Recordações de andar exausto

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  • Da Redação

Publicado em 31 de maio de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Temos visto tantas coisas nesses tempos de pandemia. Conversando com um amigo, falamos sobre a fé na humanidade. Disse a ele que acredito que há mais pessoas boas que ruins no planeta. Pendurada conscientemente no maniqueísmo, argumento que o equilíbrio entre maldade e bondade definirá algum futuro.

Prefiro, nesse momento, simplificar ao máximo tudo aquilo que digo, como se desenhasse uma casa com seis traços de lápis em uma página em branco. Ou como se arriscasse a representação do corpo humano, usando apenas cinco retas e um círculo. Por timidez ou por enfado, tomo a poesia pelo poema. Estou exausta.

Como diz um desses memes que circulam nas redes sociais, é exaustivo viver um tempo histórico. Tomo de empréstimo o título de um livro de Mayrant Gallo que talvez resuma nossas memórias coletivas: Recordações de Andar Exausto. Um dia, se um dia for possível, repousaremos nossas cabeças, uns sobre os ombros dos outros.

Fazemos pão e 'laives' porque não somos aparelhados para a desesperança. Trememos de medo porque fingimos viver em um país pacífico. No presente, deixemos em suspenso os títulos nobiliários, príncipes e princesas, meus amigos. Vinte e quatro horas em roupas de casa, nossas roupas de mendigos, talvez isso nos ensine algumas coisas.

Temos visto tantas coisas nesses tempos de pandemia. Sobretudo, nossos rostos. Da base às entranhas, temos visto. Pequenas rugas surgindo, fios brancos. Os amores que sumiram, por onde andam? O abraço que não demos no momento preciso. Choramos os mortos, resistimos, postamos pequenas alegrias nas redes.

Recentemente, um amigo falou sobre o fogo na delegacia em Minneapolis numa manifestação em protesto contra o assassinato de George Floyd, de 46 anos, no dia 25 de maio deste ano. Imobilizado por um policial, ele foi sufocado até a morte. “Eu não consigo respirar”, disse, enquanto morria em público.

Caso semelhante aconteceu no Rio de Janeiro, em 17 de fevereiro de 2019, dentro de um supermercado. O rapaz, de 19 anos, chamava-se Pedro Gonzaga e foi sufocado pelo segurança. Ele estava acompanhado pela mãe. George e Pedro eram negros. O racismo filmado e fotografado, como disse Will Smith.

No Twitter, uma menina comenta sobre os manifestantes em Minneapolis. Um rapaz comemora a imagem da delegacia em chamas. Leio sobre a morte de mais uma criança negra no Brasil, tiro de fuzil nas costas, enquanto pipocam notas e mais notas de repúdio. As pessoas, no mundo inteiro, estão exaustas.