Quem tem medo da deltacron? Veja o que dizem os especialistas sobre a variante mista

Apesar da forma híbrida do vírus ainda não ter sido identificada na Bahia, o Brasil já começa a registrar seus primeiros casos

  • Foto do(a) author(a) Priscila Natividade
  • Priscila Natividade

Publicado em 20 de março de 2022 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Shutterstock

Se já passou pela sua cabeça começar a contagem regressiva para o fim da pandemia, é melhor segurar mais um tempo essa ansiedade. Ainda não vai dar para dizer que acabou ou muito menos relaxar.  No início da semana, o Ministério da Saúde confirmou que, até 14 de março, foram notificados os dois primeiros casos no Brasil de uma possível recombinação de variantes, denominada Deltacron GKA (AY.4/BA.1).  

Ainda de não dá para saber se a combinação das partes da Delta e da Ômicron tem maior capacidade de transmissão, se leva a quadros mais graves ou consegue escapar da imunidade da vacina contra covid-19. Os casos identificados da nova linhagem foram registrados nos estados do Pará e do Amapá.  

“Sabemos pouco sobre a Deltacron, mas podemos estar diante de um evento de recombinação entre a Delta (AY.4) e a Omicron (BA.1). São poucos casos ainda, não temos indicativos de que ela superaria a Omicron ou suas sub-linhagens, mas é um recombinante que precisa ser monitorada”, comenta a biomédica, doutora em neurociências e divulgadora científica pela Rede Análise, Mellanie Fontes-Dutra.  

Entre os principais fatores que podem ter levado ao surgimento da Deltacron, a biomédica cita a alta circulação das variantes Delta e Omicron e as co-infecções, em que esses eventos de recombinação poderiam ser viabilizados dentro de uma célula hospedeira infectada por essas variantes.  “Precisamos deixar claro que a desobrigação não significa que a máscara deixou de ser recomendada. Ainda é necessário continuar somando cuidados à medida que se pondera o risco das atividades a serem feitas”, ressalta.  A nova variante foi sequenciada geneticamente pelo Instituto Pasteur, da França, país onde foi identificada em janeiro e tem sido acompanhada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Até o momento, a Deltacron foi encontrada em países como França, Bélgica, Alemanha, Holanda e Dinamarca. Mais recentemente, alguns casos foram observados nos Estados Unidos.  

E como as variantes se misturam? Esse comportamento é frequente entre os vírus, já que a replicação é rápida e intensa. A espícula ou a proteína spike (S), é a estrutura do vírus que se conecta aos receptores das células para dar início à infecção. No caso da Deltacron, os estudos iniciais supõem que ela seja quase toda igual a Ômicron, variante mais difundida hoje. O restante do seu genoma é da Delta.  

Para o infectologista da S.O.S. Vida, Matheus Todt, o que mais chama atenção nessa fusão é que tanto a variante Delta quanto a Ômicron tem alta  infectividade.“A maior preocupação é que essa nova variante seja mais transmissível que as anteriores. A reinfecção é sim possível, mas pessoas já expostas a outras variantes e os já vacinados tem menor possibilidade de desenvolver formas graves”.  Alerta   Enquanto o Brasil estuda o rebaixamento do status de pandemia para endemia até o fim de março, conforme já sinalizou o presidente Jair Bolsonaro, as intensas flexibilizações nas medidas sanitárias de prevenção, mais a estagnação da vacinação, têm levado inúmeros países a voltarem a registrar um aumento significativo de casos da doença.  

De acordo com dados da Universidade John Hopkins, que faz o rastreamento da pandemia do coronavírus, Reino Unido, Áustria, Holanda, Grécia, Alemanha, Suíça e Itália são alguns dos que viram os números da pandemia voltarem a crescer nos últimos dias. Para se ter uma ideia, só na Alemanha, o número de casos diários passou de 67 mil no dia 6 de março para 237 mil um pouco mais de uma semana depois.  

A China é mais um país em estado de alerta: 328 mil casos foram registrados entre 28 de fevereiro e 6 de março. Recorde que representa o maior surto de covid-19 em dois anos e levou o governo chinês a voltar a decretar lockdown e confinar quase 30 milhões de pessoas.  

O cenário pede cautela. Em uma reclassificação para endemia, a covid-19 deixa de ser uma emergência de saúde no Brasil e restrições como uso de máscaras, proibição de aglomerações e exigência do passaporte vacinal, por exemplo, podem perder a obrigatoriedade. Além disso, se compromete também a capacidade de flexibilização de regras relacionadas a processos de compra e licitação na saúde no atendimento da população em caráter de urgência.  

Para o analista de dados e coordenador da Rede Análise, Isaac Schrarstzhaupt, antes de qualquer decisão dessa natureza, é necessário reduzir o nível de transmissão no vírus não só aqui no Brasil, mas no mundo. “A reclassificação tem de ser feita pela mesma organização que declarou a pandemia lá em 2020, que é a OMS. E, mesmo que a OMS resolva fazer isso, ela precisará se amparar em dados. Não adianta reclassificar ‘na canetada’ com o vírus infectando ainda tantos vulneráveis como estamos vendo hoje”, defende.