Quando a asma pode ser fatal? Morte de Fernanda Young deixa doentes em alerta

Inflamação nos brônquios pode ser fatal se tratamento não for regular

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 1 de setembro de 2019 às 05:30

- Atualizado há um ano

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Em muitas madrugadas da infância, o gestor de contas Lucas Acyoli foi parar na emergência do hospital. Motivo? Asma! As crises só aliviavam com nebulização à base de anti-inflamatório. No dia a dia, toma mais duas medicações: uma bombinha de “manutenção” (tratamento) e outra de “resgate” (para crises). Jamais parou e, ainda hoje, aos 33 anos, mantém a mesma rotina.   

A asma é uma doença crônica e não tem cura. Mas tem controle e precisa de tratamento contínuo. Em muitos caso, para a vida toda. Lucas sabe disso e nunca vacilou, mesmo tendo melhorado bastante em determinado período.“Eu trabalho viajando, e os medicamentos estão sempre comigo. Quando eu era criança, minha mãe nunca mediu esforços para me levar na emergência. Na adolescência, melhorou. Tinha só duas crises por ano. Mas, de dois anos pra cá, voltaram a ser mais frequentes”, explica Lucas. A asma inflama os brônquios. Com o estreitamento desses, causado pela inflamação, a passagem de oxigênio fica prejudicada. Quando a inflamação evolui rápido e não há intervenção com os remédios, a crise de asma pode ser fatal. Foi o que aconteceu com a atriz, roteirista e escritora Fernanda Young, que morreu domingo passado, em seu sítio, após ter uma crise. Fernanda Young morreu na madrugada do último domingo (25) após uma crise de asma (Foto: Divulgação) Sem conhecer o caso de perto, os especialistas ouvidos pelo CORREIO não conseguem afirmar  o que aconteceu exatamente com Fernanda. Mas, normalmente, quando acontece um colapso, é porque o tratamento não é feito de forma adequada (veja abaixo os cinco passos até o colapso). “Uma das formas de prevenir um ataque fatal de asma é o uso adequado das medicações”, afirma a pneumologista Tatiana Galvão, da Sociedade Brasileira de Pneumologia.     “A grande questão é que, muitas vezes, o paciente não faz um tratamento contínuo, regular. E muitas vezes ele não tem a bombinha”, confirma a também pneumologista Larissa Voss Sadigursky, membro da Sociedade Baiana de Pneumologia e médica dos hospitais Cardiopulmonar e Santa Izabel.

Segundo as especialistas, existe todo um plano de ação para que o paciente com asma saiba reconhecer uma crise, utilizar o medicamente e avaliar o momento certo de ir para a emergência. “Provavelmente, o caso de Fernanda envolve uma asma que não vinha controlada. Porque é possível controlar desde uma asma leve até uma asma grave, contanto que se tome as medicações adequadamente”, explica Tatiana. 

O caso Young, diz Larissa, é a prova de que o risco não está só na asma grave. Quando o paciente entra em contato com um desencadeador - a maior parte deles aeroalérgenos como poeira, mofo ou ácaro -, a asma típica pode evoluir para uma crise potencialmente fatal. “Tem pacientes que vão para casa de praia e tem crise de asma. A Fernanda foi para o sítio. Às vezes aquela casa tá com mofo, com lençóis sem uso há algum tempo. Aí o paciente pode ter uma crise súbita”.

Bombinha Em caso de crise aguda, uma das saídas é utilizar a bombinha de resgate ou de emergência. Ela é diferente da medicação de manutenção ou de controle dos sintomas. Enquanto uma previne a crise e tenta manter o sistema respiratório sem qualquer inflamação, a outra atua em casos específicos.

“A bombinha de emergência traz um alívio imediato. Eu sempre deixo bem próximo, seja na mochila do trabalho ou no carro”, ensina Lucas. “Você pode passar anos sem ter crise de asma, quando, de repente, ela pode acontecer. Você tem que ter a medicação de resgate. Tem que usar a medicação e, se a medicação não resolver, você tem que ir logo para a emergência”, aconselha Larissa.

A crise aguda é causada quando há uma maior inflamação dos músculos que revestem os brônquios. Estes, por sua vez, nada mais são que o conduto por onde passa o ar e que liga o nariz aos alvéolos, que fazem a chamada troca gasosa. Parte do ar aspirado é transformado em gás carbônico e expelido, e outra parte é direcionada para os órgãos do corpo.   No caso de Fernanda, muitos comentários na Internet tentaram culpar a bombinha pela sua morte. A bombinha não mata. Fernanda Young morreu em parada respiratória causada pelo broncoespasmo da asma. Muitas crises se tornam fatais quando o paciente acredita que vai ficar bom apenas com a bombinha e reluta em ir para a emergência.  

“O paciente fica usando bombinha, não melhora e usa mais bombinha. Usa dez, 20, 30 jatos de bombinha. Aí fala que o que matou foi a bombinha. Não! O que matou foi a crise de asma grave, com estreitamento dos brônquios, distúrbio de ventilação, déficit de oxigênio. Aí tem uma parada cardiorrespiratória e acaba indo a óbito”, afirma Tatiana.

Mortes Segundo dados da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab), 896 pessoas morreram por asma em todo o estado entre 2015 e agosto de 2019, sendo 542 mulheres e 324 homens. Entre os vivos, muita gente tem asma e não sabe. 

Por isso, é preciso estar atento a alguns sintomas como cansaço, falta de ar, tosse, pressão torácica e chiado no peito. Mas esses sintomas podem ocorrer de forma isolada. Comumente, a asma é associada somente ao chiado no peito. Em muitos casos, porém, o chiado não está presente.“Às vezes o paciente tem só uma tosse persistente ou uma pressão no tórax. Às vezes vai só fazer uma atividade física e se cansa. Não consegue ter o rendimento que tinha antes”, observa LarissaSomente uma avaliação médica com pneumologista pode confirmar se alguém tem asma ou não. Exames como a espirometria (exame de sopro) medem a capacidade respiratória, e testes alérgicos buscam possíveis agentes causadores da inflamação brônquica. O raio-x de tórax serve para descartar problemas associados.

“No último ano, fiz três espirometrias diferentes. Até porque passei a usar um medicamento novo. Tem dado certo e minha capacidade respiratória tem melhorado bastante. Antes eu estava usando 50% da capacidade do pulmão. Hoje atingi 73%”, disse o cuidadoso Lucas. 

Ainda é preciso estar atento aos fatores agravantes da asma, como é o caso da rinite crônica, da qual Lucas também sofre. Muitos pacientes como ele precisam enfrentar ambas. “Impacta bastante”, confirma Lucas. “E o tratamento da rinite tem que ser junto com a asma. Senão você vai usar várias medicações para a asma e não vai ter o efeito desejado. Porque a inflamação começa em cima e se dissemina por toda a via inferior”, completa Larissa, médica do gestor de contas. 

Os cinco passos até o colapso

1 - Inflamação A asma é caracterizada pela inflamação dos brônquios, conduto que leva ar do nariz aos alvéolos. Mas essa inflamação é mais forte em um momento de crise aguda.

2 - Alérgicos Normalmente causada por fatores aeroalérgenos (poeira, mofo, ácaro, etc), a inflamação faz com que os músculos que revestem os brônquios se contraiam.

3 - Obstrução Com os músculos contraídos, os brônquios perdem dilatação, e a passagem de oxigênio fica obstruída.

4 - Sem Troca Sem que o ar chegue aos alvéolos, não há troca gasosa. Ou seja, o oxigênio acaba não sendo distribuído para o corpo e nem expelido em forma de gás carbônico.

5 - Parada Sem oxigênio, o pulmão, o coração e o cérebro são os primeiros a sentir. Daí até uma parada cardiorrespiratória pode ser um pulo.

Perguntas frequentes sobre a bombinha

O que é a bombinha?  Um medicamento à base de corticoide ou de broncodilatadores de curta ou longa duração que serve para desinflamar os brônquios. Assim, eles se dilatam e permitem a respiração. 

A bombinha pode matar?  A bombinha não mata. Fernanda Young morreu em parada respiratória causada pelo broncoespasmo da asma.

A bombinha vicia? Não! As substâncias da bombinha (corticoides ou broncodilatadores) não viciam. 

A bombinha pode ser uma vilã em qual situação? A bombinha só pode levar a alguma alteração se for usada inadequadamente. Se a dose for excessiva, pode levar a uma taquicardia ou arritmia.  

Medidas para prevenir a asma

- Tomar medicações de forma adequada - Tomar vacinas contra gripe para evitar pneumonia (infecções só pioram o quadro da asma) - Passar pano úmido no chão do quarto antes de varrer - Colocar no sol roupas muito tempo guardadas no armário - Usar capa antialérgica no travesseiro e colchão

Onde se cuidar gratuitamenteCasos leves  - Unidades de Saúde Básica Municipal Postos de Saúde fazem tratamento ambulatorial e disponibilizam bombinha (corticoide e bronco dilatadores inalados) gratuitosCasos moderados e graves  - Hospital Octávio Mangabeira Praça Conselheiro João Alfredo S/N Pau Miúdo  - Hospital das Clínicas Rua Augusto Viana, nº 1, Canela - Programa de Controle da Asma na Bahia (ProAR) Multicentro de Saúde Carlos Gomes – Rua Carlos Gomes, nº. 270, 7º andar