigos é preservar ao máximo o filho do casal. “Ele é uma criança e está muito assustado com a doença da mãe, com a internação dela e essa perda dos movimentos. Estamos tentando poupar ele de qualquer sentimento de tristeza. Ele está feliz com o casamento e eu sei que Karla vai sair daqui e voltar a frequentar as reuniões de família, os churrascos, como sempre fez”, declarou.

Vinicius, o maridão, falou sobre a realização do sonho de oficializar a união. “Há muito tempo eu e Karla estávamos querendo casar. Iríamos, inclusive, fazer a cerimônia esse ano, mas ela adoeceu e tivemos que adiar. Com o quadro dela das últimas semanas, eu vi que não poderia esperar mais. Decidimos fazer dentro do hospital mesmo. A diretoria autorizou e fizemos uma cerimônia linda”, contou o marido de Karla, logo após a troca de alianças.

Sobre o futuro, ele acredita que a mulher vai superar a doença.“O plano a partir de agora é dar sequência ao tratamento. Ela recomeçou a radioterapia e eu tenho certeza que o casamento deixou ela ainda mais forte. Ela tem uma força de vontade muito grande, luta pela vida, e já, já Karla vai estar novamente em casa, com a família e vamos fazer outra cerimônia, um festão para comemorar o casamento”, concluiu.Complicações Apesar da emoção que envolveu a cerimônia, não é todo dia que alguém vê a própria história ganhando tanta repercussão. A mãe de Karla, dona Maria Auxiliadora, disse que não esperava que o caso fosse chamar tanta atenção. “A gente esperava que fossem vir apenas a família, amigos e o pastor, no máximo as enfermeiras que cuidam dela. A cerimônia seria realizada dentro do próprio quarto”, ressaltou.

Mas, não era esse o clima no hospital. A técnica de enfermagem Rosenilda de Assis, que trabalha no 5º andar, já estava a postos do quarto 1.015 à espera do casamento. “Quando a gente soube que iria ter um casamento desse aqui no hospital, ficamos empolgados, curiosos e felizes, então, viemos assistir”, confessou.

Assim como Rosenilda, outras pessoas lotaram a recepção do andar, onde estava tudo arrumado para a cerimônia. Até a hora do casamento, Karla não sabia que sairia do quarto e que um pequeno altar tinha sido montado dentro do hospital. Tudo estava arrumado para a cerimônia e recepção. Tinha bolo, balões vermelhos, cartões com mensagens para os noivos, música (voz e violão) e cadeiras.

Até então, o noivo não tinha chegado e a movimentação no quarto onde Karla está internada começou a ficar mais intensa. Por conta da situação, que poderia prejudicar o tratamento da noiva, a diretoria do hospital pediu que todos que não fizessem parte da família e dos convidados amigos se retirassem do local.

E assim foi feito. Karla se casou com Vinícius por volta das 18h, com direito a vestido de noiva e todos os outros simbolismos que fazem parte de um de casamento. A imprensa não foi autorizada a acompanhar a cerimônia, mas o sentimento era um só: de felicidade pelos noivos e pela realização de um sonho que não podia mais esperar.

*Com supervisão do editor João Galdea.