Polo Industrial de Camaçari: essencial há 42 anos

Complexo responde por 22% do total de riquezas da indústria baiana

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  • Donaldson Gomes

Publicado em 29 de junho de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Vaner Casais/Ag. Bapress

O Polo Industrial de Camaçari é responsável por R$ 1 em cada R$ 5 em riquezas produzidas pela indústria baiana. De lá saem quase 30% de tudo o que a Bahia exporta e aproximadamente 10% da arrecadação estadual. Mas além do papel econômico que vem desempenhando há 42 anos, o maior complexo industrial da América Latina vem cumprindo uma missão imprescindível no combate ao avanço da pandemia do novo coronavírus. 

Se nas últimas quatro décadas a capacidade instalada capaz de produzir 12 milhões de toneladas/ano de produtos químicos e petroquímicos funcionou como motor para impulsionar a economia baiana, mesmo em médio à retração causada pelo isolamento o centro industrial continua a exercer o seu papel. De lá saem produtos fundamentais para produção de medicamentos, materiais de higiene, embalagens para medicamentos, entre outros produtos, no momento em que o fechamento de fronteiras escancarou a importância de uma indústria nacional forte. 

Mauro Pereira, superintendente do Comitê de Fomento Industrial de Camaçari, destaca o papel indutor de desenvolvimento que o Polo de Camaçari exerce há 42 anos, através da sua geração de empregos e de riquezas. Além disso, ele ressalta o papel da área industrial como indutora de desenvolvimento e lembra que houve um significativo processo de diversificação no outrora polo petroquímico e agora reconhecido como polo industrial. 

“Algumas empresas saíram ao longo dos anos, mas outras chegaram. Se olhar o Polo de Camaçari como um todo, ele cresceu. É um processo que não se repete quando se compara a situação com outras áreas industrias. Não estou falando da Bahia, mas de um processo que se verifica no Brasil”, destaca. Ele lembra que o Polo de Camaçari se manteve pujante, mesmo diante de um cenário desfavorável para o conjunto da indústria brasileira. Para Mauro Pereira, o momento atual é bastante propício para discutir a importância do setor para o país. 

“Neste momento, em que o mundo inteiro busca toda a parte de fármacos, remédios de modo geral, nos deparamos com um grau muito elevado de dependência externa. Até os princípios ativos, em muitos casos vem de fora”, lembra. “Não dá para aceitar um grau de dependência tão grande”, diz. Ele lembra que a crise do coronavírus tem feio inclusive que nações evitem determinadas rotas. 

Mauro Pereira destaca o potencial que o polo tem para fabricar na Bahia uma série de produtos que hoje são importados. Em Camaçari são produzidas matérias-primas e produtos para as indústrias farmacêuticas, de higiene e limpeza, embalagens e equipamentos de proteção. Mas lembra que a contribuição poderia ser ainda maior. “Existem oportunidades que estão adormecidas que precisam ser olhadas, é preciso parar de enviar apenas matérias-primas para o exterior e receber produtos industrializados, porque a maior parte da geração de riqueza fica lá fora”, destaca o superintendente do Cofic. 

“E no momento atual, ainda existe o sentido de urgência. Os EPIs (equipamentos de proteção individuais) para os profissionais de saúde estão sendo demandados em São Paulo, no Norte do Brasil e estão vindo da China. Vão demorar muitos dias ainda para chegar. Poderiam estar sendo produzidos na Bahia”, destaca o superintendente do Cofic. 

Diferenciais competitivos O superintendente do Cofic destaca que o Polo de Camaçari continua a ser importante para a atração de investimentos para o estado. Entre os atrativos, ele destaca o sistema ambiental integrado, gerido pela Cetrel. “Se uma empresa se instala em um outro complexo industrial, ela precisa se preocupar com a montagem de uma estrutura própria para  a gestão de seus resíduos, enquanto o Polo oferece isso como um diferencial e um grande atrativo para a indústria que se instala em Camaçari”, diz. 

Além disso, um outro destaque está na integração das cadeias de produção. Camaçari tem o maior complexo petroquímico industrial integrado da América do Sul. O processo que se inicia com o refino do petróleo, na Refinaria Landulpho Alves, em São Francisco do Conde. No Polo, estão disponíveis matérias-primas de primeira e segunda geração petroquímicas, o que garante facilidades para atividades industriais que dependem desses insumos. “Você tem numa distância muito curta todo o processo petroquímico, saindo da refinaria, sendo transformado no polo e indo até o seu escoamento pelo Porto de Aratu”, diz Pereira. 

O superintendente do Cofic acredita que o aproveitamento do potencial que o Polo de Camaçari ainda tem para crescer depende do investimento nas melhorias das condições de infraestrutura. 

Oportunidade de crescimento Marconi Oliveira, conselheiro da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), acredita que o  Polo de Camaçari tem todas as condições de se destacar na retomada da economia brasileira pós-pandemia. Para ele, isso trará benefícios econômicos para todo o país. 

“Eu acredito que as economias de todo mundo devem se fechar um pouco e que nós também vamos nos fechar aqui no Brasil. O modelo de globalização foi impactado pela pandemia. Isso vai criar um 'ensimesmamento'. Vamos nos ensimesmar para produzir”, avalia Oliveira. Ele acredita que haverá um aumento na busca por uma menor dependência externa. 

“Camaçari em particular e a Bahia de modo geral tem que aproveitar esse momento. Existem plantas paradas, mas já tem toda uma estrutura pronta, licenciamento ambiental de um Polo e o domínio das funções necessárias para uma operação desta natureza”, enumera. 

Para Marcone Oliveira, a pandemia já provocou uma série de alterações em processos que  aconteceriam mais lentamente em condições normais. Além disso, ele lembra que o atual patamar de preços do petróleo é favorável para a indústria petroquímica. “Toda vez que há uma queda nos custos da matéria-prima, você ganha em competitividade”, diz. 

“Nós temos um dos maiores polos industriais da América Latina. Nasceu com visão exclusivamente petroquímica e se desenvolveu tanto que hoje é maior que o próprio CIA (Centro Industrial de Aratu)”, compara. “O bairro da Pituba cresceu em função do Polo. Salvador se desenvolveu como um todo se desenvolveu em função da renda que era gerada lá”, lembra. 

O conselheiro da Fieb acredita que tornar o Polo de Camaçari perene é fundamental para a Bahia. Para tanto, defende, é preciso enfrentar os gargalos que dificultam a sua competitividade, como questões ligadas à infraestrutura de escoamento da produção e dificuldades de custos com matéria-prima, energia, entre outros fatores. 

Mesmo com os investimentos da empresa em outros lugares do Brasil e do mundo, Camaçari continua ser a sede do maior complexo da Braskem. O diretor industrial da empresa, Carlos Alfano, lembra que os produtos fabricados em Camaçari são essenciais para o enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. “Quando a gente olha as nossas operações, são cinco unidades industriais que produzem matérias-primas essenciais para a fabricação de embalagens, produtos de limpeza e até medicamentos”, destaca. 

Alfano destaca os investimentos da Braskem na modernização e ampliação da sua operação em Camaçari, como é o caso do projeto Orion, que permite à empresa uma flexibilização em relação à matéria-prima utilizada no Polo. Além disso, a empresa tem buscado melhorar a sua matriz energética, com investimentos em energia limpa e renovável. Hoje, 20% do consumo já se dá a partir das matrizes solar e eólica. 

Projeto mudou economia de toda a Bahia Há 42 anos, o Polo Industrial de Camaçari vem moldando a economia baiana. A influência do complexo industrial projetado inicialmente para fornecer matérias-primas químicas e petroquímicas foi além do gigantesco impacto econômico. O empresário Roberto Fiamengui, presidente do Sinpeq, sindicato que representa a indústria química e petroquímica, conta que o gigante industrial na Região Metropolitana de Salvador (RMS) influenciou as mais diversas áreas da economia e da sociedade baiana. 

“A existência do Polo trouxe uma série de oportunidades diretamente ligadas ao empreendimento, mas não só isso. O setor de serviços se desenvolveu muito na Bahia e além disso, os baianos passaram a sonhar em trabalhar lá em Camaçari, o que estimulou a busca por formação profissional”, lembra Fiamengui, que chegou à Bahia dois anos antes do início da operação do polo. 

“O polo trouxe muita tecnologia de ponta. Para trabalhar lá, as pessoas precisavam de conhecimento e isso levou a uma evolução na área educacional no estado tão importante quanto o impacto econômico que o empreendimento teve e tem até hoje”, analisa. 

“A produção no segmento químico/petroquímico atende a mais da metade das necessidades do país. Além disso, os investimentos sociais das empresas do Polo são superiores a R$ 13 milhões/ano”, destaca o vice-governador e secretário de Desenvolvimento Econômico, João Leão. 

“O complexo emprega um total de 45 mil pessoas, sendo 15 mil empregos diretos e 30 mil por meio de empresas contratadas”, ressalta o vice-governador João Leão, lembrando que a média salarial é de R$ 4 mil per capita no segmento químico e petroquímico do pais.

Empresário do setor de alimentação, Ademar Lemos Júnior, diretor do Grupo LemosPassos, ressalta a importância do polo para o setor de serviços, “cumprindo o importante papel de contribuir com o avanço econômico e social da Bahia, gerando renda, emprego e investindo para o aumento da produtividade das empresas que ali estão presentes”. Segundo ele, o grupo tem investido em tecnologia para atender à demanda das empresas instaladas lá.

Empresas evoluem nas boas práticas ambientais As empresas do Polo Industrial de Camaçari testemunharam e participaram de uma profunda revolução na maneira de produzir bens necessários ao dia a dia do homem moderno. “Saímos de uma realidade, no início dos anos 70, em que a noção de impacto ambiental era algo restrito a uma reduzida parcela de cientistas, e atingimos uma era em que toda a sociedade concorda que não é mais possível pensar o mundo sem levar em consideração questões como tecnologia limpa, sustentabilidade e economia circular”, destaca Mario André Bernardo, Gerente de Saúde, Segurança, Meio Ambiente e Qualidade da Tronox.

Entre 2013 e 2018 a Tronox investiu cerca de R$ 47 milhões em novas tecnologias e procedimentos para garantir a melhoria contínua do desempenho ambiental. 

“A história do polo coincide e acompanha a própria história do surgimento e desenvolvimento da conscientização ambiental. No início, eram apenas ideias discutidas em conferências internacionais”, lembra. Aos poucos, as discussões foram estimulando a criação de legislações ambientais, que obrigaram empresas de todos os setores a pensarem numa forma diferente de produzir, lembra. 

O passo seguinte foi a criação de novas tecnologias. Ele destaca a importância da pressão social feita pela sociedade no processo de mudanças. Atualmente, a indústria química e petroquímica brasileira é regulada por uma das legislações mais rígidas do mundo. “Empresas que têm o nível de governança corporativa maduro, tais como as instaladas no polo de Camaçari, muitas vezes vão além do que pede a legislação e buscam padrões ainda mais altos de sustentabilidade”, pondera.

A Tronox é uma das líderes globais na produção de pigmento de dióxido de titânio. Mário Andre acredita que a legislação cumpre seu papel de estabelecer padrões ótimos para garantir a saúde das pessoas e a proteção ambiental, “mas as empresas mais maduras procuram dar um passo ainda maior”.

Gestão integrada promove redução de custos A lógica de um condomínio, onde os integrantes dividem os custos comuns e com isso economizam é um dos grandes atrativos do Polo Industrial de Camaçari. Quem opera lá encontra a possibilidade exclusiva de uma licença ambiental coletiva, além de uma estrutura centralizada para a gestão de resíduos. 

Eduardo Fontoura, gerente de gerenciamento ambiental da Cetrel, conta que além de representar uma economia de custos para as empresas, o modelo de atuação em Camaçari garante ganhos de sustentabilidade que são positivos para toda a  sociedade. 

Segundo ele, desde a fundação do polo, há uma busca pela otimização dos recursos ambientais. Um pequeno exemplo disso é que 2014 a 2018, houve uma redução de 27% na emissão de SO2, produto químico que é gerado a partir da queima de combustíveis utilizados nos transportes.

Outro destaque está na economia dos recursos hídricos. No mesmo período, houve uma redução no consumo de água da ordem de 7%. Fontoura estima que num horizonte de 15 anos a redução no consumo é superior a 15%. 

“O Polo já nasce com uma visão de vanguarda, diferente de outras áreas industriais, com modelo integrado, inclusive na questão ambiental”, destaca Fontoura. “Nenhum outro lugar do país tem essa gestão integrada. São mais de 50 unidades industriais. A influencia que essas empresas tem é analisada de maneira conjunta. Imagina se tivesse que fazer individualmente”, destacou. 

Breve História do Complexo industrial de Camaçari

Década de 50 

1950   Entrada em Operação da Refinaria Landulpho Alves, em Mataripe.

Década de 60

1966   Criação da Companhia Petroquímica do Nordeste/Copene, dando início à construção do Complexo Básico.

Década de 70

1972   Início da implantação do Polo Petroquímico de Camaçari.

1975   Inauguração do Porto de Aratu, estratégico para escoamento da produção do Polo.

1978  Início de Operação do Polo Petroquímico de Camaçari.

Década de 90

-  Ampliação da Refinaria Landulpho Alves e da Copene

-  Adensamento de cadeias produtivas do Polo, como reflexo da política de atração de novos investimentos.

Década de 2000

2001   Implantação do segmento automotivo no Polo com o início de operação da Ford. Neste período, o complexo, até então petroquímico, passa a ser denominado Polo Industrial de Camaçari.

2002   Criação da Braskem.

2006   Inauguração da Fábrica de Pneus da Continental (a primeira do Grupo no Brasil).

2007   Inauguração da fábrica de pneus da Bridgestone (a segunda fábrica do grupo no Brasil).

2009   Transferência da matriz da Paranapanema para Camaçari e a incorporação da Caraiba Metais pela empresa.

Década de 2010

2011   Inicio de implantação do segmento eólico com a inauguração da Gamesa e Alston, as primeiras fábricas de Aerogeradores na Bahia.

2012    Fechamento da unidade da Dow, levando ao fechamento das duas unidades da Dupont

2013    Início da implantação do Complexo Acrílico pela Basf, inauguração da nova Unidade ITF Chemical (Fármacos). O novo Plano Diretor do Polo é lançado.

2013    Inauguração da Kimberly-Clark

2014   Inauguração da Fábrica de Motores da Ford (a primeira no tipo na região Nordeste).

2014   Inauguração da fábrica do Grupo Boticário

2015   Inauguração da nova fábrica da Basf e o início da operação do Complexo Acrílico.

2016   Fechamento da Coopenor

2016  Fechamento das Tubos Tigre

2017     Aquisição da antiga unidade da Dow  pela Formitex, com projeto de reabrir as unidades da Dupont.

2018   Interrupção das atividades da Fafen.

2019   Arrendamento da Fafen pela Unigel.

2019    Inauguração da Flopam, fabrica de insumos para tratamento de água e auxiliares para a produção de petróleo

2020   Inauguração do Cimatec Park, mais importante complexo de tecnologia e inovação do Brasil.