Quem nunca? Baiano paga mais de R$ 100 de juros por mês no cheque especial

Linha de crédito é a mais cara disponível no mercado e chega a acumular 276,85% de juros ao ano; Veja dicas para sair desta cilada financeira

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  • Priscila Natividade

Publicado em 24 de junho de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

O acesso ao crédito fácil acaba se tornando uma cilada para quem confunde limite com renda. A  dívida mais cara tem nome, tamanho e valor também. Só no mês de maio, os baianos pagaram R$ 114,11 de juros pelo uso do cheque especial. Custo que cresceu 15,65% nos últimos sete meses, de acordo com um levantamento feito com exclusividade para o CORREIO pelo aplicativo de finanças pessoais Guiabolso. 

“É um crédito muito cômodo. A pessoa não precisa nem se preocupar em pesquisar o custo disso.  A ficha só vai cair depois de um tempo quando a conta chega ou o dinheiro começa a desaparecer da conta assim que o salário bate”, afirma o diretor de produto e tecnologia do Guiabolso, Julio Duram.  Para Duram, é preciso pesquisar outras linhas mais baratas e sair o quanto antes do cheque especial (Foto: Divulgação) Ainda que o Banco Central tenha mantido na última semana a taxa básica de juros (Selic) em 6,5% ao ano, o cheque especial bate recorde na comparação com outras linhas, quando chega a ser quatro vezes mais caro do que o empréstimo pessoal. Segundo um estudo feito pela Associação Nacional de Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a variação do cheque especial é a maior de todas: 11,69% (mês) e 276,85% ao ano. Por outro lado, o empréstimo ficou em 3,62% (mês) e 53,22% (ano). 

Na prática, a utilização por 20 dias de R$ 1 mil no cheque especial vai representar um custo de R$ 77,93. Se essa dívida se estender por um ano, o consumidor terá pago, em média, R$ 935,16 só de juros.  “Uma dívida com juro muito alto, como é o caso do cheque especial, prejudica bastante o orçamento. Falta, atualmente, conhecer melhor as outras opções”, recomenda Duran. 

Dívida trocada

A dependência do cheque especial é perigosa, mas tem volta. Uma das saídas está em financiar esse excesso através de um crédito parcelado, mais barato do que o cheque especial, como acrescenta ainda o especialista. “O primeiro passo em caso de dívidas caras é pensar no orçamento. A melhor saída é pedir um empréstimo com juros menores pra quitar a dívida maior. Não faltam opções: há desde o crédito consignado até o empréstimo pessoal online”.  

O Guiabolso fez uma pesquisa com usuários do aplicativo de finanças pessoais que tinham empréstimos em outros bancos. Em 82% dos casos, os parceiros que ofereceram crédito tinham ofertas mais baratas que as do banco de origem do consumidor. “Aí a dica de ouro é pesquisar e recorrer a fintechs que, quase sempre, oferecem taxas mais baixas que os bancos tradicionais”, completa.

Soluções

Outra alternativa que deve exigir uma atitude mais radical do consumidor está na mudança do seu padrão de vida. “Dá para revisar as despesas sem ter que se privar de algumas coisas. Estamos falando de cortes do orçamento e adequação ao que realmente ganhamos. Se conseguir fazer com as próprias pernas, melhor”. 

A tarefa não é fácil, mas deve começar definindo a ordem de prioridades e revendo gastos. Não necessariamente os maiores, mas, sobretudo, aqueles que passam despercebidos. “Uma alternativa pode ser já imaginar a renda mensal menor e tentar bancar os gastos e o estilo de vida com esse novo valor. Ou seja, a pessoa já nem conta com o dinheiro da parcela do empréstimo”, defende Duran. 

Também é importante destacar a visibilidade dos gastos e de como eles acontecem. “Uma conta pequena que se repete muitas vezes pode ser um vazamento enorme ao final de 30 dias”. 

MIGRAÇÃO FACILITA QUITAÇÃO DE DÍVIDA MAIS CARA

A portabilidade pode ser uma alternativa para quem está pagando mais por juros do que pela dívida que foi contraída. Essa migração é garantida, gratuitamente, de uma instituição financeira para a outra. O banco não deve tirar do cliente benefícios assim como a outra instituição não deve condicionar a transferência da dívida à contratação de algum produto ou serviço. 

“Por não existir limite legal para o valor destes juros, eles são calculados por cada instituição financeira de acordo com os seus interesses e com o comportamento do mercado. A portabilidade dá uma oportunidade ao consumidor de buscar uma oferta mais barata”, explica a especialista em Relações Institucionais da Proteste, Juliana Morya. 

É importante negociar bem a quitação da dívida e o momento de transferência para outro banco. A recomendação é do  diretor de Economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Roberto Vertamatti.

“Praticamente 85% das operações bancárias são conduzidas por cinco bancos, o que dificulta a queda dos juros. Os bancos digitais podem melhorar bem mais a competição no sistema. Até lá, cabe ao cliente negociar melhores condições”.

Sobre a portabilidade

. Como funciona a portabilidade de crédito?  Criada há seis anos, a portabilidade de crédito  dá oportunidade ao cliente de transferir  uma dívida com uma taxa de juros mais alta, gratuitamente, para outra instituição que apresente uma oferta mais barata – ou seja, juros mais baixos. Segundo a especialista em Relações Institucionais da Proteste, Juliana Morya, Cobrar IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) na portabilidade é ilegal. O banco de destino também não pode condicionar a portabilidade à contratação de algum produto ou serviço. “Quem quiser levar seu crédito para bancos com taxas mais baixas deve ficar atento, pois a instituição não pode incluir nenhum serviço ou tarifa para levar vantagem na portabilidade”. 

. O que avaliar ao trocar uma dívida? Avalie a questão dos custos para operar com a instituição, as facilidades de acesso a assessorias de investimento do banco e transparência das informações bancárias (taxas e tarifas) para o correntista. “Compare todo este pacote, toda a operação e as tarifas como um todo da nova alternativa bancária”, reforça o diretor de Economia da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Roberto Vertamatti.  

. Como ficam as parcelas?  É obrigação do banco informar o CET (Custo Efetivo Total) detalhado e o contrato do crédito, como destaca a especialista em Relações Institucionais da Proteste, Juliana Morya. “O número de parcelas no financiamento com o banco não pode ser alterado”. 

. Há restrições? Quem esclarece a dúvida é o diretor de Economia da Anefac, Roberto Vertamatti: “É muito importante que o correntista saiba que hoje pode haver a portabilidade de empréstimos e aplicações bancárias, sem restrições. No entanto, o  cliente é que precisa saber onde e como buscar as melhores alternativas - o próprio Banco Central divulga muitas informações dos custos operacionais dos bancos. Estes dados podem ajudar na tomada de decisão quanto a portabilidade”. 

QUASE 40% RECEBE CRÉDITO SEM PEDIR

O aumento do limite do cartão de crédito sem permissão ou qualquer solicitação do consumidor é mais comum do que se imagina. Segundo um levantamento realizado em todas as capitais pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) nos últimos 12 meses, quatro em cada dez usuários de cartão de crédito (38%) receberam alguma oferta deste tipo. 

O mesmo ocorreu com usuários de outras modalidades, que tiveram aumento do limite de empréstimos e de crédito pré-aprovado (34%), aumento do limite de cartão de lojas (28%) e expansão do limite disponível no cheque especial (24%).

Para o educador financeiro da entidade, José Vignoli, o crédito fácil pode ser uma armadilha para o consumidor. “O risco de receber uma oferta espontânea de ampliação de crédito é ter a falsa impressão de que sua renda e seu poder de compra se tornaram maiores de uma hora para outra, levando a gastos que ultrapassem o limite orçamentário”, afirma.

Mesmo que a oferta seja atrativa, vale considerar as condições e as reais necessidades de contratar o crédito. Muitas vezes, quanto mais fácil for o acesso, mais altos tendem a ser os juros cobrados nas operações. É importante entender o perfil de cada modalidade antes de sua utilização e também avaliar o custo efetivo mais sua capacidade de pagamento daquele crédito. 

O cheque especial, por exemplo, só deve ser utilizado esporadicamente e por períodos curtos de tempo, pois os juros são muito altos. “No caso do cartão de crédito, pagar a fatura mínima e entrar no crédito rotativo pode fazer com que a dívida cresça rapidamente. Já no crediário também pode haver cobrança de juros e tarifas embutidas nas parcelas”, explica Vignoli. 

DICA DA SEMANA: AINDA DÁ TEMPO

Aumente o controle dos gastos e das despesas Dá para revisar as despesas sem ter que se privar de algumas coisas. A chave é ter visibilidade de quanto e de como gastou. Essa contabilidade pode ser feita anotando tudo num caderninho, numa planilha ou recorrendo aos aplicativos. 

Cuidado com as despesas ‘conta-gotas’ Posso pegar um Uber em um dia de chuva? Sim. Mas se faço isso sempre, o orçamento vai estourar e você só vai perceber quando vier a fatura do cartão de crédito. Muito cuidado com estes pequenos gastos. Vale ponderar esta frequência.