Para ler ao som de Back in Bahia - Gilberto Gil

Linha Fina Lorem ipsum dolor sit amet consectetur adipisicing elit. Dolorum ipsa voluptatum enim voluptatem dignissimos.

  • D
  • Do Estúdio

Publicado em 29 de março de 2019 às 09:10

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Eu estava em Dublin há um ano com a sensação térmica de 0º e saudade daqui. A caminho de casa, na distante Clontarf, num ônibus de excelente estrutura e um wi-fi que funcionava, ouvia incansavelmente Luedji Luna cantando “Notícias de Salvador” e por lá também não fazia calor. Senti saudade. Senti muita saudade. E ouvia também e pedia (em silêncio) licença a Gil e reinventava “Back in Bahia” cantando que lá em Dublin vez em quando me sentia longe daqui. O resto seguia como o mestre: quando me sentia longe, dava por mim.

Estar em Salvador mexe por dentro e traz algum prazer que talvez adormeça, mas eu o sinto vivo - e o sentia ainda mais estando um oceano distante. E ainda sou capaz de sentir mesmo na rotina caótica da cidade que nos desestrutura ao impor barreiras intransponíveis e nos afasta do sonho de um lugar que pense na qualidade de vida do seu povo. E nisso eu penso com força sempre que volto para casa pela BR e continuo lembrando do que Giovani Cidreira pediu que falassem num discurso de agradecimento por vencer um Prêmio Caymmi poucos anos atrás - que ele não pôde estar presente. E no texto ele lembrou, se não me falha a memória, que existe uma Salvador “pro lado de lá da BR”. Que não é dita, não é lida, não é vista, mas existe (e resiste!) bravamente.

Hoje, aqui, sei que Salvador não é um acontecimento que passa em vão e deixa as suas marcas. Às vezes uma tatuagem escolhida com zelo. Às vezes cicatrizes ou feridas abertas que a gente vai tentando curar. Vou administrando as emoções vivendo a cidade. No Rio Vermelho. Em Castelo Branco. Pelourinho. Cajazeiras. Entre os prédios da Pituba. No carro até a BR-324 pelos bairros que a margeiam. No metrô. Nos ônibus. Vou indo sempre vivendo Salvador e pensando sobre as emoções que ela me desperta andando no Sol que queima muito e embeleza a paisagem.

Ao voltar dei de cara com uma cidade que parecia tentar se reconhecer e caminhou naturalmente a um verão histórico. Vi Larissa Luz, Luedji Luna e Xênia França se unirem no impecável Aya Bass que estreou no Festival Sangue Novo e ocupou outros três lugares durante o Carnaval: o trio Respeita as Minas, (circuito Barra-Ondina), na Praça Castro Alves - num show que eu não assisti mas imagino a força das três reunidas cantando para uma multidão no centrão da cidade, na praça que sempre me marcou pela voz de Margareth Menezes em “Cidadão” do refrão “Abolição! No coração do poeta cabe a multidão”. E, por último, na despedida do projeto no Largo do Pelourinho - catarse coletiva, estive lá!

Outros sons cantaram (e cantam) Salvador. Vi outros cantos, outras cenas. Banho de mar à fantasia na Ladeira da Preguiça, encerrado com um show de Afrocidade na praia. Vi Hiran, Illy e Duda Beat recebendo Majur e Lazzo Matumbi no Pelourinho. Vi Baco Exu do Blues. E um dos melhores shows do Baiana System e segui Attooxxa no Carnaval. Salvador sendo palco para os novos nomes da Bahia, que se mantém protagonista na história da música brasileira.

Se ao estacionar o seu carro no Leblon Caetano Veloso deixou a sua marca no jornalismo de celebridades no Brasil, por aqui caminhava vivendo a cidade e os seus espaços e novidades. Outros iam por outros velhos e lindos caminhos. Descer a escada que leva ao paraíso que é a praia da Gamboa era o roteiro para encontrar Liniker, Anelis Assumpção, Tulipa Ruiz, Mahmundi, Linn da Quebrada curtindo a cidade. Outras coisas mais, como virar a noite pro dois de fevereiro para ver os shows na janela do Lala, ir lá e vir cá para pegar o início do Cortejo Afro na Paciência. Caetano aparecendo no show de Johnny Hooker - que eu não vi - enquanto ele cantava “Caetano Veloso”. Elisa Lucinda com o seu “Parem de falar mal da rotina” - que eu vi - na Caixa Cultural. A Casa Charriot acontecendo como um espaço importante de debate e produção cultural no Comércio. O Âncora do Marujo com os shows de segunda a segunda que iam (e vão!) madrugada adentro na Carlos Gomes. A Casa Ninja acontecendo com seu sofá na rua ecoando vozes. Gil, Caetano e Daniela cantando na sede do Ilê na Noite da Beleza Negra. Almoçar no bar da Mônica - que eu nunca tinha ido - na Gamboa. E eu não estou livre de cometer o pecado de não citar outros nomes e acontecimentos.

Salvador nos olhos do Brasil e do mundo, com destaque no The New York Times. Salvador falando muito.

Ouçam. Vejam. Há muito sendo dito neste canto do mundo no Atlântico Sul.

De novo Gil, de novo Back in Bahia: “hoje eu me sinto como se ter ido fosse necessário para voltar. Tanto mais vivo”.

É aqui, sempre. Obrigado, Salvador.

Texto originalmente publicado no Facebook e replicado com autorização do autor