Precisaremos pensar em novos enlaces e novas formas de produzir afeto 

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  • D
  • Da Redação

Publicado em 23 de março de 2020 às 11:45

- Atualizado há um ano

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Estamos tendo que lidar com a exigência de isolamento social e a angústia despertada por um cotidiano que ainda não conhecemos. Somado a isso, existe um não saber sobre a duração e as consequências dessa crise para nossa saúde física e também mental. Existe convocação de estarmos com nós mesmos, incluindo aí um inevitável encontro com nosso lar, nossos familiares e tudo mais que nomeamos de mundo íntimo.

O momento é, sobretudo, de incertezas. Freud, em O mal-estar da civilização, nos lembra que a vida, tal como a encontramos, é árdua demais para nós e que, afim de suportá-la, precisamos de medidas paliativas. Daí que, diante de uma nova configuração social, mesmo que temporária, precisaremos pensar em novos enlaces, novos olhares e novas formas de produzir afeto. No lugar do toque, teremos que fazer a palavra circular e ela será o suporte, tal como a psicanálise propõe, para dar sentido à falta da troca entre os corpos ou mesmo conversas com menos de um metro de distância.

No enquadre amoroso, o convite é ainda mais delicado: estar no mesmo espaço com o parceiro ou parceira mais horas do que se está acostumado, um encontro obrigatório com quem já conhecemos. Os casais de longa data já podem não experimentar tanto aquela sede por encontros eternos, sendo, dessa forma, o excesso de presença fonte de incomodo e estranheza.

Não há regra de ouro. Podemos pensar que estamos diante do desafio de, no caso a caso, na intimidade de cada casal e a partir do que faz laço entre dois sujeitos, descobrir o que poderá ser produzido no “isolamento” contingente que estamos vivendo, o que salvará cada um dessa angústia. O amor é necessário para o sujeito. E diante da contingência, da crise impossível de ser prevista, há de ser criativo e advertido de que todas as barreiras criadas pelas superfícies das luvas, máscaras, álcool em gel não impedem que o laço social se mantenha, se reinvente. O processo civilizatório exige que abramos mão de uma certa dose de satisfação individual em nome do coletivo, em nome do amor a humanidade. O contato online, opção adotada por alguns não é a melhor opção, mas parece ser a mais ética em muitos casos. 

Para aqueles que não terão o afago do retorno ao lar a dois, que esse momento seja de convite a (re)descobrir a série de satisfações mais solitárias. Estaremos privados da troca com amigos, familiares, mas estamos confinados no lugar onde poderíamos ficar mais vontade, perto do que gostamos e criamos como mundo próprio: nossos livros, músicas, trabalho, escrita, filmes ou qualquer outra coisa que possa ser objeto de satisfação.Juliana Pereira é psicanalista

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